O poeta gaúcho Mário Quintana, que nos deixou em maio de 1994, aos 87 anos, pediu que escrevessem o seguinte epitáfio na sua tumba: “Eu não estou aqui”. Essa história foi lembrada pelo professor Mário Sérgio Cortella durante uma palestra e dá margem a várias reflexões. Escolho uma que mais se identifica comigo: a de que nem ele, Mário, e nem os que foram para o outro plano terminaram toda uma história ali, reclusos num jazigo. Naquele lugar sucumbiu um corpo físico. A alma segue aprendendo em algum lugar, afinal, “há muitas moradas na casa do meu Pai”.
Esse preâmbulo é para, neste Dia dos Pais, reverenciar a memória do meu pai, Raimundo Ferreira dos Santos, que durante sua passagem por esta orbe, pegou emprestada a música de Zeca Pagodinho, “Deixa a vida me levar”, para transformá-la em filosofia de vida. Ele, repetidamente, em algum momento de tensão, problemas e preocupações, dizia: “deixa a vida me levar”.
E como ele tinha razão quando dava esse conselho… Afinal, tudo na vida passa: a maior alegria e a tristeza mais profunda são passageiras, e ao deixarmos a vida nos levar aprendemos bastante. Na medida do possível devemos levar a vida com leveza, com olhar terno e um sorriso cativante. Encarar os problemas como oportunidades de aprendizado para sermos cada dia melhores.
Raimundo procurou ser um bom aluno nessa escola chamada Terra, onde o nosso mentor maior – Deus, o Grande Arquiteto do Universo – nos dá liberdade para crescermos. Essa liberdade é o livre arbítrio. É uma liberdade tão grande que alguns metem os pés pelas mãos e se atrapalham de vez quando. Outros se atrapalham o tempo todo. Mas como a bondade do Pai é infinita, a todos é dada a oportunidade de voltar aqui quantas vezes forem necessárias para aprender o que significa o livre arbítrio. E ao aprender, todos crescem. Essa é a regra. Por mais que demore milênios, um dia todos nós seremos perfeitos.
Acredito que Raimundo esteja em uma das “moradas” se aperfeiçoando, crescendo, tornando-se melhor, porque, insisto, esse é o caminho de todos. Quando ele desencarnou, lembro-me de dois momentos marcantes. Um vivido por mim e outro pela amiga Márcia Pitão, que tinha [e tem] adoração por Raimundo.
No início de uma manhã de novembro de 2015, um domingo, ao sair de Aracaju, onde resido, com destino a Feira de Santana para o sepultamento de meu pai, tive a forte impressão de ele estar comigo, minha mulher, Rose, e meu filho João Pedro, dentro do carro viajando conosco, nos fazendo companhia. Acredito que ele estava ali.
Passados alguns meses, eu estava no Dispensário de Santana, participando de uma missa festiva com a amiga Márcia Pitão e no final ela me disse: “Galinho estava aqui na missa”. Galo ou Galinho era o apelido de meu pai.
Portanto, o que está num jazigo perpétuo no Cemitério Piedade são os restos mortais de Raimundo. Ele, de fato, não está ali no túmulo como bem escreveu Mário Quintana. E para deixar uma reflexão, recordo-me da mensagem ditada pelo espírito Leocádio José Correia ao médium Maury Rodrigues da Cruz, da Sociedade Brasileira de Estudos Espíritas: “a vida não começa no berço e nem termina no túmulo”.
Feliz Dia dos Pais, Raimundo. Feliz dia aos pais encarnados e desencarnados.
(*) Antônio Carlos Garcia é diretor de jornalismo do Só Sergipe