Luiz Thadeu Nunes e Silva (*)
Sábado, 20/07, a convite do poeta-escritor-agitador-cultural Paulo Melo, nas primeiras horas do dia, atravessei a baía de São Marco, na lancha Bahia Star, e desembarquei em um outro mundo, em Alcântara. Fui para a solenidade de fundação da ALCAF, Academia Alcantarense de Letras, Ciências, Artes e Filosofia.
Embora tão perto da Ilha do Amor, meu lugar predileto no mundo, há anos não ia a Alcântara. Quando estudante de Agronomia era para lá que fugia, sempre que podia, acompanhado de alguma jovem, para desfrutar da calmaria do lugar, suas praias, sua comida — na época a palavra gastronomia não era usual — e de seu povo acolhedor. Alcântara era minha Arembepe, o refúgio de hippies na Bahia. Ou seria meu Nirvana?
Alcântara foi a primeira cidade maranhense tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IPHAN, em 1948, como cidade-monumento. Cercada por praias, ilhas desertas, serena e tranquila, Alcântara pode se orgulhar de ser também a mais importante cidade histórica da Amazônia. Seu casario colonial preservado e imponente e o silêncio de suas ruínas guardam reminiscências de um passado glorioso, tempo de riqueza, de fausto, de famílias nobres e numerosa população escrava. Os atrativos começam logo na descida da lancha, no Porto do Jacaré e subindo a ladeira de pedras, que conduz ao coração da cidade: o largo onde se encontram as ruínas da Igreja da Matriz, a antiga cadeia e o pelourinho, ícones máximos das sociedades coloniais e escravagistas brasileiras. Além de igrejas coloniais, fontes e museus. Todo o centro antigo pode ser visitado a pé. Tão importante quanto apreciar os monumentos é ouvir dos moradores ou guias turísticos locais, as histórias/estórias que tornam Alcântara ainda mais encantadora.
Tenho memórias afetivas com a cidade, a maioria ligada a prazeres libidinosos. Com testosterona saindo pelas orelhas, era na calmaria de Alcântara, especialmente em noites de lua cheia, que a natureza ficava mais exuberante e excitante. Me conecto com Deus, através da música, literatura, sexo e natureza, não necessariamente nessa ordem.
No sábado, ao desembarcar no cais da cidade, rebobinei a memória, e quantas coisas boas se apossaram de mim. O tempo se encarrega de carregar as coisas para frente, a memória em trazê-las de volta. Lembrei de minhas amigas. Por onde andará Iraci, jovem catarinense, que conheci em um congresso da UNE, em Belém, e que desviou seu caminho para acompanhar-me até o paraíso de Alcântara? Não tive mais notícias dela. Lembrei de Ângela, baiana de Cruz das Almas, morena esguia, sorriso fácil, onde a alegria fez morada, que conheci no centro de São Luís. Ela veio a São Luís para coletar material para sua tese de mestrado. Que fim levou Sheila, vinda de Imperatriz, que optou por morar na Ilha do Amor, pois era apaixonada pelo mar?
Tive a impressão de que Alcântara estacionou no tempo. Mesmo tendo uma Base Espacial — algo impensável para aquela época — pouca coisa mudou. O mormaço das tardes, as ruas com calçamento de pedras, as casas sem grades nas portas e janelas, cachorros dormindo nos monumentos históricos, seus moradores sem pressa, os doces de espécies, o som das caixeiras. Vi nativos debruçados nas janelas a espiarem os transeuntes, que vêm de longe para admirar as belezas da terceira mais antiga cidade do Maranhão. Sábios, aprenderam que na sequência do agora que se vive o hoje. Devem pensar “pra que pressa, se tudo lá na frente vai acabar mesmo?”. Enquanto o mundo se preocupa quem será o próximo presidente dos Estados Unidos, ou com a subida do dólar, os locais estão a desfrutar da mansidão do lugar.
Depois de viajar por esse mundão de meu Deus, visitar mais de 600 cidades em 151 países em todos os continentes, arrisco a dizer que Alcântara é uma das esquinas do mundo. Lá se encontram o passado e futuro.
Nesta ida a Alcântara tive o privilégio de testemunhar o nascimento de mais uma Academia de Letras em nosso estado. A ALCAF é a 55ª. Me alegra presenciar o renascimento do momento cultural que reposiciona o Maranhão no cenário de artes e cultura nacional. Ver a alegria de cada confrade e confreira que fazem a ALCAF, capitaneadas pelo presidente Paulo Melo Sousa, é motivo de júbilo.
Uma coisa é certa, preciso voltar mais vezes a Alcântara. Como me faz bem!