quinta-feira, 21/11/2024
Luiz Thadeu
Hoje, amanheço com uma nova idade

Aos 65 anos, só quero uma vida de luxo

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Luiz Thadeu Nunes (*)

 

“A impressão que eu tenho é a de não ter envelhecido, embora eu esteja instalado na velhice. O tempo é irrealizável. Provisoriamente, o tempo parou para mim. Provisoriamente. Mas eu não ignoro as ameaças que o futuro encerra, como também não ignoro que é o meu passado que define a minha abertura para o futuro. O meu passado é a referência que me projeta e que eu devo ultrapassar. Portanto, ao meu passado eu devo o meu saber e a minha ignorância, as minhas necessidades, as minhas relações, a minha cultura e o meu corpo. Que espaço o meu passado deixa para minha liberdade hoje? Não sou escravo dele. O que eu sempre quis foi comunicar da maneira mais direta o sabor da minha vida, unicamente o sabor da minha vida. Acho que eu consegui fazê-lo […] Não desejei nem desejo nada mais do que viver sem tempos mortos”, diz Simone Beauvoir.

Hoje, amanheço com uma nova idade, chego aos 65 anos como um eterno aprendiz: com fome e sede de conhecimento, e olhos voltados para o futuro. Em cada ruga, uma história. Em cada cicatriz, um pouco de minha trajetória. E na minha mão mapeada, está gravada a minha estrada. Guardo sabores e odores. Lembranças dos que partiram e deixaram marcas indeléveis, jamais apagadas em mim. Sinto saudades de tudo que marcou a minha vida. Quando vejo retratos, quando sinto cheiros, quando escuto uma voz, quando me lembro do passado, eu sinto saudades. Sou o somatório de tudo isso.

Retrato de Charles Baudelaire em 1863, por Étienne Carjat

Sigo aprendendo com Charles Baudelaire: “Deveis andar constantemente embriagados. Tudo consiste nisso: eis a única questão. Para não sentirdes o fardo horrível do tempo, que vos quebra as espáduas, vergando-vos para o chão, é preciso que vos embriagueis sem descanso. Mas, com quê? Com vinho, poesia, virtude. Como quiserdes. Mas, embriagai-vos. E se, alguma vez, nos degraus de um palácio, na verde relva de uma vala, na solidão morna de vosso quarto, despertardes com a embriaguez diminuída ou desaparecida, perguntai ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntais que horas são. E o vento, a vaga, a estrela, o pássaro, o relógio vos responderão: — É a hora de vos embriagardes! Para não serdes escravos martirizados do tempo, embriagai-vos! Embriagai-vos sem cessar! Com vinho, poesia, virtude! Como quiserdes!”

 

Quantas vezes achei que fosse o fim, e a vida me surpreendeu, alargando minha estrada, me mostrando outra direção, me dando um novo fôlego para caminhar mais um tanto… Quantas vezes me julguei frágil demais, mas percebi a força que tinha, quando a única opção era secar as lágrimas e continuar. Quantas vezes me senti perdido, até descobrir que estava, finalmente, no caminho certo, e todos os passos errados que dei, foram ponte para que eu chegasse até aqui. E quantas e quantas vezes ainda me surpreenderei com as voltas que o mundo dá, com os desfechos mais improváveis. Passei por situações inimagináveis, mas Deus me poupou do sentimento do medo. Ele, sabendo de minha fragilidade, nunca me abandonou, ao contrário, me fortaleceu em cada novo desafio. Não somos donos de nada e, de nada sabemos. Às vezes, somos escolhidos, quando pensamos escolher. E, por mais que a gente teime em desacreditar, tem sempre um sonho novo, esperando para nascer.

Luiz Thadeu

Viver é entender que somos asas num voo de coragem, enquanto a vida é o vento.

Há tempo, sei que tudo pode mudar, que tudo pode acontecer, que nada veio para ficar, que tudo pode deixar de contar. Há muito tempo que entendo que a única coisa importante é que coloque quem verdadeiramente sou em tudo aquilo que estou neste momento a viver, sem me preocupar com o resultado final, mas apenas com a vivência em si. Tudo isso pode parecer insano e até mesmo irresponsável da minha parte, mas na verdade não é. Bem pelo contrário. Viver cada coisa no seu tempo é uma escolha apenas daqueles que criam histórias com novos olhares. Não é o futuro que importa, mas a extensão do meu presente. Não sou eu quem muda a vida, mas a vida que muda para mim porque eu mudei.

Neste 07 de dezembro, ao completar 65 anos de caminhada, quero ter o luxo de viver sem pressa. Preparar e desfrutar da minha refeição com calma. Dormir o suficiente. Ter tempo para contemplar a Vida. Quero ter o luxo de ser eu mesmo, sem precisar impressionar ninguém. Aprendi que riqueza é ter tempo para realizar desejos, sejam grandes ou pequenos. Luxo é ter mente sã, em um mundo insano. Seguindo meus ideais. Fazer as coisas que mais gosto e viver delas…

Eu quero viver com o luxo de não ter medos. Aceito o que vier… Adaptar-me a diferentes situações que estão por vir, sem esperar nada de ninguém…

E, acima de tudo, quero ter o maior luxo de todos… estar feliz agora.

“O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria; aperta e daí afrouxa; sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”, afirma João Guimarães Rosa.

Um brinde a essa coisa mágica e bárbara chamada VIDA.

Esta canção, Mercador de Ilusões, foi composta por Aroucha Filho/Bosco Carvalho/Rodrigo Chá, amigos de Luiz Thadeu.

 

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Sobre Luiz Thadeu Nunes

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Eng. Agrônomo, Palestrante, cronista e viajante: o homem mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 151 países em todos os continentes da terra. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.  Membro do IHGM, Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; ABLAC, Academia Barreirinhense de Letras, Artes e Ciências; ATHEAR, Academia Atheniense de Letras; e da AVL, Academia Vianense de Letras, membro da ABRASCI. E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br

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Um comentário

  1. Parabéns pela texto, uma crônica poética de excelência; por sua trajetória, pela sua vida. Por analogia, lembrei de uma das minhas crônicas: O tempo, que poderá contá-lo? Ter o tempo como referenciais temporários: presente, passado e futuro, é fundamental, para refletirmos: O que é a vida?
    Deixo estes versos de Gonzaguinha:

    “E aprendi que se depende sempre
    De tanta, muita, diferente gente
    Toda pessoa sempre é as marcas
    Das lições diárias de outras tantas pessoas

    E é tão bonito quando a gente entende
    Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá
    E é tão bonito quando a gente sente
    Que nunca está sozinho por mais que pense estar

    É tão bonito quando a gente pisa firme
    Nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos
    É tão bonito quando a gente vai à vida
    Nos caminhos onde bate, bem mais forte o coração”

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