quinta-feira, 21/11/2024
Janaína Machado: " No futuro próximo, 64% das crianças irão trabalhar em profissões que não existem hoje"

“Hoje a pessoa já se forma obsoleta”, diz a administradora Janaína Machado

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“Hoje a pessoa já se forma obsoleta”. O alerta, nada animador, é da administradora de empresas, Janaína Machado Tavares, MBA em Recursos Humanos  (RH) pela Unifacs e MBA Executivo em Saúde pela Fundação Getúlio Vargas e uma experiência de 17 anos em gestão de RH em empresas de médio e grande porte. Ao chamar a atenção sobre as formaturas de hoje em dia, a profissional quer mostrar que  o mercado está em ritmo acelerado, o que exige de todos, tanto gestores das universidades como estudantes, preparação para seguirem este novo ritmo causado pela pandemia da Covid-19, que obrigou a todos os setores da economia  e seus atores a se reinventarem.

As mudanças tecnológicas aconteciam num ritmo tranquilo, mas devido à pandemia da covid-19 muitas coisas tiveram que ser implementadas rapidamente. O trabalho em home office já existia, mas com a covid-19 e a necessidade de isolamento social para a não propagação do vírus muita gente migrou  para esse formato. E, hoje, segundo Janaína Tavares, muitas multinacionais manterão esse formato. Como consequência veremos prédios serem desalugados, porteiros e pessoal de serviços gerais sendo demitidos.

No ano passado, um estudo do Fórum Mundial destacou que, no futuro próximo, 64% das crianças irão trabalhar em profissões que não existem hoje. Por outro lado, um estudo da Universidade de Oxford disse que essa substituição será de 43%. De acordo com Janaína,  a princípio, está havendo mudanças nos cargos operacionais, mas, logo serão nos colarinhos brancos.

Enquanto as atividades da tecnologia da informação (TI) irão “bombar”, outros, simplesmente, estarão deixando de existir, a exemplo da carreira advocatícia. “Primeiro porque ninguém acredita na Justiça e você pensa 10 vezes se vai entrar com alguma ação”, observa Janaína. Outro motivo, diz, é que “a  Justiça é cara e ela é para poucos”, por fim, os softwares fazem qualquer peça que antes era exclusiva dos advogados.

No país, terceiro consumidor no mundo de Rivotril, remédio para transtornos de ansiedade, transtornos de humor, síndromes psicóticas, as pessoas querem sair desta trágica marca e ter qualidade de vida. Por isso que nutricionistas, profissionais de educação física e fisioterapeutas têm que estar preparados para essa nova demanda.

Esta semana, Janaína Machado,  atual gerente de Carreiras do Grupo Tiradentes, que envolve todas as unidades presidenciais e EaD  de Sergipe, Bahia e Pernambuco, conversou com o Só Sergipe.

SÓ SERGIPE –  Novos trabalhos estão surgindo e outros sendo extintos. O que o futuro do mercado de trabalho nos reserva?

JANAÍNA  MACHADO – Desde o ano passado, o Fórum Mundial já havia publicado que 64% das nossas crianças irão trabalhar  em profissões que não existem hoje. E o estudo de Oxford falou da substituição de 43%. O que eu vejo? O que aconteceu com a pandemia? Antecipou esse processo. Claro que é muito mais visível cargos operacionais, neste primeiro momento, mas eles vão chegar, como o próprio artigo de Oxford diz, nos colarinhos brancos. A tecnologia vem se desenvolvendo, com a pandemia acelerou, e chegou o home-office. Claro que já existia a prática do home-office, mas foi acelerada absurdamente.

SS – De fato, muitas empresas, nesta pandemia, tiveram que colocar os funcionários em home-office.

JM – Sim. E nós vemos empresas multinacionais que já falaram que não terão mais escritórios grandes. Nós observamos no nosso Estado  toda parte de tecnologia da informação mudando para home-office definitivamente, independente de pandemia.  Então já vemos uma mudança muito grande no mercado de trabalho, principalmente no Brasil onde ainda existe uma cultura um tanto escravagista, na qual o empregado tem que estar embaixo do meu olho para eu ter certeza de que ele está trabalhando. Com o home office, isso muda muito o cenário brasileiro.

SS – Mudanças em vários aspectos, como não ter mais prédios para determinada empresa e, com isso, serão extintas, também, algumas funções.

JM – Isso. Muitos prédios que antes eram alugados, não serão mais. Muitos dos porteiros que trabalham nesses prédios ficarão desempregados.  O porteiro, a faxineira, a pessoa do cafezinho perderão o emprego. Quando nós vemos logo de pronto, alguns cargos já não existem.  E vemos uma necessidade muito grande de capacitação para outros. Antigamente havia uma pessoa em grandes empresas que fazia orçamento, hoje não precisa mais deste orçamentista. Os sistemas de softwares avançaram e já fazem isso. As pessoas já administram seu próprio orçamento. Os formados em Contabilidade, Economia, Administração perderão os empregos. Eles perdem e fazem o quê?  Vão se capacitar.

SS – Seria uma reformulação das profissões?

JM – Sim, uma reformulação muito grande. Confesso que me preocupa muito a falta de educação no nosso país, porque para algumas pessoas será rápida a adaptação em novas profissões, mas para outras nem tanto.

SS – Fazendo um recorte histórico: quando não havia luz elétrica, alguém tinha que acender os lampiões nas ruas, porém quando chegou a luz, ela perdeu o emprego. Tínhamos ascensoristas nos elevadores, mas hoje não existem mais. Os bancos são virtuais e cai o número de bancários. E se fala até que a profissão de advogado deixará de existir. Será mesmo?

