Valtênio Paes de Oliveira (*)
Cada religião ao longo dos tempos tem seu livro sagrado. Comum em rodas de diálogo e até discurso político afirmar-se: tá na Bíblia é verdade”. Será? Na sua origem e evolução, quase sempre, os humanos abrigaram-se no politeísmo, até que, mais ou menos, no século I antes de Cristo, textos em aramaico e hebraico, do Velho Testamento, começaram ser escritos. Nos ensina Cristoph Markschies, estudioso do Cristianismo, ao analisar o sítio arqueológico da região do Mar Morto, perto de Jerusalém. Ainda segundo a mesma fonte, os evangelhos do Novo Testamento datam de 70 depois de Cristo.
Observe-se que além do Espiritismo e do Ateísmo destacam-se como religiões monoteístas: Judaísmo ( ortodoxos, reformistas e conservadores), Cristianismo(católico romano, ortodoxo, protestante, anglicano, pentecostal); Islamismo (sunitas e xiitas) com os árabes, além de outras subdivisões. Cada segmento usa seus respectivos livros conforme a valsa do interesse momentâneo do discurso.
O que dizer da “guerra santa” nas Cruzadas pelos cristãos, do Jihadismo para setores árabes? O que dizer do ataque terrorista do Hamas e do massacre dos judeus sobre na Faixa de Gaza? Um pequeno território com mais de dois e meio milhões de pessoas cercado por armas de Israel há décadas, agora bombardeada diariamente sob o pretexto do “olho por olho, dente por dente”?
Israel x Gaza vivem nos últimos dias confrontos mortais com mais de 7000 mortes e mais um milhão de pessoas deslocadas em êxodo. Opõem-se aos princípios originais das respectivas religiões. Suprimem espiritualidade no discurso ao defenderem a eliminação do oposto. No Brasil, conservadores apoiam a reação desproporcional de Israel ,mas suavizam o 08/01 numa mistura heterogênea, na medida que usam fatos, conforme o interesse político do argumento.
Falta coerência no discurso. Pregadores, sob o manto de religiões, estão levando inocentes ao inferno com o recrudescimento da medievalização religiosa. A Bíblia, o Alcorão, como todos os livros tidos como sagrados pelos seguidores, foram escritos por humanos, portanto, falíveis, sujeitos à linguagem e valores culturais de um momento histórico. Não podem ser trazidos para o presente na sua literalidade.
As transformações sociais, os direitos, as tecnologias mudaram em velocidades exponenciais, enquanto alguns líderes religiosos, por interesses pessoais apegam-se às ideias vencidas pela história, para fazer proselitismo religioso, enganando inocentes ou matando na guerra física e mental. Nem sempre o que está no livro sagrado deve ser encarado como verdade final nos dias atuais. As verdades religiosas, científicas e filosóficas prevalecem conforme o momento histórico. Árabes e judeus usam o passado vencido pela filosofia e história para atender política bélica internacional.
Milhares de crianças e mulheres mortas, hospitais virando necrotérios, população sem água, energia e remédios: cadê a espiritualidade da religião? Verdade que ataque terrorista é condenável, porém o que esperar de um povo sitiado, numa prisão aberta, verdadeiro campo de concentração, com mais de dois milhões e meio de pessoas, sem esperança, apoio? Gerações nasceram e vivem conjugando os verbos viver ou morrer. Um povo vivendo sob a mira de armas reage como? Não se concebe a violência crônica sobre a população de Gaza, tal qual o ataque dos radicais do Hamas aos judeus.
ONU e Cruz Vermelha impedidas de exercerem ações humanitárias, médicos fazendo cirurgias no chão, sem anestesias, sob a luz de celulares, falta de água e comida para uma população de mais de 2,5 milhões. Assistir a esta tragédia massacrante é comodamente cruel. Coerentemente seria estar no cenário da guerra. Pura insensibilidade humanitária.
Nem antissemitismo, nem islamofobia. Quem assim procede quer perpetuar a violência cruel de massacre humano? Justiça é o direito de um Estado Palestino e um Estado de Israel coexistindo separadamente. Apesar do Antigo Testamento “olho por olho, dente por dente” do livro sagrado dos Judeus, da “guerra santa” de setores árabes com o Alcorão, a espiritualidade deve prevalecer entre os humanos. Nem sempre o que está nos livros sagrados é literalmente verdade, principalmente, quando são usados com violência para atender interesses geopolíticos e econômicos.