No reino animal toda vivência coletiva tem uma relação de liderança compartilhada. Entre os humanos, o aprimoramento é cada vez mais necessário. Na unidade familiar, no trabalho, na prática esportiva, no lazer, nas relações sentimentais, nos confrontos políticos e militares, ou em qualquer relação de poder, a figura do líder é inerente.
As mudanças nos relacionamentos sociais iniciadas no final do século XX, associadas ao momento difícil na saúde da maior parte da população do planeta, ensejarão rigor nas características dos líderes nos agrupamentos sociais. Cada um exerce a função de liderança como bem entender. Ônus e bônus podem ser individuais mas, na função pública, respeitar e proteger o coletivo são imperativos.
“Sob a direção de um forte general, não haverá jamais soldados fracos”. Já dissera Sócrates há mais de 2.500 anos aproximadamente. A dubiedade e confusão do líder deixam os liderados fragilizados. Conforme disse Bob Galvin, “acredito que, em última análise, a função do líder é espalhar esperança”. Sem esperança entraremos no caminho do caos. Para Napoleão Bonaparte “um líder é um vendedor de esperança”. O líder não pode propagandear desesperança.
“Não se é líder batendo na cabeça das pessoas – isso é ataque, não é liderança”, disse Dwight Eisenhower. Auxiliares numa direção, políticos noutras, hoje é assim, amanhã não. Apague tudo! Tal inconstância numa direção administrativa confunde toda sociedade com consequências profundas no ordenamento social. É preciso que o líder perceba que “um chefe é um homem que precisa dos outros” como disse Paul Valéry. “O maior líder é aquele que reconhece sua pequenez, extrai força de sua humildade e experiência da sua fragilidade”, argumentou Augusto Cury. Por outro lado, “a maior habilidade de um líder é desenvolver habilidades extraordinárias em pessoas comuns”, nos ditou Abraham Lincoln. Até a ultraconservadora Margaret Thatcher defendera: “o consenso é a negociação da liderança”. Produzir divergência em momentos difíceis, universalmente, é colocar em risco toda instituição liderada e todas relações sociais inerentes.
Segundo a obra “O monge o e executivo”, de James C. Hunter, ouvir as pessoas, gerenciar, estimular respeito, dignidade, sentimento de participação, entender que a confiança é essencial para qualquer relacionamento. Adaptar-se à mudança, servir, pôr-se à disposição, valorizar a motivação, compreender, são posturas típicas de um líder. Caso contrário, poderá dispersar-se em ações sem sentido. Pode cair na desqualificação da função. Eis o risco! A maior ferramenta do líder para superar o sofrimento é o diálogo que pressupõe capacidade de ouvir, combinar e compartilhar dentre seus atributos.
A arte de escutar
Diálogo pressupõe capacidade de ouvir, qualquer que seja o interlocutor: filho (a), empregado (a), aluno (a), amante, religioso(a), opositor(a) político(a), esportista, vizinho(a) etc. “A natureza deu-nos duas orelhas e uma só boca para nos advertir que se impõe mais ouvir do que falar” ensinara Zenão de Citio, o sábio grego. Segundo Johann Goethe “falar é uma necessidade, escutar é uma arte”. Um bom diálogo usa a modéstia, isola a arrogância, pratica humildade e tolerância ouvindo opiniões, evita falar de si próprio. “Mas”, “todavia”, “entretanto”, “contudo” não geram empatia.
Possivelmente se no diálogo ouvíssemos mais, compreenderíamos mais. O momento exige de todas as pessoas, em especial, dos líderes no ambiente da convivência humana, muita capacidade de ouvir para facilitar o diálogo como liga maior da convivência.
Na convivência familiar, no trabalho, no esporte, na igreja, nas associações, sindicatos, política ou religião, liderar no século XXI difere bastante dos séculos passados. Tecnologia, meios de comunicação, linguagens e costumes sofreram radicais mudanças. Não se quer tanta virtude de quem exerce a função de líder, mas embarcar na contramão universal da saúde é, no mínimo, questionável. Muitos supostos líderes correrão o risco de serem punidos pela história, sem direito de defesa. Usar da função para fazer discurso para seguidores fanáticos, radicaliza e pode ter sido o lançamento da pedra fundamental de uma queda. Uma boa ferramenta entre os liderados é a união. Jamais deve ser descartada.
A importância do consenso
Escrevemos no jornal “O Dia” sobre as manifestações de 2013 afirmando que era preciso escutar o grito das ruas. Hoje afirmamos, é preciso perceber as mudanças. Espera-se de pais ou responsáveis pelas famílias, trabalhadores(as), instituições esportivas, empresas, gestores públicos, educadores(as), imprensa, etc. uma ressignificação de postura de líderes condutores(as) dos destinos dos brasileiros. Oscilações de humor não podem ficar submissas a bipolaridades pessoais, mormente quando milhões de liderados vagueiam em busca de amparos norteadores.
A exemplo, na quarentena, o líder de uma unidade familiar necessita de criatividade. Propor um calendário consensualizado diário de atividades entre seus componentes, facilita o uso do tempo na busca de um ócio criativo. Compartilhar decisão sobre horário para filmes, debates, alimentação, espiritualidade, leitura, jogos, redes sociais, limpeza da casa, etc disciplina as relações internas e fortalece a convivência no plano organizacional. Núcleos familiares, sob um mesmo teto, podem transformar a casa dormitório em ambiente prazeroso para reduzir o desejo de ir para rua.
Os espaços domiciliares são pequenos e as dificuldades econômicas serão incalculáveis entre os povos do planeta. Estamos vivendo, e viveremos o pós-vírus, profundas mudanças nas relações entre as pessoas. Uma delas, a maneira de exercitar uma liderança. A hierarquia impositiva perde espaço para uma hierarquia construída solidariamente no cumprimento das normas internas. Líderes que fundamentarem suas posturas ou argumentos na acusação de terceiros tenderão ao fracasso ante a ausência de sustentação dos discursos. Poderão ir do céu ao inferno rapidamente porque a ciência sairá fortalecida doravante.
E nós, liderados e líderes, como vamos desempenhar nossos papéis nestes cenários?
(*) Valtênio Paes de Oliveira é professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada -Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.