“Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Esse trecho da música “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, cai como uma luva para retratar a iniciativa da turismóloga e presidente da seccional Sergipe da Associação Brasileira de Turismólogos e Profissionais do Turismo (ABBTur), Ellen Carvalho, que durante três anos, entre os cursos de pós graduação e mestrado, pesquisou novos roteiros turísticos no interior de Sergipe para fugir do lugar comum: sol e mar. Ao tomar tal iniciativa, ela defende que o setor privado não fique no eterno compasso de espera pelo setor público que, nem sempre tem vontade, recursos ou pessoal capacitado para investir no turismo, uma atividade que produz emprego e renda quando bem gerido.
Para ela, “esse modelo de que a gestão pública deve investir é algo muito antigo”, por isso ela arregaçou as mangas e foi a campo e criou roteiros rurais no Estado, a exemplo do que foi lançado na quinta-feira, em Itabaiana, chamado “Rota Turística Caminhos da Serra de Itabaiana”.
A convite da prefeitura de Itabaianinha, ela pesquisou e criou a Rota da Cerâmica, já que o município tem a economia baseada nesse segmento. E no povoado Poxica descobriu que a escritora Cecília Meireles visitou o local e se encantou com uma das cerâmicas com desenhos indígenas e lhe deu um nome: louça morena. “Essa louça é produto de exportação”, disse Ellen Carvalho.
Ela lembra que nos últimos três anos, enquanto fazia o mestrado e uma pós graduação, promoveu palestras, conferências, mostrando a importância do turismo rural, mas poucas pessoas compareceram aos eventos. Agora, no entanto, justamente por ser um ano eleitoral, muitas pessoas – principalmente os candidatos – se mostraram muito interessados em turismo. “Espero que não seja fogo de palha”, avisou.
Esta semana, logo após o lançamento da Rota Caminhos da Serra de Itabaiana, Ellen Carvalho conversou com o Só Sergipe.
SÓ SERGIPE – A senhora tem um trabalho voltado para o turismo rural. Falta por parte do setor público esse olhar para o interior?
ELLEN CARVALHO – Na verdade, eu acho que falta esse olhar, não só do setor público, mas dos empresários, dos profissionais. Aqui estamos habituados a levantar a bandeira do turismo de sol e praia, aquele turismo de massa. Mas é o seguinte: não conseguimos competir com os nossos vizinhos Alagoas, Bahia, com relação às praias deles. E acabamos sendo, apenas, uma opção em segundo plano. Nunca seremos a primeira opção porque, apesar das nossas praias terem uma infraestrutura maravilhosa, serem limpas, com uma boa quantidade de bares e restaurantes, a orla da Atalaia, considerada a mais bonita do Brasil, as pessoas se ligam muito na água cristalina, azul. Já recebi turista e ele quando chegou ao Mosqueiro falou: ‘quero que você me leve para uma praia de água azul’. Eu expliquei o porquê da cor da água, que é uma questão geográfica, a influencia do rio São Francisco, mas ele simplesmente não aceitou e fiquei como se fosse mentirosa. Então, as pessoas geralmente procuram por esse aspecto da beleza. E nosso Estado é quase todo rural, muitos municípios não divulgam essas atividades, por falta de conhecimento e de profissionais que tenham essa visão, no caso os turismólogos. Sempre levanto essa bandeira, de que temos de desenvolver um turismo profissional, responsável, com planejamento, sustentabilidade. E vejo que esse é, inclusive, o futuro. Se você for observar agora, nessa retomada pós pandêmica, só se fala em ecoturismo e turismo rural, em contato com a natureza, fugindo das grandes capitais, de aglomerações. Se, de repente, os gestores públicos e os empresários visualizassem isso iriam investir e teríamos mais opções a oferecer para os nossos visitantes.
SS – Como a senhora, mestra em Turismo, analisa o setor ao longo dos anos? Será que falta um direcionamento melhor, uma conversa com os prefeitos para fomentar o turismo rural?
