Domingo em Desbaste

Caminho de Santiago e Quaresma: Reflexões que ecoam após um ano

Compartilhe:

 

Por Hernan Centurion (*)

 

Quaresma, período que sempre me traz um aperto no peito, não daqueles amargos, que angustiam, fazem sofrer ou emanam melancolia. É um aperto tal qual um pano torcido que remove e deixa escorrer pelo ralo todo o lodo, ao limpar a sujeira impregnada no chão do meu “templo interior”, tão encardido de inúmeros vícios os quais, sempre que inadvertidamente permitimos, transitam sobre o piso originalmente alvo que o Grande Arquiteto do Universo assentara com perfeição, na medida arquitetônica correta, outrora descrita por Fibonacci. Este tempo quaresmal que ora vivenciamos, repleto de simbolismo, é sobremaneira o principal momento do Cristianismo, no qual os mistérios pascais, a Paixão de Cristo e a Eucaristia a nós mais uma vez se revelam e nos quais a Igreja alicerçara-se há milênios, trazendo esperança àqueles que com fé nela creem.

Destarte, Jesus Cristo conclama a volvermo-nos ao âmago do nosso íntimo, no silêncio do vazio do nosso ser, para fazermos, pois, nosso próprio julgamento, posto que somente nós mesmos somos capazes de reconhecer as impurezas mais profundas e, então, talharmos as rochas com a força do maço aplicada sobre a lâmina precisa do cinzel, desbastarmos todas as arestas dos males humanos e lapidarmos, como exímios artífices, nossa joia bruta interior, transformando-a, com o mais preciso detalhe, em uma obra da mais bela arte renascentista. Após finda a jornada deste árduo, porém revigorante trabalho, esperamo-nos descansar, contentes, satisfeitos e cientes de que fora cumprida a missão e deixado um grande legado para a humanidade. É chegada, portanto, a hora de desfrutarmos o sono dos justos.

Não obstante, parece-me que neste ano há algo novo, intrigante, que me aguça e faz da Quaresma algo peculiar, encontrando-me agora um pouco mais atento e cônscio de onde estou e para onde pretendo ir, já que, há aproximadamente 1 ano, lá estava eu na Galícia, um tanto perdido, trilhando o exotérico Caminho de Santiago de Compostela, que muito me ajudou a orientar minha jornada espiritual, repleta de experiências únicas, intensas e reveladoras. Em terras galegas, pude entender parte do significado da vida terrena e do propósito de aqui estar neste plano, bem como perceber os obstáculos que eu mesmo, inconscientemente, houvera colocado à minha frente, ao galgar pela longa estrada da vida. Meu Caminho foi indubitavelmente iluminado pela chama do Espírito Divino, apresentando-me, de súbito, a tradução de pequenos trechos da Palavra Sagrada do Apóstolo João:

“é a Luz que alumia todo homem que vem a este mundo”; “e conhecereis a Verdade e Ela vos libertará”.

Luz e Verdade são o entendimento e a plena consciência de que Deus é “o caminho, a verdade e a vida”, o farol a nos guiar, ou seja, existe sem se ver, ouvir ou tocar, tão somente se sente, o qual extermina todo mal de nossa essência humana e nos proporciona a mais pura, real e indescritível felicidade. Tomemos cuidado em achar, ingenuamente, que tudo isso seja comprado, conquistado à força ou muito menos furtado doutrem… engana-se! Todo cuidado é pouco em se contentar com míseros instantes efêmeros de alegria (pseudo-felicidade), misturada a tantas sujeiras postas embaixo do tapete.

Essa Luz Verdadeira, à qual na minha pequenez ouso referir-me repleto de contentamento, está ao alcance de todos, sem exceção, do mais santo ao mais pecador. Digo isso pois encontro-me a anos-luz de distância da santidade e, ainda assim, permiti conectar-me a Ela, senti-La e reconhecê-La durante os vários dias de profunda reflexão que o Caminho de Compostela me proporcionara. Logo, a ficha então caíra! Descobrira quem é o meu Deus. Ele é o Deus do perdão, muito mais que amor… é misericórdia! Revolucionou a lei dos Patriarcas.

