Por Luciano Correia
A Igreja Católica em Sergipe recebeu finalmente seu novo arcebispo. Já não era sem tempo, afinal, depois de alguns meses de vácuo total na liderança dessa secular instituição. Isto sem falar no ocaso provocado pela pior gestão de toda sua história, sob o comando do ex-arcebispo Dom João José Costa, marcada pela incompetência e desmandos na reforma do principal templo religioso do estado, a Catedral Metropolitana de Aracaju, até hoje inacabada. Acuado por todos os lados, por fogo interno e externo, o ex-arcebispo foi tragado pelas próprias contradições.
Por um princípio da Física e da política, aqui estendido à religião, todo vácuo tende a ser ocupado. E foi. Vencido pelas críticas e denúncias relacionadas com a obra da catedral, o então chefe da Igreja permaneceu a maior parte da sua gestão na defensiva, na proporção em que outros sacerdotes subordinados ao seu comando desenvolveram bem sucedidas carreiras solo, pelo menos no campo midiático. Uns estrelaram programas de rádio, outros eram os donos da “hora da Ave Maria”, missas teatrais no melhor estilo pop.
Aqui não vai nenhuma crítica ao desejo de líderes religiosos almejarem o status de celebridades, afinal, no atual mercado (ops!) religioso, quem não vende suas garrafas, não monta palanque para os fiéis. O tamanho do rebanho é proporcional à relevância com que cada igreja ou terreiro se afirma na sociedade. Reconheço que por trás de minhas observações talvez se esconda alguma má vontade com o desempenho medíocre do primeiro e segundo escalões da Santa Madre Iglesia em terras sergipanas, sobretudo quando lembro do imaginário construído na minha infância e juventude pelo desempenho de Dom Luciano Cabral Duarte.
Dom Luciano, chamado por católicos sergipanos de “O Pastor”, foi um homem extremamente culto, único sergipano que alcançou a proeza de ser colunista semanal de um jornal de alcance nacional, a Folha de S. Paulo, um intelectual refinado, respeitado no país inteiro. Embora conservador, desenvolveu na região do baixo São Francisco um projeto (acreditem!) de reforma agrária. Eu mesmo, quando trabalhava no jornal Tribuna da Bahia, fui verificar in loco a dimensão desse projeto e publiquei matéria de página inteira no periódico baiano.
Além de seu trabalho pastoral, foi um empreendedor extremamente competente, transformando a Rádio Cultura de Sergipe na emissora mais ouvida, com uma programação eclética, equilibrando jornalismo, música, variedades, cobertura esportiva e o trabalho evangelizador da instituição no estado. Papai não perdia sua célebre “A Hora Católica”, um sermão dominical que, mesmo para um menino ainda pouco interessado nas coisas do espírito, soava inteligível e interessante. Sem falar no exímio domínio da linguagem radiofônica, com uma voz grave, belíssima, uma das mais belas vozes que passaram pelo rádio sergipano. Nunca fui de igrejas, nem de religião, mas carreguei com orgulho o mesmo nome do pastor Dom Luciano, escolha de Papai para seu primogênito.
Mais recentemente, conforme contei aqui no portal Só Sergipe (O batismo de João), tentei batizar meu filho João na única igreja que não se encontrava em recesso no final do ano, período em que os padrinhos, que moram na Suíça, estariam por aqui. Consegui até um padre que se dispôs a fazer a celebração, mas fui informado que o ato não poderia ser consumado, pois minha querida sobrinha Carol e seu marido Pierre não são casados no religioso, apenas no civil. Já ouvi de várias pessoas que isso não é regra geral e que pode ser flexibilizada conforme a vontade do padre celebrador, o que, no meu caso, não ocorreu. Mas não quis prosseguir com a polêmica. Para mim, com toda a honestidade da alma, não tenho dúvidas de que, ao perder a ovelha Jão Cabeça Quente, quem mais perdeu foi a Santa Madre.
Aproveitei o ensejo, então, para encerrar minha interlocução com as celebridades eclesiásticas em questão. A chegada de novo comandante, quem sabe um pastor, como o saudoso Dom Luciano, talvez para poder trazer o alento às ovelhas abandonadas pelo circo midiático dos padres marqueteiros.