EC – Eu lancei esta semana “Rota Turística Caminhos da Serra de Itabaiana”: fazemos uma passagem pela serra, através do Parque dos Falcões e todo o restante fica no entorno e escolhemos esse nome porque percebemos que a serra tem um apelo muito forte na região. E não poderíamos deixar de citá-la. Na maioria dos lugares que íamos visitar, a exemplo da Cooperativa de Castanha do povoado Carrilho, quando olhávamos ao redor a serra estava presente; no bairro Chiara, quando observamos, a serra estava atrás da gente. Todos os caminhos levam à Serra de Itabaiana e foi nessa perspectiva que escolhemos o nome para a rota.
SS – Mas o que falta na gestão pública?
EC – Sobre isso, falta muita coisa mesmo. Hoje acho que falta da gestão mais disponibilidade de investimento no turismo, como também falta do empresário que fica mal acostumado esperando só que a gestão invista. Esse modelo que só a gestão deve investir é algo muito antigo. Hoje, Gramado e Canela (RS) é o que é porque houve parceria e investimento dos empresários, que se mobilizaram e funciona muito bem. Gramado é sucesso o ano todo. Não quero apontar culpados, mas o que falta é de muitos anos. Não adianta, agora, falar de gestão atual. Tenho visto um esforço do atual secretário, ele busca, procura.
SS – A senhora falou eu Gramado, mas aqui perto da gente, na Chapada Diamantina (BA) é turista o tempo inteiro.
EC – Os nossos vizinhos sabem explorar bem há anos. Eles estão à frente anos luz da gente, com relação ao turismo. Falando no Estado, envolvendo todos os atores, o que falta é criar a consciência de que atividade turística não é só passear, não é algo sem importância, só lazer. É um trabalho sério como qualquer outro e tem que ser feito de maneira profissional, que vai desenvolver a economia. Nós temos exemplo de um museu na Europa que recebe mais turista que o Brasil o ano todo. Por que será que isso acontece? Porque na Europa eles têm uma visão diferenciada. Não é à toa que o turismo é a terceira atividade que mais movimenta a economia no mundo. Mas me pergunto: será que os gestores (do presidente aos prefeitos) têm essa visão? Será que eles dão essa importância ao turismo? Acho que essa é uma visão geral, não é somente Sergipe, só Aracaju ou Itabaiana. Será que é dado a devida importância? Apostar na atividade turística não seria uma saída para a crise que estamos vivendo? Turismo traz emprego, renda, mais empresas e todos acabam ganhando. Mas para isso, que foi o papel que desempenhei com a criação desta rota para Itabaiana, realizei estudo, levantamento de dados, planejamento. Não pode dizer, simplesmente, vou trazer o turista e pronto. Estou tendo muito cuidado com essa rota e desenvolvemos um selo de qualidade, que todos os estabelecimentos que quiseram trabalhar, receber os turistas, terão que passar por um treinamento e adequações, para que possamos indicar.
SS – Isso passa, também, por uma conversa com as operadoras, as empresas áreas, porque hoje há mais opções de voos para Aracaju, o que não havia antigamente.
EC –Temos poucas ofertas de voos e os que existem não são baratos. Realmente, é algo que deixa a desejar. Mas quando gerarmos essa consciência coletiva, a coisa passa a acontecer. Eu estou em Itabaiana organizando esse roteiro e foi muito difícil. Nós promovíamos palestras, oficinas e pouquíssimas pessoas participavam. Agora, que estamos num momento eleitoral, todo mundo falando de turismo na cidade, todos sabem desenvolver turismo, têm projeto. Parece que despertou e espero que esse interesse seja dado continuidade pós eleição e não seja só promessa ou fogo de palha.
SS – Além desta rota de Itabaiana, a senhora criou outras?
EC – Tenho vários projetos, um deles acontece em Aracaju, que chama Gosto Aracaju Ônibus do Forró, inclusive já ganhei dois prêmios, um deles em São Paulo. A proposta é o seguinte: trabalhando com o turista, ele sempre vinha para cá e durante o dia preenche a agenda dele, e à noite o que temos? Aí, sempre oferecia a orla à noite, mas se a pessoa passar mais de dois dias aqui, ela não terá mais nada para fazer à noite. Fui inspirada por um professor, durante a aula, que apresentou para a turma o By Night, nada mais que apresentar a noite. E pensei: vamos fazer isso dentro de um ônibus que tem estrutura para balada, e eu criei um cenário dentro do ônibus. O veículo é todo decorado, a venda de bebidas típicas, fazemos quadrilha e a animação vai envolvendo, ele vai conhecendo o que é o forró. Por aí afora vendem que Sergipe é o país do forró, mas se chegar aqui e não for na época junina, não encontra nada. Para ser país do forró, tem que ter o ano todo.
