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Guerras não são como filmes da Marvel

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Gabriel Barros (*)

O maniqueísmo barato que prevalece na grande mídia ocidental reforça uma análise simplória de puro senso comum, na qual existe herói de um lado e vilão do outro. Putin está longe de ser alguém preocupado em desnazificar a Ucrânia e o presidente ucraniano está longe de ser um herói protegendo o seu povo. Putin é um ditador de direita que há muito demonstra pretensões czaristas. Qualquer ideia que indique que o presidente russo pretende instaurar uma nova URSS é mais uma faceta de senso comum misturado com anticomunismo. Como dito, Putin é um ditador de direita, e que, portanto, tem muitas diferenças ideológicas para com o antigo regime. Inclusive ficou claro em seu discurso crítico a Lenin e ao governo soviético. O objetivo da crítica parece ser legitimar suas ambições czaristas.

Noutro giro, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, eleito em 2019, é um comediante que chegou ao comando do país impulsionado por um sentimento antissistema com um tom politicamente reacionário. Qualquer semelhança com a situação presidencial brasileira não é mera coincidência. Importante ressaltar que a atual crise militar teve grande influência a partir de um golpe de Estado sofrido pelo presidente Viktor Yanukovich, aliado russo, no ano de 2014 e contou com apoio dos EUA e União Europeia. O golpe teve como principal fundamento a incorporação de Kiev ao bloco atlântico.  Para isso, contou com a comunhão de esforços de sociais-democratas a neonazistas.

A Ucrânia é um país que já conta com um histórico de apoio às ideologias nazistas e que se reforçou recentemente com o sobredito golpe de Estado. Veja-se que, inclusive, existe no próprio seio do exército ucraniano um pelotão nazista, o chamado Batalhão de Azov. O que é propositadamente ocultado pela cobertura da mídia ocidental.

Também vale lembrar que a Otan, criada em 1949 para combater a URSS , já não tem mais razão de existir ao menos desde 1991, ano da extinção das repúblicas socialistas. Como se não bastasse, descumpriram acordo de não se expandir. Aconteceu na verdade o contrário e desde então a Organização vassala dos estadunidenses só cresce, o que por razões óbvias, só intensifica a possibilidade de conflitos/guerras. Até o ex-secretário de Defesa do Governo Clinton (partido Democrata, o mesmo do atual presidente Biden), Bill Perry,  reconheceu ainda em 2016, que antes mesmo das atuais incursões de Putin, os EUA mereciam grande parte de culpa nos conflitos da época por conta da expansão da OTAN em territórios da Europa Oriental, se aproximando cada vez mais da Rússia.

Sigmund Freud, Wikipedia

Em 1915 o psicanalista Sigmund Freud escreveu um texto intitulado “Reflexões para os Tempos de Guerra e Morte”, que na verdade foi a junção de dois artigos: A desilusão da Guerra e Nossa Atitude para com a Morte. Nesse trabalho, o autor consagra a seguinte ponderação:

“A guerra, em que não queríamos acreditar, estalou e trouxe consigo a decepção. Não só é mais sangrenta e mais mortífera do que todas as guerras passadas, por causa do aperfeiçoamento das armas de ataque e de defesa, mas, pelo menos, tão cruel, exasperada e brutal como qualquer uma delas. Infringe todas as restrições a que os povos se obrigaram em tempos de paz – o chamado Direito Internacional –, não reconhece nem os privilégios do ferido e do médico, nem a diferença entre o núcleo combatente e o pacífico da população, e viola o direito da propriedade. Derruba, com cega cólera, tudo o que lhe aparece pela frente, como se depois dela já não houvesse de existir nenhum futuro e nenhuma paz entre os homens. Desfaz todos os laços da solidariedade entre os povos combatentes e ameaça deixar atrás de si uma exasperação que, durante longo tempo, impossibilitará o reatamento de tais laços. ”

Em certo sentido é isso que representa a guerra. Morte e violação de direitos. E, embora no capitalismo isso seja a regra, em um cenário de guerra isso é levado às últimas consequências. Não se trata de uma briga entre mocinho e vilão. A realidade é complexa e, como diria Thanos (por falar em vilão cito um da própria Marvel), tende a ser decepcionante. Por isso, encerro o texto com a reflexão de Sartre, que diz: “Quando os ricos fazem a guerra, são sempre os pobres que morrem”. Essa é a realidade. Thanos estava certo.

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*Gabriel Barros, Advogado e pós-graduando em direito público.

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