Por Ademario Alves (*)
Os ventos da economia mundial mudam conforme os rumos da política, e poucas decisões têm um impacto tão imediato e amplo quanto a imposição de tarifas comerciais. O presidente Donald Trump, fiel ao seu estilo de governar com punho firme e discurso nacionalista, logo nos primeiros dias após a posse para o segundo mandato, anunciou uma série de novas tarifas. Os alvos iniciais foram Canadá, México e China, porém, com os anúncios relacionados à taxação do aço e alumínio, o Brasil deve ser atingido em cheio. As medidas acendem um debate que vai muito além das planilhas e dos índices macroeconômicos. Estamos diante de uma decisão acertada ou de equívocos que podem custar caro à economia dos Estados Unidos e ao comércio global?
O discurso é forte, mas a realidade é complexa
A retórica protecionista de Trump não é novidade. Desde sua primeira campanha presidencial, ele vendeu ao eleitor americano a ideia de que o país estava sendo explorado por parceiros comerciais, em especial pela China, e que as tarifas seriam o caminho para reequilibrar essa relação. Esse discurso encontra suporte em setores industriais e entre trabalhadores que viram empregos migrarem para mercados de mão de obra mais barata. Dessa vez, porém, além da proteção aos empregos e da redução no déficit comercial, o presidente americano usa as tarifas comerciais para pressionar os vizinhos México e Canadá, no reforço à fiscalização das fronteiras, de modo a inibir a entrada de imigrantes ilegais e de drogas nos Estados Unidos.
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Do ponto de vista da cartilha econômica, as decisões encontram pouca convergência nos manuais de liberalismo, que sempre foram a base do pensamento econômico do Partido Republicano, vide exemplo do ex-presidente Ronald Reagan. A defesa enfática do livre mercado e a consequente redução de barreiras comerciais foram uma das principais armas para a “vitória” americana na Guerra Fria contra a antiga União Soviética. Essa se tornou a visão econômica hegemônica no final do século XX e início do século XXI.
Recentemente, sobretudo após a pandemia, os ventos antiliberais parecem ter se fortalecido em todo o mundo e não apenas nos EUA. Dessa vez, porém, dentro da estratégia do “nearshoring”, que visa produzir dentro do próprio país ou em países amigos e geograficamente próximos, itens estratégicos. No caso dos Estados Unidos, reduzir a dependência das importações de países potencialmente hostis como a China, melhoraria a soberania e segurança americana. Por tabela, poderia enfraquecer o país de Xi Jinping, principal concorrente americano no protagonismo global.
As tarifas ajudam ou atrapalham a indústria americana?
É verdade que, no curto prazo, algumas indústrias podem se beneficiar de uma barreira contra a concorrência externa. Com os produtos importados mais caros, fabricantes locais ganham uma vantagem competitiva. O problema é que essa proteção artificial tem um custo.
Primeiro, porque muitas indústrias americanas dependem de insumos importados. O aumento do custo de matérias-primas como aço e semicondutores pode encarecer a produção de automóveis, eletrônicos e até equipamentos médicos. Da mesma forma, itens básicos como alimentos podem ficar mais caros. Isso gera um efeito em cascata: empresas repassam os custos ao consumidor, os preços sobem e a inflação é pressionada.
Segundo, porque a economia dos EUA não opera isoladamente. A resposta dos parceiros comerciais pode vir na forma de retaliações, como já anunciado pelo Canadá e pela própria China, tornando mais difícil e caro para os exportadores americanos venderem seus produtos lá fora. E quando as exportações caem, setores inteiros perdem competitividade e empregos são ameaçados – justamente o efeito oposto do que a política tarifária pretende alcançar.
O risco de represálias e desconfiança dos EUA
A história recente mostra que o protecionismo raramente vem sem um custo. Ao insistir na estratégia, os EUA correm o risco de reacender disputas em um cenário ainda mais desafiador. A China tem investido pesado na diversificação de seus fornecedores, reduzindo sua dependência dos produtos americanos. A União Europeia, por sua vez, pode endurecer sua postura e buscar alternativas comerciais em outros mercados. Em política internacional, assim como nos negócios privados, previsibilidade, credibilidade e segurança jurídica são fatores de fundamental importância para se manter competitivo no longo prazo.
O uso do poderio econômico americano como ferramenta para pressionar e/ou amedrontar países mais vulneráveis, parece não contribuir para a melhoria da reputação ou para trazer vantagens estruturais no longo prazo aos EUA – pelo contrário.
Apesar da maior busca por soberania e segurança nacional, ainda que de forma mais cuidadosa e estratégica, os países tendem a seguir aumentando o comércio global. Países da Ásia, da América Latina e até do Oriente Médio ampliam seus acordos de livre comércio, garantindo acesso a mercados e fortalecendo suas cadeias produtivas. Recentemente, inclusive, foi anunciado o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, após mais de duas décadas de negociações, o que pode ser positivo para o Brasil.
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O caminho para a competitividade
Ao contrário de países que estão buscando se desenvolver e que poderiam em algum momento adotar estratégias pontuais mais protecionistas para determinados setores, essa não parece ser a principal necessidade da economia americana no momento. O protecionismo pode trazer alívios e ganhos temporários, mas não resolve desafios estruturais. O verdadeiro motor do crescimento sustentável não está na imposição de tarifas, mas na inovação, na produtividade e na modernização da indústria – o que os EUA sempre fizeram muito bem. Isso serve para a Europa, para o Brasil e para qualquer outro local.
Dificilmente um americano médio buscará trabalho numa fábrica de calçados para ganhar US$ 2,00 por hora, como ocorre na Ásia ou na América Latina, por exemplo. Os EUA são vítimas do seu próprio sucesso. Eles fizeram um dever de casa no passado e hoje, apesar dos desafios enfrentados pela classe média, podem optar por trabalhos mais bem remunerados (em junho de 2024, o salário médio nos EUA era de US$ 1.200,50 por semana e US$ 35,00 por hora, segundo o Bureau of Labor Statistics). Com esses melhores salários, os americanos mantêm um alto poder de consumo, importando produtos mais baratos de outros países.
Tudo relacionado à economia é dinâmico e influenciado por diversos fatores, o que torna as previsões incertas. É essencial monitorar indicadores, avaliar impactos e fazer ajustes conforme necessário. Se as medidas serão exitosas ou um “tiro no próprio pé”, o tempo, como sempre, dará a resposta.
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