Em 2016 na terceira edição em português de “Sociedade com Custo Marginal ZERO” pag. 134, Jeremy Rifkin disse:
“Na era colaborativa, os estudantes passarão a pensar como experiência compartilhada entre uma comunidade de pares. Os estudantes aprendem juntos como grupo em uma comunidade de conhecimento compartilhado. O professor atua como guia, propondo desafios e permitindo que os estudantes trabalhem em pequenos grupos. O objetivo é estimular a criatividade colaborativa, semelhante ao que os jovens vivenciam quando envolvidos em muitos espaços sociais da internet…Enquanto na sala de aula convencional o conhecimento é tratado como fatos objetivos isolados, na sala de aula colaborativa, é visto como significados coletivos vinculados a nossas experiências”…
Apesar do decreto 5.622 existir desde 2005, baseado no artigo 80 da lei 9394 de 1996, somente agora o tema aflorou na excepcionalidade. Em 2020, a gestão da escola pública que patinava na fraqueza (ideológica, administrativa e corporativa) evitando tal aprofundamento, viu-se forçada enfrentá-lo face os efeitos da covid-19 com aulas não presenciais.
Outro ensino
Escola pública, do ensino básico até o ensino superior, excepcionalmente foi compelida até fins de 2020, experienciar aulas não presenciais, desde a capital ao mais remoto povoado do Estado de Sergipe. Não é proposta do escrito analisar se é ou não, Educação a Distância. Acompanho o pensamento de Jeremy Rifkin já mencionado no Departamento de Educação da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Não se trata somente de ensino fora da escola, mas outro ensino noutra economia. Nele os atores terão que desempenhar outros papéis. Desde 2011 gestores e profissionais de educação relutaram ou não quiseram ver. Profissionais de educação, pais e alunos reclamam, mas fato é que estudiosos já vinham produzindo grandes reflexões sobre a gestão escolar. Apenas um começo do que vem por aí no planeta.
Professores relutam aceitar o trabalho pelo saudosismo, corporativismo, ausência de formação e de condições materiais. São inúmeros os fatores. Ouvindo o professor José Mário, do Departamento de Educação da UFS, percebe-se que ausência de formação de professores e alunos nos aspectos pedagógicos, sociais e epistemológicos são grandes dificuldades. A população de baixa renda sem apoio material poderá sofrer exclusão tornando-se desafio para o poder público.
Diferentemente, no Estado de Sergipe, a portaria ministerial determina que planos de trabalhos específicos serão aprovados, no âmbito institucional, pelos colegiados de cursos e apensados ao projeto pedagógico do curso. Quanto ao prazo “as instituições deverão comunicar ao Ministério da Educação – MEC a opção pela substituição de atividades letivas, mediante ofício, em até quinze dias após o início destas”. Observe-se que fixa “após o início” enquanto o Estado de Sergipe o prazo é 10 (de) dias para apresentar antes do início.
Em nível estadual a portaria 2235/20, de 27 de maio, desconsidera a autonomia da proposta pedagógica prevista nos artigos 12 e 13 da atual LDB do ensino e dá prazo de 15 dias para as escolas produzirem plano de “Atividades não Presenciais” (artigo 6°) no limite de 25% da carga horária total (artigo 4°), manda o coordenador pedagógico validar “planejamento semanal dos professores” (§1° do artigo 6°). Cria um “acompanhamento processual do professor”, avaliação diagnóstica para verificação de aprendizagem”, “oportunidades equivalentes” sem defini-los em detalhamento dos atos (artigo 7°), ferindo os artigos da lei 9394/96 como se uma portaria estadual pudesse alterar uma lei federal. Por fim, obriga a escola criar “proposta alternativa de calendário escolar em 10 dias (artigo 8°). Prazo exíguo sobre o imprevisível. Exagerou ao empoderar o Secretário de Educação Estadual ao determinar (artigo 10) que os “casos omissos”, e serão muitos, face às especificidades de cada escola, “serão resolvidos” pelo Secretário de Educação.
Dificuldades a toda prova para alunos e profissionais em educação. Fatos inusitados ante ausência de condições materiais, a exemplo de alunos e familiares com vírus, pais analfabetos, alunos dos povoados sem acesso à internet, possibilidade de contágio pelo uso do material físico, ficha de matrícula com contato inexistente ou de terceiros, agressões e vídeos pornográficos enviados por alunos ou respectivos responsáveis, resistência de profissionais do magistério acontecem, apesar de algumas ilhas de sucesso..
Também no ensino superior público brasileiro a portaria nº 544, de 16 de junho de 2020 disciplinou a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais, enquanto durar a situação de pandemia da covid-19, até 31 de dezembro de 2020 e sentencia: será de responsabilidade das instituições a definição dos componentes curriculares que serão substituídos, a disponibilização de recursos aos alunos que permitam o acompanhamento das atividades letivas ofertadas, bem como a realização de avaliações”. Durante o período da autorização, de onde virão tais recursos? Como ficam as despesas com as ferramentas tecnológicas necessárias? A gestão pública não cria condições e lava as mãos ante a pressão popular pela oferta do serviço público.
A incondicionalidade do momento precipitou o desafio: patinar, resistir, enfrentar ou avançar? Em que condições? No momento em que no âmbito federal tem governantes justificando religião em detrimento de ciência na escola. A história fará a diferença. Fato é que, enquanto na UFS seus departamentos ainda discutem a aplicação da medida, escolas estaduais estão praticando aulas não presenciais e já se fala em sair do limite de 25% (art. 4°) para 50% da carga horária total.
Que me perdoem conservadores ou coorporativistas, por ideologias e credos de todas vertentes em 2020. Durante e pós covid-19, mas como dissera Sócrates há 2400 anos “o segredo da mudança é concentrar toda sua energia não na luta contra o antigo, mas na construção do novo”. Lamenta-se que, pelo contrário, existe fracionamento de esforços. A escola pública precisa de um projeto adequado aos novos tempos com velocidade histórica turbinada com a presença da pandemia. Não basta inquietar-se com a conjuntura, é preciso ressignificar as relações escolares considerando as mudanças socioeconômicas.
(*) Valtênio Paes de Oliveira é professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada -Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.
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