O fato de ter sido flamenguista e depois convertido há décadas, junto com toda a prole, aos encantos são paulinos, não me impede de escrever, em coautoria, sobre o sucesso rubro-negro no dia 23.11.19, mesmo porque tratava-se não somente do sucesso do clube, mas do futebol brasileiro nas Américas. Muito já foi dito sobre o evento esportivo, porém, vamos nos deter inicialmente sobre as reações inusitadas durante e após o final do jogo.
Crianças chorando; adultos extravasando as mais variadas reações; comentarista esportivo de rádio carioca, de 83 anos, prometendo dormir sem roupa, coberto apenas com a bandeira do clube, desmaios; vascaínos vestindo camisa do Flamengo camuflando a camisa cruzmaltina por baixo; locutor argentino pedindo para que o gol do Flamengo não se consumasse; técnico português homenageado por compatriotas pelo feito no Brasil, diferente dos feitos brasileiros no exterior; político que nada fez no mandato, pegando carona no evento esportivo.
Nas manifestações, aconteceram gestos patéticos como do governador do Rio de Janeiro que foi ao gramado do estádio lotado e ajoelhou-se ao cumprimentar Gabriel. Por sorte o atleta desconsiderou a subserviência que não contaminou as emoções rubro-negras.
Belos relatos do azulino-flamenguista Nilson Cabeleireiro sobre sua mãe, dona Zita, que aos 88 saiu de Aracaju para assistir a Zico e Amigos no Maracanã, e agora, aos 91 anos, teve persistência emocional ao pedir aos 40 minutos do segundo tempo: “não vá agora” como se seu sexto sentido avisasse. “Ainda há esperança” e após os dois gols memoráveis retrucou em meio à alegria da comemoração “bem que eu disse”, fazendo Nilson render-se à sabedoria materna. No campo da imprevisibilidade esportiva, João Paulista: “é isto que empolga no futebol”.
Saudosistas ou mercenários, milionários em busca de dinheiro ou amadores em busca de sentimentos esportivos, não importa. Importa mesmo a prática do futebol de resultados imprevisíveis, ensejando a persistência até o último segundo. Foi isto que o Flamengo fez, foi isto que dona Zita quis dizer. Persista! Desistir jamais. Teve de tudo. A alegria de milhões de torcedores é justa e inquestionável, afinal, a espera foi longa, mas compensadora.
Num momento brasileiro onde ódio e intolerância se apresentam, o esporte ainda pode ser um dos antídotos ante a universalidade da linguagem esportiva, desde que gestores públicos se convençam por sua priorização em detrimento de gastos com cantores sem inspiração cultural, recebendo milhares de reais por uma hora de show. Quais os valores de uma medalha, quadra ou campo esportivo?
Necessário reconhecer o movimento diferenciado da torcida por toda semana culminando com audiências que superaram a última Copa do Mundo. Foi um jogo para além dos flamenguistas porque satisfez aos amantes do futebol pela disputa leal e pela vitória da persistência. Afinal, sair da quase derrota para uma vitória arrebatadora nos minutos finais tornou um jogo épico e heroico, justamente quando “o River estava acariciando a vitória” na expressão de um jornal argentino.
A manifestação das emoções pelo sucesso foi êxtase, como o estado emocional em que o indivíduo fica fora de si ou em transe, caracterizado pela intensificação extrema do prazer e da alegria? E assim uma reação a um estímulo emocional bastante intenso? Foi euforia como o aparecimento da alegria, otimismo e ânimo momentâneos? Foi felicidade como disseram os atletas, imprensa esportiva, dirigentes e torcedores? Será que a felicidade é momentânea ou possui uma relativa constância na vivência humana?
Euforia, êxtase, paixão, delírio, alegria ou felicidade? Não importa! Outro vencedor foi o esporte brasileiro, tão carente de conquistas no momento atual. Euforia, paixão, êxtase ou felicidade? Dirão os flamenguistas: — Não importa. Importa é que grandes emoções nós sentimos, como já dissera o poeta.
Parabéns Flamengo, parabéns flamenguistas, bem como aos apaixonados tio João, dona Zita e minha esposa Amanda, coautora neste texto!
(*) Valtênio Paes de Oliveira é professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada -Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.
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