Durante minha jornada ambiental, participei de audiências públicas para implantação de aterros sanitários e vi manifestações populares contra os “Aterros” em algumas delas. As pessoas gritavam ou portavam cartazes com os seguintes dizeres: “FORA LIXÃO”, “LIXÃO NÃO”, “RESPEITO E DIGNIDADE, SIM: LIXÃO AQUI NÃO”, entre outros.
Tal indignação dos populares contra a implantação dos aterros sanitários se dá por duas razões: a primeira por total desconhecimento do que é e de como funciona uma planta industrial de um aterro sanitário; e a segunda, a qual repudio, é a manipulação de pessoas instruídas, que conhecem as características técnicas de um aterro sanitário, mas por objetivos tortuosos, vendem a imagem de que um aterro sanitário é um lixão e que vai trazer diversos problemas de saúde ambiental para a comunidade. Uma lamentável postura.
Por essa razão, eu, na qualidade de professora, especialista em Meio Ambiente e comunicadora ambiental, venho aqui, esclarecer o conceito de aterro sanitário, suas características técnicas e as diferenças entre ele e um lixão a céu aberto.
Penso que seja oportuno comentar que o meu único propósito com isso é levar o conhecimento e informações para um maior número e tipo de pessoas, das mais instruídas e letradas as que por alguma razão do destino não tiveram a oportunidade de estudar, mas que são muito inteligentes e sagazes.
Assim, poderão fazer juízo de valor, estabelecer senso crítico e utilizar de uma maior capacidade de discernimento para lutarem e decidirem sobre o que é melhor para sua cidade, comunidade, bairro, vida! Sem se deixar manipular facilmente por terceiros. O conhecimento muda o mundo!
Pois bem, vamos ao que nos trouxe aqui, esclarecimentos técnicos e balizamento jurídico dos termos “aterro sanitário versus lixão”.
Para começar, vamos esclarecer o conceito de “Lixão”.
Lixão é uma área, geralmente um terreno baldio, onde o “lixo” (resíduo sólido) de uma dada região, cidade, povoado, etc. é despejado como alternativa de disposição final dos resíduos. No lixão todo tipo de resíduo é disposto, desde restos de alimentos a sofás velhos.
No terreno que atende como lixão, não há nenhum estudo ambiental e técnico realizado preliminarmente, o solo desse terreno não foi preparado para receber aqueles resíduos que vão se amontoando ao longo dos anos, apodrecendo (estágios de putrefação) e causando mau cheiro.
O mau-cheiro proveniente do apodrecimento de diversos resíduos, misturados com dejetos de animais e humanos (fezes) ou animais mortos, atraem diversos animais, como roedores e insetos, muitos deles transmissores de doenças, bem como aves que se alimentam de restos mortais, como os urubus.
Durante o apodrecimento dos resíduos no lixão, é gerado um líquido, tipo aquele que aparece nas lixeirinhas de pias depois de dois ou três dias sem trocar a sacolinha. Esse líquido é chamado de chorume.
Chorume é também chamado de líquido percolado (infiltra no solo) ou lixiviado (levado junto com água da chuva), é o líquido poluente, de cor escura e odor forte e fétido, originado de processos biológicos, químicos e físicos da decomposição de resíduos orgânicos.
Tal líquido poluente pode penetrar (percolar) através do solo e contaminar a água que fica embaixo da terra (aquíferos) de onde vem a água que bebemos para matar a sede diariamente. A contaminação dessa água (aquíferos) pode provocar diversos tipos de doenças perigosas e algumas fatais.
A decomposição dos resíduos (apodrecimento) forma bolsões de gás (biogás) e é liberado o metano (CH4), gás inflamável, que pode até explodir se entrar em contato com faíscas (como as bitucas de cigarro).
Outro grave problemas do lixão é a presença de pessoas que catam (catadores) lixo para sobreviverem e ficam expostos a diversos tipos de doenças graves infectocontagiosas e doenças de pele.
Não há nenhum tipo de cuidado, controle e monitoramento em lixões a céu aberto.
Agora vamos esclarecer o conceito de “Aterro sanitário”.
Aterro sanitário é uma obra de engenharia, bem arquitetada e já consolidada (existe há mais de 40 anos), um sistema de tratamento de resíduos sólidos que utiliza o solo para aterrar o lixo.
A área onde um aterro pode ser implantado deve seguir condições estabelecidas em Normas Brasileiras de Regulamentação – NBR.
