Paixão do latim tardio passio -onis, derivado de passus, particípio passado de patī – sofrer – é um termo que designa um sentimento avassaladoramente intenso de atração por uma pessoa, objeto ou tema. Traduz-se também por admiração, entusiasmo ou obsessão forte por algo ou alguém, gerando maior ou menor sofrimento. E é sobre essa ótica que a sociedade vem padecendo paulatinamente.
Continuamos a assistir perplexos, “com os olhos que a terra há de comer”, a cenas de pura selvageria entre torcedores de times rivais que se digladiam em estádios de futebol, por ironia do destino denominados de arenas, única e exclusivamente por uma preferência desmotivada por este ou aquele clube futebolístico que, de fato, em nada acrescenta às nossas vidas pessoais, isto é, não nos traz conhecimento ou saber, não enche a despensa com mantimentos de subsistência, não paga as contas e nem quita as dívidas, enfim… não nos deixa qualquer legado. Nem mesmo o instinto animalesco de sobrevivência comparar-se-ia a esta pulsão que conduz o ser humano à prática do mal, por motivo torpe, indo de encontro ao que realmente se propõe o esporte, ou seja, transmitir saúde, disciplina, labor em equipe e divertimento.
Saindo dos campos de futebol e adentrando ao campo da política, a sublime arte da negociação, as coisas se encontram bem no fundo do poço. O debate já não é mais permitido, muito menos aceito o contraditório. A célebre frase de Voltaire: “posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de dizê-las”, dissipa-se ao vento. Os seres humanos parecem agir tal qual zumbis, sem vontade própria, levados como uma manada em fúria rumo ao precipício, com suas consciências, seus valores civis e, sobretudo, cristãos, completamente amordaçados e vendados, utilizando-se da agressão pessoal, moral e até física, para a resolução dos impasses e das divergências, de maneira geralmente inescrupulosa, sorrateira, sem qualquer noção da realidade, tempo ou espaço. Assim como afirmariam os religiosos mais conservadores, completamente possuídos pelos mais terríveis demônios.
Desse modo, a sociedade se distancia cada vez mais do diálogo político, harmonioso e edificante, aquele voltado ao bem comum, passando, então, a agir contra os princípios que regem a vida em sociedade, vilipendiando a Democracia, rasgando a Carta Magna, maculando o Livro da Lei e, por conseguinte, propiciando a ascensão, aos postos de comando, daqueles indivíduos imbuídos de intenções espúrias, que absolutamente não toleram “combater o bom combate”, tão bem ensinado por Paulo em carta a Timóteo.
O que se percebe é diametralmente oposto. Infelizmente o discurso de ódio, o preconceito, a vingança e a intolerância ganham espaço no seio familiar, nas rodas de amigos, nos grupos sociais, nas igrejas e em instituições filosóficas como a Maçonaria, justamente num momento em que a sociedade, assolada por uma pandemia que dizimara inúmeros sonhos, empregos e vidas, urge de mais solidariedade, carinho e compreensão. Alguns irmãos e amigos ainda insistem piamente que veem… mas efetivamente não enxergam os fatos tais quais verdadeiramente o são. Para Antoine de Saint Exupéry, autor do “O Pequeno Príncipe”: “só se vê bem com os olhos do coração”; ou como bem narrou o profeta Isaías (Is43:8): “manda vir este povo que é cego, embora tenha olhos perfeitos, manda vir este povo que é surdo embora tenha ouvidos”. Ou seja, para estes obcecados, a visão d’alma apresenta-se cada vez mais obnubilada, embaçada e distante da Verdade. O pior cego é aquele que não quer ver!
Faz-se necessário e premente, pois, que a Luz volte a brilhar sobre as trevas, trazendo vida e, acima de tudo, a esperança de dias melhores. Que a união de cada pequena chama de bondade existente no âmago d’alma dos homens e mulheres livres e de bons costumes, crentes no Grande Arquiteto do Universo, possa iluminar e sinalizar o justo e perfeito caminho rumo à paz, à concórdia e ao progresso da humanidade, deixando límpido, às claras, para que todos enxerguem, que o colírio para todas as paixões mundanas é o Amor Divino!
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(*) Hernan Augusto Centurion Sobral é médico cirurgião e coloproctologista. Mestre maçom da Loja Maçônica Clodomir Silva 1477, exercendo atualmente o cargo de orador.