SS – Quais as outras rotas que a senhora criou?
EC – Fui convidada pela prefeitura de Itabaianinha para fazer uma inventariação turística por lá e criar uma rota. Fiz um levantamento, produzi um documento e consegui formar a Rota da Cerâmica, porque lá, além da influência da cerâmica do tijolo, que é muito forte, tem o povoado Poxica, muito conhecido pelo artesanato de cerâmica, inclusive tem uma cerâmica diferenciada chamada “louça morena”, que é exportada e pouco se conhece aqui. Quem deu esse nome foi Cecília Meireles, num evento que o pessoal expôs, através do Sebrae. Cecília foi até lá, viu a louça muito bonita, com traços indígenas. Ela perguntou o nome e a moça que a atendeu disse que não tinha nome. E Cecília disse que ia se chamar “louça morena”. Essa é apenas uma das muitas coisas para se conhecer em Itabaianinha. Temos também a rota Cultural das Sensações, que envolve Aracaju, Barra dos Coqueiros e Santo Amaro, com pegada de turismo rural e de experiência.
SS – Como é essa rota?
EC – Nós saímos daqui de Aracaju de tototó, através do Rio Sergipe para Barra, o turista conhece o projeto das Catadoras de Mangaba, volta e vai para terminar o dia na Fazenda Por do Sol, uma propriedade com piscina, quadra, alojamento e lá tem um pôr do sol maravilhoso. E há outras duas que melhorei: são as rotas das Cidades Históricas (São Cristóvão e Laranjeiras) e rota do Sertão, trazendo experiências diferentes. Eu trago a perspectiva de trabalhar com turismo de experiência e criativo. E diante desses roteiros que criei, em setembro fui escolhida para representar aqui em Sergipe a Rede Recria, que é a Rede Nacional do Turismo de Experiência e Turismo Criativo. Podemos investir nisso e não ficar dependendo somente do turismo de eventos, que são sazonais.
SS – No município de Laranjeiras existem muitas grutas e isso não é explorado turisticamente. Por quê?
EC –Sim, existem muitas grutas em Laranjeiras. Porém, foi feita uma pesquisa com a comunidade e ela não quer trabalhar com o turismo. Eles não aceitam. Quando falamos em turismo responsável, sustentável, não podemos chegar na comunidade e impor, porque senão eles vão expulsar os turistas. Se eles não aceitam, não tem como desenvolver, infelizmente.
SS – A senhora conhece algumas destas grutas?
EC – Conheço a gruta da Pedra Furada, que tem acesso mais fácil. E até existe uma lenda que tinha uma igreja em São Cristóvão e que havia um túnel que saía nessa gruta. Mas o fato de uma gruta dessa não ser explorada passa por gestão. A comunidade, às vezes, não tem interesse por não ter conhecimento. O que essa atividade vai trazer de retorno? Você pode dizer que se quiser trabalhar com turismo, vamos trazer visitação, o senhor coloca uma barraca de lanche para ganhar seu dinheiro ou então para entrar no seu terreno, cobre R$ 5,00 por pessoa e vai ajudar na manutenção da área. Entendo alguns donos de terreno que não querem receber, pois algumas pessoas não têm essa consciência e sujam o local.
SS – Essas rotas que a senhora criou já estão sendo exploradas?
EC – É um projeto que vai começar a ser explorado em 2021, pois desde 2017 venho fazendo várias pesquisas. Fiz pós graduação em Planejamento do Turismo, ao mesmo tempo o Mestrado e dediquei esse tempo à pesquisa, formação desses pacotes e agora que terminei o mestrado, vou focar nessa parte promocional. Tenho empresa aberta, a Carvalho Consultoria de Turismo e vamos começar a explorar.
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