Algumas das condições estabelecidas são: distância de pelo menos 500 metros de núcleos populacionais, o afastamento de nascentes e corpos hídricos deve seguir o que preconiza a Lei Federal 12.605/2012 (Código Florestal), a área deve estar próxima da zona de coleta (no máximo 30 km para ida e volta); apresentar vias de acesso em boas condições de tráfego para os caminhões, inclusive em épocas de chuvas, com o mínimo de aclives, pontes estreitas e outros inconvenientes; a área também deve estar afastada de aeroportos ou de corredores de aproximação de aeronaves, é importante que a área seja servida por redes de telefones, energia elétrica, água, transportes e outros serviços, para facilitar as operações de aterro e apresentar posicionamento adequado em relação a ventos dominantes. Esses são alguns dos critérios.
Os aterros sanitários são bem menos nocivos ao meio ambiente que um lixão a céu aberto, pois são construídos para evitar a contaminação do solo, da água e do ar.
Lembram-se do chorume e dos gases tóxicos gerados no lixão? Então, no aterro sanitário eles são retidos e encaminhados ao tratamento e não entram em contato com a natureza. Veja como isso acontece: a base do aterro é coberta com uma camada de material impermeável (não infiltra no solo), o que evita que o chorume produzido infiltre no solo e chegue aos lençóis freáticos.
Essa manta é recolocada a cada 5 metros de lixo acumulados verticalmente. Além disso, o local deve contar com um sistema de captação de biogás — metano, gás carbônico e vapor d’água —que é queimado ou que pode ser utilizado para produção de energia.
Então resta, claro, que uma obra de engenharia de um aterro sanitário preveja a instalação de elementos para captação, armazenamento e tratamento do chorume e do biogás, além de sistemas de impermeabilização superior e inferior. Esses elementos são fundamentais para que a obra seja considerada segura e ambientalmente correta, e por isso precisa ser bem executada e monitorada.
No aterro sanitário, a cobertura diária deve ser realizada ao final de cada jornada de trabalho, com a função de eliminar a proliferação de animais e vetores de doenças, de diminuir a concentração do lixo que é levado pela água da chuva (lixiviação), reduzir a exalação de odores e impedir a saída do biogás.
A cobertura intermediária é necessária naqueles locais onde a superfície de disposição ficará inativa por mais tempo, aguardando, por exemplo, a conclusão de um determinado patamar.
Por sua vez, a cobertura final, tem como objetivo evitar a infiltração de águas pluviais e o vazamento dos gases gerados na degradação da matéria orgânica para a atmosfera.
O aterro sanitário é uma das técnicas mais eficientes e seguras de destinação de rejeitos. Entenda-se como rejeito, aquele resíduo para o qual ainda não existe nenhuma possibilidade de reaproveitamento ou reciclagem. Tanto é verídica tal afirmação, que a Lei Federal 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS) afirma como sendo o aterro sanitário uma técnica de disposição final de resíduos ambientalmente adequada:
Art. 3, inciso VIII – disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos. (PNRS, 2010).
Isso quer dizer que a PNRS determina ações como a eliminação dos lixões e sua substituição por aterros sanitários. Os lixões a céu aberto, inclusive, têm prazo contado para ser encerrado, conforme estabelece o “Novo Marco regulatório de Saneamento Básico”, Lei Federal 14.026/2020:
“Art. 54. A disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos deverá ser implantada até 31 de dezembro de 2020, exceto para os Municípios que até essa data tenham elaborado plano intermunicipal de resíduos sólidos ou plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos e que disponham de mecanismos de cobrança que garantam sua sustentabilidade econômico-financeira, nos termos do art. 29 da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para os quais ficam definidos os seguintes prazos:
I – até 2 de agosto de 2021, para capitais de Estados e Municípios integrantes de Região Metropolitana (RM) ou de Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) de capitais;
II – até 2 de agosto de 2022, para Municípios com população superior a 100.000 (cem mil) habitantes no Censo 2010, bem como para Municípios cuja mancha urbana da sede municipal esteja situada a menos de 20 (vinte) quilômetros da fronteira com países limítrofes;
III – até 2 de agosto de 2023, para Municípios com população entre 50.000 (cinquenta mi100.000 (cem mil) habitantes no Censo 2010; e
IV – até 2 de agosto de 2024, para Municípios com população inferior a 50.000 (cinquenta mil) habitantes no Censo 2010.
Portanto, tendo em vista que foram apresentadas as diferenças conceituais e operacionais gritantes, entre o que é um lixão e o aterro sanitário, podemos concluir que o aterro sanitário por ser uma obra de engenharia consolidada e controlável, é de fato a tecnologia preferencial e executável para atender a demanda urgente e emergencial para o encerramento dos lixões.
E para fecharmos nossa conversa com chave de ouro, deixo meu cartaz de manifesto com os seguintes dizeres:
(*) Profª Dra. Gabriela Almeida, especialista em Meio Ambiente, comentarista técnica da Rádio e TV Ambiental.
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