JM –Eu acho que a profissão de advogado já está deixando de existir. Primeiro porque ninguém acredita na Justiça e você pensa 10 vezes se vai entrar com alguma ação. Segundo porque a Justiça é cara e ela é para poucos, e talvez você não tenha dinheiro para custear uma ação. Terceiro: hoje temos softwares que fazem a peça jurídica e tudo da Justiça hoje é virtual. Não existe mais aquele protocolo que você entregava sua defesa. Você já tem a justiça online. As pessoas se casam e separam dentro de um cartório; se faz um inventário dentro de um cartório e não precisa, necessariamente, de um advogado.  Os próprios tributos estão cada vez mais simples. Eu acredito que chegará uma hora que eles não mais existirão. Está tudo mudando, sim.

SS – Que profissões a senhora vê para o futuro?

Profissões tecnológicas Imagem: Reprodução/Senai

JM – Várias profissões vão bombar. Tecnologia não precisa nem falar. Vai continuar cada vez mais alta. Eu acredito na área de educação se reformulando de uma maneira fenomenal. Nunca vi a importância de um psicopedagogo na minha vida até chegar a pandemia. Acho que a escola vem com uma nova roupagem e vamos precisar de gente mais especializada. A profissão de professor muda, vai precisar de um comunicador.  Vejo a saúde com oportunidades incríveis diante desta pandemia e das futuras; teremos mais serviços emergenciais, novos cargos de administrador de crise, de felicidade dentro das empresas. Acredito que os psicólogos terão muito trabalho, porque o mundo fluido traz uma angústia muito grande às pessoas. Nós somos o terceiro país no mundo que mais consome Rivotril. Existem muitas profissões que estão em ritmo crescente e tudo ligado ao bem-estar, ao humano: atividade física, fisioterapia. Isso se reformulou e teve um boom.  As pessoas descobrem que precisam se movimentar para viver. O nutricionista muda o papel dele; a gastronomia virá em alta, pois as pessoas querem comidas saudáveis, querem comer diferente.  As pessoas querem ter uma relação com o consumo completamente diferente.

Leia também: O futuro do trabalhador

SS – O consumo mudou?

JM- Sim. Hoje você compra e vende pelo WhatsApp, pelo Instagram. Todos me pedem um estagiário de publicidade e propagada e eu digo que não pode.  Eles não podem ser substituídos como mão de obra barata. Quem quiser, contrate como freelances. Os meus meninos (alunos, risos), não querem mais estágio. A relação do trabalho celetista mudou. As pessoas trabalham por projetos.

SS – A senhora citou a educação e disse estar preocupada, mas em que sentido especificamente?

JM – Porque a educação não consegue mais ser da forma que era, depois da pandemia. Os pais descobriram que há muito conteúdo que não serve para nada; que as escolas não eram tão boas assim. Nem você aguenta assistir à aula online do seu filho.

Aulas online   Foto: Divulgação/MCTI

SS – Os alunos reclamam muito dessas aulas online. Tem muita gente com esse problema.

JM – E quem não está? Quando tirei meu filho de oito anos da escola foi uma libertação para mim. Só faço o dever de casa com ele sozinho e desisti da obrigatoriedade da aula. Ganhei paz. Tenho um filho de 10 anos que é autista, então ele consegue assistir a aula porque é autista. Se ele fosse como o outro, não conseguiria, talvez.

SS – Já que estamos falando de educação, nas escolas há disciplinas que não servem ou não servirão para nada. Ouço essa reclamação constante de alunos.

JM – E não vai usar mesmo. Eu odeio Química e fui para recuperação nos três anos. E me pergunto até hoje:  por que estudei?

SS -Muitas coisas obsoletas em todos os sentidos hoje.

JM – Hoje ficam obsoletas em dois anos.  Eu dizia que o seu nível superior fica obsoleto em cinco anos, mas estou começando a achar que diminuiu. A pessoa já se forma obsoleta.

SS – E as universidades estão preparadas para essa revolução que está acontecendo?

JM – Estão correndo atrás, porque elas formam para o mercado e o mercado está na frente. É uma corrida.  A pandemia trouxe isso de forma muito clara para as universidades.  A Unit já estava nesse movimento de mudança de cultura do online, da empregabilidade, do Innovation Center, então já trazia um pouco disso.  Agora, fazer tudo com qualidade. Ela já tinha o EaD (Ensino a Distância) que é sensacional.

SS – Os salários destes profissionais do futuro serão melhores?

JM – Nesse mundo de mercado do futuro não existe teto, não existe piso. Isso é bom e é ruim. Não existe piso, então você pode ganhar um nada. Também não existe teto, pode ganhar muito. Quem fará seu salário é você e isso muda toda a concepção, porque é você e a hora. Se estiver disposto a ganhar muito, tem que trabalhar muito; se ganhar menos, tem qualidade de vida, pode ser que isso aconteça. Então, é bom e é ruim.

SS – Na questão da educação. O professor hoje ganha mal.

JM – Ele vai ter que mudar. Ele quer ser um professor ou um mentor?

SS – Além disso, hoje não há muito interesse das pessoas em cursarem uma licenciatura para ser professor.

JM – De jeito nenhum, porque não existe cultura de educação no Brasil. Não é algo, realmente, prioritário neste país.

SS – A senhora acha que o Brasil está preparado para as mudanças? O desemprego vai crescer?

JM – Acho que sim. A economia está se recuperando. Normalmente, a última coisa que o empresário faz é contratar, pois precisa estar muito seguro. E ele não está seguro. Existe ainda a possibilidade da segunda onda da covid-19, existe possibilidade de fechamento do comércio e é tudo muito instável. Enquanto estiver nesta instabilidade, é mais difícil se contratar. Tivemos que demitir.  Não sou tão otimista para o ano de 2021, mas claro que será melhor que 2020, porém passaremos, até junho, com cautela.

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