Quem se diz contra a “esquerda” é realmente de direita?
Por Valtênio Paes (*)
Revisitando os escritos neste portal — no texto Da direita e esquerda ao individualismo e intolerância no Brasil — em dezembro de 2018, apresentamos uma revisão reiterativa com retoques de reexame no tema esquerda X direita e individualismo.
Por volta da segunda metade do século XVIII os ideais do Iluminismo, movimento cultural, filosófico, político e social, que colocava a razão como a melhor forma para conquistar emancipação, liberdade e autonomia, fervilhava na Europa com epicentro na França, opondo-se ao absolutismo presente em todo continente e além-fronteiras. Numas das fases da Revolução Francesa, a convocação da Assembleia Nacional Constituinte se organizou em grupos: à esquerda, os radicais eram liderados por Robespierre e considerados populistas, chamados de Jacobinos, integrantes da baixa e média burguesia, defendiam os interesses do povo. No centro, os Girondinos que eram integrantes da alta burguesia, mais moderados. À direita, os remanescentes da aristocracia, conhecidos por aristocratas, defendiam a volta do poder absoluto do rei, portanto conservadores.
Já no século XIX, Karl Max e Friedrich Engels, pensadores alemães, buscam explicar a necessidade de transformação social através do econômico e político se opondo ao capitalismo. Doravante, quem era adepto do marxismo, e portanto, do socialismo, era tido como esquerda e quem defendia o capitalismo era tido como de direita. Cada corrente com suas subdivisões (radical e moderado). União Soviética depois Rússia, China e Cuba foram os principais adeptos da tentativa de implantar em seus governos o pensamento destes filósofos.
No século XX, esses países, à força, tentaram fortalecer o pensamento de esquerda. As ausências de transparência política, de liberdade de expressão e o atraso tecnológico, dentre outros fatores, conduziram todos ao retorno para o capitalismo, ressalvando a tentativa lenta de Cuba já no século XXI. Após 2002 no Brasil, o governo Lula manteve o capitalismo intacto, com leves momentos de opção pelos miseráveis, profundas alianças com políticos de vários matizes e condutas conservadoras. Tentou conciliar no poder, esquerda e direita.
No governo da presidente Dilma aflora a intolerância: ricos contra pobres, sul contra nordeste, pessoas que se diziam amigas passam a se agredirem no esconderijo das redes sociais. Tudo a pretexto de direita e esquerda. A intolerância grassa no país como nunca nos últimos 60 anos. Parece, para algumas pessoas, ser prazeroso agredir com palavras, gestos, imagens e até fisicamente as outras. A Prática do ódio passou ser rotina.
Diante deste cenário, como fica a disputa entre esquerda e direita? Quem se diz contra a “esquerda” é realmente de direita? Defende o individualismo exacerbado? O controle dos pobres pelos ricos? Quem se diz contra a “direita” é realmente de esquerda? Defende tomar tudo dos ricos e dividir com todos? Defende a socialização dos meios de produção? Os intolerantes têm consciência porque exercem a intolerância?
Historicamente, o marxismo ruiu e o capitalismo cambaleia em sucessivas crises, manipulado pelos trilionários do capital especulativo mundial. Lembremos do chavão: “o mercado não aceita, tá nervoso”. Quem é o mercado nessas expressões? Poucas dezenas de bilionários que manipulam o dinheiro especulando.
Pensadores e educadores tateiam na busca de outros caminhos. Jeremy Rifkin nos dá grandes contribuições. Pensamos que historicamente não há como patinar numa ou noutra direção. Talvez o caminho dos prossumidores seja novo alento. O que não dá para a humanidade é ficar agarrada ao radicalismo ideológico e excluir tolerância, respeito, compartilhamento, solidariedade, coletivismo, diversidade, conciliação, mediação e individualidade como pilares de sua vivência neste começo do século XXI. Pensamos que discutir esquerda e direita com discurso e estratégias do século XX é medicamento vencido que acelera a intolerância alimentando o confronto das tendências sem benefícios à convivência humana.
