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A crueldade das relações atuais para as mulheres: patriarcado disfarçado

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Petruska Menezes (*)

Quem fala em liberdade e direitos femininos na contemporaneidade não pode deixar de perceber que, em determinadas esferas da vida, esses direitos ainda não chegaram de fato. Estão mascarados por uma pseudoliberdade cedida por uma mão e retirada por outra. As relações e vínculos da sociedade líquida é muito mais cruel com as mulheres.

Homens e mulheres possuem jeitos diferentes de ser. Não é possível pensar que os modos de funcionar sejam iguais. É fato que aquilo que construímos de feminino e masculino dentro de cada um, num modelo bissexual freudiano, existe, não contesto, mas a forma de sentir é predominantemente diferente, até por causa do processo adaptativo evolutivo – que o diga Darwin, em seu túmulo.

No complexo sistema patriarcal, o homem precisa se sentir detentor do maior número possível de mulheres, alcançando sua frágil masculinidade, por meio de inúmeras conquistas, mas se uma mulher ingressa neste modelo relacional e tenta se envolver com muitos homens ao mesmo tempo, caso isso seja descoberto, ela é veementemente excluída de qualquer contexto social, real ou virtual, sobretudo pelos homens e, muitas vezes, até pelas próprias mulheres, que também a julgam. Não acreditam nisso? Vamos fazer um exercício.

Se você é mulher, experimente conversar com pessoas que deram match em seu aplicativo de relacionamento, afirmando que tem uma vida sexual ativa. Prefiro não comentar as informações e depoimentos colhidos e deixar que cada uma vivencie, por si, a total presença do patriarcado atual. Agora, segundo momento: pergunte com quantas mulheres um homem se relacionou no último mês. Ou melhor, questione se ele tem vida sexual ativa. Se houver verdade, estará muito claro que existe um enorme e presente abismo entre os direitos e os espaços ocupados pelas mulheres.

As mulheres têm a mesma liberdade que os homens? Image: Pixabay

É interessante como em uma sociedade que se autodefine tão moderna, ainda se coloca a mulher em uma situação de submissão e alienação de vários tipos de relação ou encontro. A crença de que homem quando transa não trai, porque sua vinculação pertence somente à esposa ou à namorada funciona na mente masculina, mas não pode ser direito igual, se for a esposa quem pratica.

Ah, mas os homens, em sua defesa, irão dizer que mulher sente diferente. Verdade, mas então, por sentir diferente, ela tem de se submeter a uma situação de obtenção única de prazer enquanto os homens se permitem muitas – visto que prazer e amor diferem na crença e fantasia masculinas?

Freud e, posteriormente, Joyce McDougall, psicanalistas estudiosos da sexualidade humana, falam sobre a importância e capacidade humanas de obtenção de prazer de formas inumeráveis e saudáveis, desde que não destrua a si ou ao outro (inclusive concretamente). Se não somos machistas, por que a mulher tem de se privar desse direito? Por que ela não pode ter reconhecida sua liberdade sexual, sem ser cancelada por alguém que faz o mesmo?

Não é apologia à franqueza extrema, porque esta não se faz necessária. Se hoje nos encontramos nos grupos de Facebook, nos directs do Instagram, no Telegram e aplicativos de relacionamentos – como Tinder, Match e Par Perfeito – é porque se busca maior possibilidade de relação, independentemente de como cada um vai construir as suas. Até porque, para se encontrar alguém para namorar ou ter um relacionamento monogâmico, é necessário conhecer muitas pessoas… até achar “a certa” – se é que isso existe.

Mas, se observamos um pouco com um olhar crítico por debaixo desse véu social, que insiste em dizer que as mulheres têm a mesma liberdade que os homens, estaremos igualando a afirmação de que os negros são livres e não possuem sequelas estruturais que perpassam suas vidas. E por falar nisso, se for mulher e negra, o véu social é uma absurda e imensa prisão, que a exclui e amarra ao pé da cama, e exige que se prove – todo o tempo – uma pureza hipócrita e de exclusão. Lamentável ainda sermos obrigadas a viver muitos anos de uma luta futura, para tentar desconstruir formas de ser e agir que buscam aplacar as dores das almas humanas masculinas à custa da crueldade com o feminino.

(*) Profa. Esp. Petruska Passos Menezes é psicóloga e psicanalista, integrante do Círculo Psicanalítico de Sergipe, tem MBA em Gestão e Políticas Públicas pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), Gestão Estratégica de Pessoas (pela Fanese), Neuropsicologia (pela Unit) e em curso Gestão Empresarial pela FGV.

** Esse texto é de responsabilidade exclusiva da autora.  Não reflete, necessariamente, a opinião do Só Sergipe.

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