Por Luiz Thadeu Nunes (*)
A história que segue é de um conhecido dos bancos escolares dos anos 70, que encontrei no happy-hour, na última sexta-feira, mas que poderia ser a história de muitos homens por aí, que certamente você caro leitor, amiga leitora, conhece. Há anos não o via. Passei alguns minutos rebobinando a memória procurando saber de onde o conhecia. Finalmente lembrei. Sentados próximos, entabulamos conversa.
Após anos casado e, com uma fidelidade canina, que faria até padres se envergonharem, ele se viu abandonado, jogado na sarjeta. Não havia mais tempo nem para aquele “sexozinho” casual; afinal uma década de fidelidade o cancelou do clube ativo da luxúria. E, assim, ele foi promovido a diretor executivo do clube da solidão.
Só lhe restou a amarga realidade de um mundo que seguiu em frente enquanto ele ficou para trás. Ah! Os homens! Não evoluíram como as mulheres. E… se perderam; estão a tatear como lagartixa em areia quente.
O tempo, indomável e implacável, não lhe deu trégua. Chutado para fora como um empregado sem aviso prévio, sem justa causa, nosso protagonista, sem ter para onde ir numa noite de sexta, levemente embriagado, resolveu encarar o mercado novamente.
É como voltar ao mercado de trabalho depois de anos à deriva. Tudo mudou. Um mundo novo, que ele não conhecia, de repente lhe fora apresentado.
Baladas? Nunca foi a praia dele. Detesta multidões. Pensa que é um herói trágico numa peça grega. Seu Nirvana é o sofá de casa. Refestelado, despreocupou-se, viu o mundo passar.
Sair com amigos? Todos casados, pais de família ou beberrões solitários que só sabem falar de seus fracassos, e para isso já bastam os dele. “Conversar com eles era como assistir a um documentário deprimente sobre os habitantes do Saara”, disse-me.
Discreto, para não se expor, resolveu publicar no perfil das redes sociais fotos antigas e caseiras de Tony Ramos, seu herói televisivo. Afinal, no mundo dominado por séries descartáveis de TV, qual a chance de alguém conhecer as novelas épicas? Seu público seriam as mulheres de sua idade. Qual mulher mais velha não daria match no Tony Ramos? E lá foi nosso herói, testando as redes com um ícone da TV como guia.
Pouco sóbrio, e ainda se familiarizando com as novas tecnologias, preso à tela do celular, aprendendo como funciona o supermercado de carne humana.
Entre um chopp e outro, olhos fixos na tela, fotos aparecem, mulheres belas, repletas de filtros, e ele frenético a deslizar o dedo, descartando à esquerda quem não lhe interessa, e para a direita quem lhe desperta algum desejo.
Observo-o, ele está como a folhear uma Playboy ou Status, revistas masculinas que marcaram nossa época; só que agora, admirando carne feminina no smartphone.
É um jogo banal, mas é o que ele tem de diversão numa sexta às 22h.
Nesse rolar de dedos, se perde a chance de encontrar algo real, algo além da superfície, da embalagem, mas é o jogo do presente. Certamente é o que precisa neste momento.
A Internet é um alien que mudou o mundo e consumiu nossas almas. É o entretenimento digital num nível que faria Kafka revirar no túmulo, ou talvez dar risadas. Estamos no mundo líquido, diria Zygmunt Bauman. Tudo é fluidez.
Mas se esse é o jogo, ele está aprendendo a jogar vorazmente. Que a sorte o surpreenda. Alguma alma solitária, em algum lugar, deve estar olhando para os olhos de Tony Ramos e pensando: “Humm, que coroa atraente”.
E quem sabe, nesse mar de solidão, de polarização até no flerte, ele encontre uma bela alma ou uma bela bunda, não necessariamente nesta ordem. Afinal, o amor nos tempos da tecnologia é assim: uma combinação de superficialidade, esperança, e um toque de desespero, com uma pitada de humor trágico.
Na era das conquistas digitais, onde deslizar para a direita ou esquerda decide o destino de um potencial amor, somos todos prisioneiros do instantâneo. Alguns procuram conexões profundas em pessoas rasas.
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