Na contemporaneidade percebemos pessoas que se dizem de esquerda, argumentando e praticando a partir dos seus interesses pessoais. De igual modo, do lado oposto, pessoas que se intitulam conservadoras ou de direita argumentam e agem, por vezes, baseando-se em princípios coletivos.
A intensificação do individualismo no século XXI não acontece por acaso e remonta ao século XVII com o pensamento de filósofos da modernidade como Renê Descartes (1596-1650) e John Locke (1632-1704). O primeiro organizou seu pensamento na hegemonia do sujeito marcado pela frase “cogito ergo sum” – penso logo existo. O segundo, “a verdade para todas as atividades era a razão”. O pensamento de ambos, dentre outros, contribuiu para a construção de uma ética individualista centrada na obediência e na aceitação da realidade. O caos argumentativo praticado pelas pessoas se estabeleceu no século XXI, de tal maneira, que a exacerbação da intolerância passou ser rotina na sociedade. Muitas pessoas que se dizem de esquerda ou direita brigam no trânsito por uma passagem, um estacionamento, uma fila, uma imposição de argumento numa reunião, uma música, um saco de lixo, time de futebol, bebida, mensagem nas redes sociais, uma opinião politica, etc. Tudo por conta da prática exagerada do individualismo.
Embora seja conceito que permeie a sociedade ocidental, o individualismo não se revelou de um dia para outro em nosso meio, pois “a configuração individualista de ideias e valores que nos é familiar não existiu sempre nem aparece de repente. Faz-se remontar a origem do “individualismo” a uma época mais ou menos remota. Temos, assim, um paralelo entre o indivíduo moderno ocidental e o indivíduo tradicional da antiga sociedade indiana. Dumont explica que quando o indivíduo constitui o valor supremo, trata-se de individualismo. Nesse caso, o indivíduo não pode ser submetido a ninguém, sendo as suas regras pessoais que movem a sua existência. Quando o indivíduo se encontra na sociedade como um todo, trata-se de holismo. O modelo indiano de sociedade é holista, a sociedade moderna ocidental é individualista. Continua Dumont “para os modernos, o homem basta-se a si mesmo e está em relação direta com sua razão e com Deus”. O indivíduo é um ser autônomo, integrante de uma comunidade que forma o Estado, tornando-o o poder supremo.
Na sociedade de consumo, sua essência caracteriza-se por mais produção e mais consumo, principalmente dos “bens” materiais, habitualmente associados às novíssimas tecnologias e o vazio de valores, com ausência de referências morais e éticas. O consumismo tenta restabelecer o equilíbrio “homeostático” e sentir-se mais revigorado. As Ciências Humanas, principalmente a Sociologia e a Psicologia, criaram e continuam a criar os instrumentos necessários para perceber como é que se pode cada vez mais transformar seres humanos em títeres. Perguntamos, neste início do século XXI, como é que se chegou a tamanho egoísmo, a tão grande relativismo? Explicar-se tudo a partir do individualismo “eu penso, eu quero, eu sei, eu vejo assim”, não poder ser a última alternativa. Porque não substituir por “como nós pensamos, como queremos? Como sabemos? Como vemos?” Para substituir basta nos colocarmos no lugar do outro antes de tomarmos a decisão.
Dirão alguns! “É difícil: o sistema, a vida. É complicado”. Toda vez que transferirmos a culpa para o outro buscamos a isenção e a acomodação e ficamos no mesmo lugar, muitas vezes continuando a reclamar e nada mais. Portanto não fazemos nossa parte. O que fazemos na academia da vida? Provocar, refletir, divulgar e praticar o fortalecimento de valores onde o consumo exagerado seja contido, onde o respeito às pessoas nas suas diversas características seja praticado, onde a tolerância seja regra e onde a individualidade exista, porém contida, para o bem de uma sociedade fundada na ética da inclusão. É preciso ressignificar conceitos, gestos, sentidos das palavras, tendo imperativo o diálogo e o bem-estar da humanidade em detrimento do individualismo.
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