Hernan Centurion em uma das paradas de São Tiago de Compostela Fotos: Arquivo pessoal

Nunca entendera eu que o perdão fosse um sentimento avassaladoramente poderoso, que só aqueles armados com a forca do Espírito Santo o possuem. Aproxima-nos do Ágape pelo exemplo de Cristo traduzido nas Sagradas Escrituras, pois assim Ele viera ao mundo, por todos os pecadores, e fora, sem sombra de dúvidas, a “pedra angular”, aquele que jamais julgou, agrediu, revidou ou muito menos desprezou quem quer que seja, sobretudo seus algozes. Pude perceber, em Santiago de Compostela, a presença desse Espírito sondando-me e queimando todo orgulho e rancor em mim presentes. Prostrava-me em lágrimas de ternura, num êxtase sobrenatural que apascentava, saciava, curava, transcendia quaisquer dos prazeres mundanos que um dia outrora conheci. Além disso tudo, houve claridade ante a escuridão da minha vida, demonstrando, consequentemente, aquela Verdade descrita há pouco, recitada pelo Salmista, propagada pelos Apóstolos e vivenciada por todos aqueles que se permitem com Ele comungar, num banquete de plena vitória sobre o mal, após transpor longos prados e campinas verdejantes, beber de fontes cristalinas do mais puro perdão, em contacto íntimo espiritual com o Pai Celestial.

Entretanto vigiemo-nos! Esta busca não se acaba, requer muito mais de nós, como assim dissera Tiago Maior, “a fé sem obras é morta”. Faz-se premente praticar os ensinamentos aprendidos e revelar, aos quatro cantos do Universo, que Ele existe e que a felicidade está a menos de um palmo das nossas faces, basta apenas reconhecê-la, ao fortalecermos nossas fragilidades, ao nos tornarmos cientes da necessidade de a “ovelha desgarrada” ser reconduzida em segurança ao rebanho pelo Bom Pastor, o que acolhe, protege, alimenta e ama. Só assim chegaremos a salvo à Terra Prometida, onde não há sofrimento, visto que não há corpo, não há matéria, não há pecado, apenas energia vital acesa, intensa, que não se consome, é infinita… Clamar perdão a quem ofendemos e perdoar os que nos maltratam é um ato contínuo que precisamos exercitar diuturnamente. Quando assim comecei a agir, percebi claramente uma virada de chave na minha existência, que empodera e impulsiona-me à prosperidade, pois creio que ser próspero não diz respeito a dinheiro, absolutamente! É atingir a felicidade em plenitude, isto é, a riqueza do corpo, mente e espírito, que traduzo, neste instante, na minha família, amigos, fé e profissão.

Ainda estou distante dos meus objetivos, haja vista que “a Santiago sempre se vai, mas nunca se chega”! Todavia continuarei seguindo em frente, “combatendo o bom combate” entre a carne e o espírito, “guardando a fé”, caindo e Nele me apoiando, rendendo-me a este sentimento sublime, à procura, sem cessar, da Verdade, ultimamente distorcida pelas mídias sociais. Concluo de semblante baixo e sorriso leve no rosto. Vejo nitidamente com os olhos d’alma que, logo atrás da montanha, há coisas extraordinariamente incríveis a nos esperar. “Moa o seu orgulho”, dobre os joelhos, conecte-se com o Divino e permita-se, também, seguir nesta jornada transformadora.

Entre em sintonia com o Divino e aceite o convite para trilhar essa jornada de renovação

 

Compartilhe:
Hernan Centurion

(*) Médico cirurgião e coloproctologista. Mestre maçom da Loja Maçônica Clodomir Silva 1477, exercendo atualmente o cargo de venerável.

Compartilhar
Publicado por
Hernan Centurion

Posts Recentes

Sergipe mantém foco em atrair empresas apesar de cenário incerto

  O diretor de atração de investimentos da Agência Sergipe de Desenvolvimento (Desenvolve-Se), Ademário Alves,…

10 horas atrás

Energisa orienta sobre os principais cuidados durante as chuvas

  Com previsão de chuvas para o final de semana, a Energisa reforça os principais…

1 dia atrás

Tarifas de Trump: quando a política ignora a economia

  Por  Jorge Santana (*)   á não é novidade para ninguém que o retorno…

1 dia atrás

Sergipe pode ganhar espaço com guerra tarifária dos EUA, aponta FIES

  O economista do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) da Federação das Indústrias de Sergipe (FIES),…

1 dia atrás

Prefeita de Aracaju destaca avanços e economia em 100 dias

A prefeita de Aracaju, Emília Corrêa, apresentou nesta sexta-feira (11) o balanço dos 100 primeiros…

2 dias atrás

Madre Cabrini – uma santa por ousar amar

  Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos (*)   ou um entusiasta e também estudioso da…

2 dias atrás