Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos (*)
Deixar a casa de minha mãe aos dezessete anos de idade foi uma das minhas experiências mais dolorosas. É bem verdade que o futuro sorria para mim com o início de uma nova fase, na condição de aluno da turma 1992.1 do Curso de Licenciatura em História da Universidade Federal de Sergipe. Ainda assim, eu temia não encontrar naquele ambiente o carinho, o esteio e o amor que tinha, diariamente, no seio familiar. Se ser mimado é isso, nunca tive vergonha de vestir esta carapuça. O colo de mãe (sendo órfão de pai desde os oito), a convivência com seis irmãos e a confraria dos amigos, em Lagarto, era meu mundo até aquele momento.
Foi nesse contexto que a conheci. Ela, a nossa “tia”, Terezinha Oliva, a “mãe”, e Eduardo Pina, o “divo” ou até mesmo uma espécie de “irmão mais velho”, descolado e inteligente, sempre entusiasta e entusiasmante em suas aulas. Para além deles, outros tantos que também nos tinham atenção, afeto e uma esmerada dedicação professoral e competência técnico-intelectual, a saber: Jorge Carvalho, Lenalda Andrade, Lourival Santos, Antonio Lindvaldo, Ruy Belém, Fábio Maza, Maria da Glória Andrade, Carlos Liberato e Fernando Sá. Sem falar nos demais, que compunham o quadro de disciplinas de outras áreas.
A primeira impressão que tive da professora Verônica Nunes foi a melhor possível. Quando chegou na sala de aula, em seu primeiro dia de aula, seus olhos brilhavam e o sorriso ia de um canto a outro da orelha. Pensei comigo: “esta, realmente, tem o dom de ensinar e ama o que faz”. Fisicamente baixa, facilitava, além do abraço afetuoso, o cheiro na cabeça, coisa que faço até a presente data quando a encontro. Naquela oportunidade, para ser mais exato, 1994.1 (e lá se vão 30 anos), ela lecionava História da América I, repetindo a dose em História da América II, no semestre seguinte. Nossa turma era pequena, não chegava a vinte alunos. Logo, logo, ela se afeiçoou a gente e nos proporcionou uma visita técnica à cidade de Laranjeiras. Era a primeira vez que eu conhecia uma cidade histórica. Aquele dia foi inesquecível, sobretudo pelo carinho da mestra e cuidado para com a gente, sem falar na aula magna de arqueologia, história, memória e patrimônio cultural de Sergipe. Lembro de alguém ter feito alguns registros fotográficos, mas não encontrei nenhum em meu acervo.
No último dia 5 de dezembro, a professora Verônica Nunes foi, com muita justiça e merecimento, homenageada, por ocasião do encerramento do XIII Encontro de Pesquisadores Iniciantes das Humanidades (IH), promovido pelo Programa de Educação Tutorial do Departamento de História (PET História UFS), sob a tutoria do Prof. Dr. Luís Eduardo Pina Lima. Estavam presentes, além deste que escreve, a Profª. Drª. Natália Abreu Damaceno e Prof. Dr. Dilton Cândido Maynard, Pró-Reitor de Graduação. Pega de surpresa, ela ficou muito emocionada, e, ao receber a Placa de Honra ao Mérito, disse da sua alegria de estar vivendo aquele momento, destacando os anos que dedicou à docência na instituição. A professora Maria Magna lhe dirigiu algumas palavras de saudação e de gratidão.
Verônica Maria Menezes Nunes nasceu em Aracaju, no dia 3 de maio. Filha de José Correia Nunes e Zuleica Menezes Nunes, pais dos irmãos Vera Martha, José Correia Nunes Filho, Antônio Fernando, Lauro Henrique, Silvia Helena e Geraldo Luiz. Seu José foi funcionário público federal; a mãe, dona de casa. É a mais velha de uma grande família que gerou professoras, advogado, engenheiro, bibliotecário. Seus genitores priorizaram o carinho, o afeto e a educação.
