Por Emerson Sousa (*)
Uma das principais discussões no que se refere às formas pelas quais a sociedade brasileira deve se posicionar para enfrentar a disseminação da Covid-19 se relaciona ao seu impacto por sobre a saúde das contas públicas.
Há estudos que apontam que o Governo Federal vá dispor de, no mínimo, 2% do Produto Interno Bruto (PIB) para promover esse enfrentamento. Um percentual pequeno considerando que outros países vão mobilizar muito mais do que isso.
De todo modo, uma coisa é certa: a União vai precisar “coçar o bolso”, principalmente para poder atender às demandas daqueles profissionais afetados pela pertinente e necessária política de isolamento social.
Então, como um dia perguntou o salmista (ou o personagem daquela série infantil, caso queira): “de onde virá o meu socorro?”. Ou seja, de onde o Estado vai tirar recursos suficientes para tanto?
A proposta desta Coluna é a de que o Governo Federal estabeleça com os credores da Dívida Pública Interna uma carência temporária no pagamento do seu serviço (juros e outros encargos), sem envolver as amortizações do principal.
Afinal, desde o início do ano até o dia 27 de março de 2020, o Governo Federal já havia dispendido com os chamados Encargos Especiais um montante de pouco mais de R$ 190,9 bilhões (quase o dobro da economia do Azerbaijão, em 2018).
Todo esse volume equivale a seis vezes ao que ele mesmo desembolsou para garantir o investimento em Educação ou, alternativamente, nove vezes o gasto com Saúde no mesmo período.
Com pouco menos de três meses de juros seria possível sustentar, com um auxílio de R$ 1.200,00 mensais, durante um trimestre, exatamente um total de 53.026.254 famílias, ou seja, ¾ do quantitativo existente no país, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Mas é claro que isso é mais do que bastaria para atender os 38,8 milhões de trabalhadores informais atualmente existentes. Então, haveria recursos extras para serem repassados a outros entes federativos e amenizar os efeitos econômicos da pandemia.
Com a vantagem de que essa renúncia liberaria o governo central dos efeitos deletérios de outras medidas fiscais tais como o aumento do déficit público, o crescimento do endividamento ou o surgimento de pressões inflacionárias.
Como o Brasil possui reservas poderosas e o período dessa suspensão concertada de pagamentos seria curto (três meses), seria pequena a perda de confiança na economia do país. Pelo contrário, talvez até ajudasse na recuperação pós Covid-19.
Óbvio que uma medida tão extrema somente poderia ser tomada em situações extremas. Todavia, desde o segundo mandato Rodrigues Alves o Brasil não enfrenta uma pandemia como essa. Dessa forma, por que não pedir aos rentistas nacionais esse “esforço patriótico”?
Entretanto, a coluna reconhece o quixotismo da proposta e desconfia que ela não seria muito bem recebida nos mais diversos meios, provavelmente o fosse até com algum desdém em sua maioria.
Até porque, no Brasil de hoje, há quem veja mais racionalidade em se dar uma bolsa de R$ 200,00 durante três meses para um informal ou, mesmo, deixar um trabalhador desocupado durante quatro meses sem nada receber!
(*) Emerson Sousa é doutor em Administração pela NPGA/UFBA e mestre em Economia pelo NUPEC/UFS.