Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos (*)
Já se vão mais de trinta anos de sala de aula. Destes, dezesseis como professor do Curso de Licenciatura do Departamento de História da Universidade Federal de Sergipe. Nos últimos dez anos, tenho me dedicado, mais de perto, à formação de professores e de professoras no campo do Ensino de História, com disciplinas voltadas para a prática, a exemplo de Estágio Supervisionado, e também, Fundamentos de Estágio. Nesta, discutimos, inicialmente, os impactos da Base Nacional Curricular Comum (BNCC, 2017) e do “novo” Novo Ensino Médio na Educação Básica.
A partir de simulações de aula, na disciplina Fundamentos de Estágio, com instruções práticas (elaboração de Plano de Aula, por exemplo), tenho procurado provocar, positivamente, meus alunos e alunas a ousarem ousar. Isso mesmo. Ousadia, no melhor sentido da palavra, pois há que ser muito mais do que isso em meio ao novo perfil de estudante que surgi nas escolas brasileiras, a partir de mudanças substanciais, seja na forma ser educado em casa (quando o são, de fato), seja frente a novas legislações e entendimentos psicopedagógicos que mudaram a forma de definir a infância e a adolescência, o que trouxe inúmeros benefícios, mas, ao mesmo tempo, complicações.
Diante desses desafios da arte de ensinar de nosso tempo, vez ou outra, meus alunos me surpreendem e, ao mesmo tempo, me renovam e me reanimam nesta missão de formar professores. Destaco, aqui, em especial, a simulação de Regina da Silva Batista, da cidade de Poço Redondo, no último dia 25 de março, que levou para a sala de aula (UFS), um jovem capoeirista (estudante de Engenharia Florestal), Flansuá de Jesus Santos, mais conhecido como Elfo. Ele é do grupo Pura Ginga (também da cidade e Propriá), cujo mestre é Claudinho/Scorpions (Monte Alegre).
Inicialmente, Regina fez um apanhado histórico da Capoeira, o qual, registro aqui em síntese. Conceitualmente, trata-se de uma manifestação cultural afro-brasileira que combina luta, dança, música e acrobacias. Por anos, foi criminalizada e havia, até mesmo, legislação proibindo a sua prática (Decreto número 847, de 11 de outubro de 1890 – Código Penal Brasileiro, que em seu Parágrafo Único, preconizava – “É considerado circunstância agravante pertencer à capoeira, a alguma banda ou malta. Aos chefes ou cabeças, se imporá a pena em dobro”).
Na Era Vargas, graças às ações do mestre soteropolitano, Manoel dos Reis Machado (1900-1974), mais conhecido como Bimba, a Capoeira passou por um processo de descriminalização. Após demonstrações públicas da arte ao Presidente Getúlio Vargas, a partir de 1937, passou a ter bênção do Estado, sendo, definitivamente, autorizada, por meio de novo Código Penal de 1940, ainda sob a tutela varguista. A Capoeira é considerada Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), desde 2008. Em 2014, a Roda de Capoeira foi incluída na lista do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO.
Na segunda parte de sua simulação de aula, a aluna Regina da Silva Batista intercalou sua fala (sobre outros mestres capoeiristas brasileiros, estilos, instrumentos e cantos), com a apresentação Françoá de Jesus Santos, cantando ao som do berimbau (também conhecido como hungo), por ele executado. O berimbau é “um instrumento de corda com origem em Angola e tradicional da Bahia”. Para além desta performance musical e rítmica, ele nos brindou, a mim e aos demais alunos presentes, com acrobacias de tirar o fôlego, algumas delas, registradas em fotografia no presente texto.
A seguir, uma composição (Foi a capoeira) do jovem capoeirista Françoá:
Foi, foi a capoeira e é, é ela que vai me ensinar a vencer todas barreiras (coro)
A capoeira me mostrou o meu lugar quando aprender e ensinar
sendo assim eu vou com ela…
Vale salientar que, iniciativas como as da aluna Regina, ainda em processo de formação e prestes a enfrentar os bancos escolares, mais tardar a partir de 2026, vão ao encontro do que estabelece a BNCC, no que diz respeito ao protagonismo do estudante e também no que se refere ao Ensino de História. Na primeira situação: “estimula o estudante a compreender acontecimentos históricos e processos; propõe que o estudante aplique o conhecimento na vida real”. E à segunda: “considera o conhecimento histórico uma forma de pensar; propõe que o estudante reconheça o “eu” e o “outro“.