Carlos Cauê (*)
Digo num poema que a partida de Amaral Cavalcante não causou ainda a justa dor da nossa perda. Imersos na esquizofrenia do isolamento causado pela pandemia, deslocados por uma realidade inesperada, atônitos, começamos a naturalizar a morte. Milhares iam-se para sempre, todos os dias. E a gente numa janela esquisita da vida, máscara na cara, impotentes. Aí ele se foi.
Era sete de julho e, a quatro dias dali, num 11 de julho que ele não viveu, farias anos. Não esperou. Cingido por “malinculias” que foram aos poucos lhe arrancando o costumeiro vigor e inquietude, o poeta ia das invasivas hemodiálises aos já incorporados cuidados com o diabetes e outros males, com a galhardia com que sempre trilhou seus quase setenta e quatro anos. As últimas vezes que fora lá em casa, já recusando as bebidas e os complexos manjares, pilotava uma cadeira de rodas, e ainda achava jeito de divertir-se com sua falta de senso de direção. Tirava onda da sua própria dor.
Olhos marejados, peito arfante, dor espetada pelo trajeto de décadas de convivência e cuidados, foi Samuel quem me trouxe a indesejável notícia. E foi com ele no carro, silêncio impedindo qualquer palavra, que acompanhamos o carro funéreo levá-lo. Num veículo atrás de nós, suas irmãs também cumpriam aquele trajeto de despedida. Cruzamos o Vaza-Barris pela ponte Joel Silveira, mas o que poderia ser um bafejo de homenagem era apenas o caminho fatal para o adeus.
Numa rodovia erma de Itaporanga, ladeado apenas pelo nada, entregamos seu corpo ao crematório solitário que cumpriria as funções finais. Nem um último olhar no caixão, ninguém além da meia dúzia de gente que chegara ali, nem o choro merecido pela perda, nem a rememoração das espetaculares histórias que ele legou à cidade e às pessoas, nem suas crônicas, seus poemas, seus formidáveis maus-humores, sua genialidade sensível e visionária. Nada.
O sorriso solidário e generoso do funcionário do local deu à cena torturante um pequeno alívio. E ele se foi. Nada mais havia a ser. Nem abraços, nem soluços, nem corpo baixando à terra. Apenas, novamente, o silêncio encravando aquele dia no para sempre até hoje.
Vou ao poema:
(…)
É como se não houvesses partido
Fizesses um feriado prolongado
Uns dias sabáticos
Um Hare Krisna de si
Tua partida definitiva
Ainda não mostrou a justa dor
Da nossa perda
Não há dia útil a te retornar
Ao expediente da vida
Praia de onde possas retornar
Campo
Montanha
Nunca mais virás
E a ausência da necessária dor
Põe à prova a minha humanidade
(…)
Adeus, poeta.
__________
(*) Carlos Cauê é jornalista, publicitário, escritor e amigo de longas datas de Amaral Cavalcante.
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