quinta-feira, 21/11/2024
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Divinitas Sinthesys

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Por Tacio Brito (*)

 

“Eu sou divino”

 

Aos que me conhecem na vida privada, não raro escutam essa frase, que normalmente falo em tom de brincadeira a fim de reafirmar uma pequena escolha que fiz há um tempo.

Sim, eu escolhi ser um deus. Deus de meu domínio consciente em uma narrativa auto-criada para fazer frente ao desespero causado pelo esclarecimento de que existo em um mundo físico onde todas as coisas, inclusive eu, tendem ao seu ocasional ocaso.

Pode parecer um ato de extrema vaidade, você pode estar provavelmente pensando: “Nossa! Tácio é um cara extremamente egocêntrico!”. Mas antes de me julgar assim, peço que leia um pouco mais sobre o que é este sentimento de “divinação” que nutro em mim.

Ao usar o termo deus, não busco lastro no sentido comum da palavra, não o atrelo ao sentido nem greco-romano e nem abraâmico do termo. Não tento bancar os imperadores que queriam ser deuses dos homens, senhores de seu destino. Nem mesmo busco caminhos místicos presos em auras obscuras. Quando me autoproclamo dessa forma, sintetizo um conceito de divindade que existe em um termo que falei logo no início deste texto: narrativamente auto-criado.

Há alguns anos, eu entrei em um processo de reflexão existencialista profunda. Nessa época eu sofri bastante, tanto interna quanto externamente, dado acontecimentos à época bem doloridos. Por algum tempo fui me afundando e perdendo as minhas crenças pessoais, não em termos religiosos, mas em termos de autoimagem e imagem do mundo, de ideais e sonhos. No fim de todo esse processo, no qual me dei conta da natureza essencialmente narrativa do ser humano (indico a leitura do livro Homo Deus de Noah Harari, caso queira ler mais sobre isso), eu percebi que naquele momento de sofrimento interno eu também estava fundamentando novas narrativas, pois é isso o que nós humanos fazemos, consciente ou inconscientemente. O dinheiro, o estado, o socialismo, o capitalismo, os salvadores e corruptores, são, em sua essência, frutos da nossa narrativa criadora que, em alguns casos, tomam tamanha capacidade inconsciente, que não paramos para refletir e tratamos como se fossem coisas existencialmente vivas.

Diante do poder narrativo que eu havia descoberto em mim, fruto de milhões de anos de evolução e desenvolvimento dos nossos córtices cerebrais a fim de conseguirmos fundamentar uma sociedade funcional, eu pensei: “Se posso conscientemente diminuir minha existência a um singelo grão de poeira sobre um pálido ponto azul que flutua sobre a amedrontadora imensidão espacial, por que não posso me fazer um ser divino dentro de mim? Por que não posso criar uma divindade consciente que me permita vivenciar meu meio externo com o melhor da minha autoconfiança e autoestima? Por que não? Preciso mesmo ser uma pessoa narrativamente triste?

Eu não sou um ser perfeito. Não posso fazer os átomos se rearranjarem para que eu possa criar um reino metafísico, mas isso não quer dizer que minha existência precise ser apenas um conjunto de átomos. Em meu credo autocriado, eu reconheço minhas limitações, sei que tenho que melhorar em muitas coisas e que evoluir é uma constante. Entretanto também sei que mesmo que eu me vá um dia, ainda vou existir para além da minha vida terrena. Nas lembranças, nas emoções de amor, ódio e esperança daqueles com quem já me conectei. Vou morrer e ser ressuscitado em lapsos de memória de pessoas que nem sabem meu nome. Vou estar nas coisas, nos símbolos que criei e que criaram para mim. Nas frases que proferi repetidas por outros que nem sabem que elas nasceram em mim. Até mesmo neste texto, gostando dele ou não, esquecendo dele em seguida, sou parte de você e em você me faço imortal por um breve momento. Isso é o fundamento da minha divindade: Existir para além das coisas físicas, em mim, nos outros e nas coisas.

Por fim, escrevendo este texto ao som do Inverno de Vivaldi, termino minha divagação sobre a síntese da divindade que forjei para mim mesmo. E agora, como um rapsodo que cruza os quatro cantos do mundo contando suas histórias, peço que aceite este convite quase herético de ousar ser mais, ousar ser imortal num corpo mortal. Infinito num tempo que há de terminar.

“Eis que quando descobri a finitude fundamental da nossa vida, descobri a capacidade de ser infinito num corpo finito. De ser imensurável num tempo que há de ruir.”

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Sobre Tacio Brito

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Tácio Brito é empresário, consultor de cultura e inteligência artificial, polímata, mestre maçom da ARLS Universitária Sergipe D'El Rey Nº 4703

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