A guerra fiscal entre os Estados remete à segunda metade do século XX. Os Estados intensificaram a concessão de benefícios com o intuito de atrair empresas e investimentos que pudessem levar desenvolvimento econômico e social para seu território e seu povo, através da geração de emprego e renda. Com o passar dos anos a disputa entre os entes federativos se acirrou, entre outros motivos, pela ausência de uma política nacional de desenvolvimento regional, que promovesse equidade na cadeia de produção dos estados. O que deu vantagens competitivas a uns, em detrimento de outros menos favorecidos em níveis educacionais e populacionais.
Essa disputa acirrada desaguou no judiciário, com centenas de processos que questionavam a legalidade dos benefícios concedidos pelos Estados. Até que em 2012, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, declarou que a instituição iria avaliar a edição de uma súmula vinculante que tornaria ineficaz tais benefícios concedidos pelos Estados. Além disso, seriam cobrados os créditos tributários retroativos ao período de cinco anos, das empresas que aderiram aos incentivos.
Várias medidas foram engendradas por órgãos da União com o propósito de equalizar as divergências tributárias entre os estados, a exemplo da Resolução número 013/2012 do Senado Federal, que visava fazer face à concessão de benefícios a produtos estrangeiros, que prejudicavam o produto nacional (Guerra dos Portos); a Medida Provisória 599, que propunha a reforma estrutural do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); o Projeto de Resolução número 01/2013, que declinava as alíquotas interestaduais, jogando a tributação do ICMS para o destino; o Projeto de Lei Complementar 238/2013, que flexibilizava o quórum do Confaz para a aprovação do Convênio de Convalidação, entre outros.
Nesse diapasão foi aprovada a Lei Complementar 160/2017 que reconheceu a concessão de benefícios fiscais de maneira irregular, pelos Estados, por não seguirem o rito preceituado na Constituição Federal, para a concessão de benefícios e autorizou a remissão dos créditos tributários, desde que os Estados seguissem, a partir daquela data, a regulamentação ordenada na Lei. Além disso, possibilitou a reinstituição dos benefícios fiscais concedidos pelos Estados, com prazos variados de vigência, de acordo com o setor da atividade econômica.
Essa divergência entre prazos de vigência de benefícios fiscais entre setores produtivos, cria uma distorção entre atividades econômicas que, se não houver a equalização dos prazos para por setor, manterá um quadro de injustiça tributária complexa.
Pela Lei Complementar 160/2017, o setor de comércio atacadista, por exemplo, será altamente prejudicado, caso as condições que possibilitam a atuação das empresas nos Estados, deixem de existir a partir do ano de 2023. A mudança poderá colocar em risco os empregos de milhares de sergipanos que trabalham na cadeia direta e indireta de abastecimento do comércio e serviços, pois todas as atividades dependem do atacado distribuidor para funcionar.
Em Sergipe por exemplo, são mais de 700 empresas que atuam no setor de distribuição de alimentos, produtos de higiene, limpeza, medicamentos, entre outros, que juntas, empregam 15 mil colaboradores diretos, chegando a 30 mil indiretos, que arrecadam 15% do ICMS auferido mensalmente pelo Estado e contribuem com 14% do PIB estadual, com mais de 6 bilhões de reais de movimentação financeira por ano.
No bojo da sua atividade, as empresas do comércio atacadista distribuidor exercem um trabalho social e desenvolvimentista relevante, pois levam à produção para fortalecer o comércio varejista dos 75 municípios do estado, fortalecendo o comércio local, o pequeno varejo, as micro e pequenas empresas, maiores geradoras de emprego de Sergipe. Onde existe uma mercearia, um mercadinho, uma farmácia, uma clínica, um hospital, um salão de beleza ou um pet shop, até mesmo no pão de cada dia, lá vai estar presente um atacadista distribuidor. Em Sergipe, esses estabelecimentos totalizam oito mil negócios, de pequeno e médio porte, que contribuem para o fortalecimento da economia local, em todos os municípios. Por esses motivos, é justo e necessário equiparar os prazos de vigência dos benefícios fiscais das empresas do setor comércio aos prazos do setor agroindustrial, cujo prazo de vigência é 2032.
A finalidade do ICMS é ser um imposto sobre o consumo, sendo necessário corrigir problemas estruturais, para que a receita auferida do ICMS pertença ao ente federativo onde ocorre o seu consumo, deixando de ser um imposto interestadual sobre a produção, que no sistema vigente está ancorado no princípio da origem e destino, prejudicando o crescimento das cidades e do próprio Estado.
Tal discussão deverá estar na pauta de uma reforma tributária que tenha possiblidade de ser consensuada entre os entes federados. E assim, pôr fim de uma vez por todas, a uma das causas que motivaram a guerra fiscal entre os estados para atraírem empresas. Até lá, é razoável à manutenção das condições fiscais atuais, necessárias para atuação das empresas do setor do comércio de bens, incluindo, o atacado distribuidor, sob pena de uma interrupção abrupta trazer consigo consequências econômicas e sociais que acentuariam ainda mais as desigualdades e dificuldades econômicas que os estados estão atravessando, principalmente os da região Nordeste, no qual Sergipe está inserido.
É imprescindível que a equiparação dos prazos de vigência dos benefícios fiscais do setor comércio aos de outros setores com vigência até 2032 esteja na pauta de discussão entre setor produtivo e os representantes dos poderes estaduais, em todos os níveis. Tornando-se um ponto essencial para o planejamento de médio e longo prazos, para que Sergipe continue avançando rumo ao desenvolvimento econômico e social.
(*) Breno França é presidente do Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor do Estado de Sergipe (Sincadise)