Fez a formação básica nas seguintes instituições aracajuanas: Educandário Arquidiocesano Sagrado Coração de Jesus, 1963; Colégio Tobias Barreto, 1967; Colégio Estadual Atheneu Sergipe, 1970. Em 1977, formou-se em Licenciatura em História, pela Universidade Federal de Sergipe. É Especialista em Educação no Mundo Subdesenvolvido, também pela UFS, desde 1985. Na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/Uni-Rio, concluiu o Mestrado em Memória Social e Documentos, em 1993. Em 2018, o Doutorado em Arqueologia, pela Universidade Federal de Sergipe.
Perguntada sobre o porquê da docência e da História como ofícios, assim me respondeu:
História é um grande fascínio. Entender o tempo, compreender as mudanças e, a partir daí, entender os objetos como fontes e testemunhos do passado preservados no presente. Daí um passo para a Museologia. E entre salas de aula e museu fui construindo a bagagem cultural que me proporcionou desenvolver pesquisas sobre arte e artistas sergipanos que fomentaram minhas atividades didáticas envolvendo os dois e campos além de trilhar o canteiro do patrimônio cultural, no qual pesquiso festas, religiosidade e patrimônios material e imaterial. A docência sempre foi o espaço para aprender e ensinar, desde cedo, quando meus pais nos pediam para alfabetizar o pessoal que colaborava com mamãe cuidando de mim e de meus irmãos (Aracaju-SE, 11 de dezembro de 2024).
Profissionalmente, ingressou na Secretaria de Educação e Cultura em 1974, quando foi lecionar no Colégio Murilo Braga, em Itabaiana-SE. Em Aracaju, ensinou no Colégio Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora e no Colégio de Ciências Pura e Aplicada. Após concurso público, tornou-se efetiva do magistério municipal, tendo lecionado na Escola Florentino Menezes, em Areia Branca. Sua primeira experiência nas lides culturais foi no Museu Histórico de Sergipe (em São Cristóvão), do qual foi diretora. Depois, Museu da Polícia Militar de Sergipe, no processo de revitalização para comemorar os 150 anos da corporação.
Na Secretaria Municipal de Cultura, sob a coordenação de Maria Lúcia de Carvalho Leite, desenvolveu o projeto para a criação do Museu da Cidade de Aracaju. Na UFS, envolveu-se em atividades museológicas no Museu de Antropologia, depois Museu do Homem Sergipano, sob as direções da Profª. Helia Maria de Paula Barreto e da Prof. Dra. Terezinha Alves de Oliva. Nessa instituição, também foi diretora. A convite do prof. José Ibarê Costa Dantas, então presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE), foi diretora do Museu Galdino Bicho e da Pinacoteca Jordão de Oliveira. Para ela, uma experiência valiosa e gratificante, sobretudo, no processo de levantamento, catalogação e montagem da exposição de longa duração do museu.
No campo da pesquisa, destacou-se no trabalho realizado pelo Projeto Xingó, desenvolvido pelo Projeto do Centro de Documentação do Baixo São Francisco, com os professores Maria Tereza Souza Cruz e Fernando Sá, envolvendo discentes e recém-formados, no levantamento de fontes históricas e patrimoniais sobre a região. Nesse período, colaborou com o Prof. Dr. Alexandre Diniz (UFS) e com a museóloga Dra. Cristina Bruno (USP), no projeto de instalação da exposição de longa duração do Museu de Arqueologia de Xingó.
De volta às atividades didáticas no Departamento de História, foi convidada pelo então Reitor, Prof. Dr. Josué Modesto dos Passos Subrinho, para colaborar na instalação do Curso de Museologia, no Campus de Laranjeiras (Campus Dr. Antônio Garcia Filho) do qual fui a primeira coordenadora. Depois disso, retornou à sala de aula até a presente data, quando se prepara para encerrar a carreira, após 50 anos de ensino, dos quais 32 na Universidade Federal de Sergipe (1992 a 2024) — efetivamente 30 anos, a julgar pelos 3 anos em licença para tratamento de saúde.
Após uma longa e feliz primavera, assim ela projeta seus novos outonos: “Manter o corpo e mente em ação. Dar continuidade a pesquisas que não concluí, escrever artigos. E retornar a estudar um instrumento musical para ocupar o tempo com coisas boas que proporcionam prazer e alegria. Como digo — Paz para a alma sorrir”.