Por Luciano Correia (*)
De vez em quando, a morte de uma pessoa nos impacta e nos impõe a constatação de que estamos cada vez mais pobres de grandes homens e mulheres. Ziraldo é o mais recente dos desaparecidos que nos traz essa sensação. Eu era um garoto que amava a música e a cultura de forma geral e começava a me interessar por política. Foi quando ingressei no curso de Engenharia Química da UFS, aos 18 anos. Logo nos primeiros meses entrei para o movimento estudantil e o Diretório Acadêmico se tornou minha segunda casa. Foi onde entrei em contato com outros discos maravilhosos, autores e livros, e com o semanário Pasquim.
O Pasquim foi o esteio de toda uma geração crítica, aliás, mais que isso, de gente de todas as áreas que na época resistia à ditadura, razão pela qual sofreu sucessivas represálias e levou à prisão alguns dos seus colaboradores. O Pasquim fazia o jornalismo que os jornalões não tinham peito ou interesse em fazer. Por isso, renovou a linguagem dos jornais impressos, influenciando colunas e editorias a serem mais vibrantes, menos chatos e mais independentes em relação ao poder político. E era um esculacho só, do início ao fim. Os militares e seus serviçais jamais conseguiram turvar o excelente bom humor do jornal em qualquer situação.
O Pasquim era informação refinada, feita por colaboradores de altíssima qualidade, com muitas fotos, cartuns e entrevistas absolutamente geniais. Ali conheci e me apaixonei de imediato pelo texto literário de Fausto Wolf, me encantei com Paulo Francis e Ivan Lessa e curti as tirinhas de Henfil. Nunca esqueço de uma entrevista com Elomar, ainda na década de 1980, uma verdadeira tese sobre nossa culta e bela língua portuguesa. E de outra em particular, com o antropólogo Nunes Pereira, uma das figuras mais geniais da cultura brasileira, infelizmente ofuscado pelos holofotes que só viram Gilberto Freyre e Darcy Ribeiro.
No centro e no turbilhão desse luminoso oásis na história da imprensa brasileira, a mão forte e bem humorada de Ziraldo e Jaguar, fazendo arte também nas edições semanais, mas cuidando, sobretudo, na manutenção do sonho. O velho Pasca sobreviveu até quando pôde, ou até quando foi possível, numa sociedade já livre da ditadura, mais aberta e com muitos novos atores emergindo na cena miditática. Calhou também que o tempo chegou para seus criadores. No caso de Ziraldo, além do Pasquim, trilhou desde cedo outros caminhos em revistas da grande imprensa, publicação de quadrinhos e de livros de prosa.
Fui entrevistá-lo em Aracaju quando comandei um programa na extinta TV Caju, um canal por assinatura que desapareceu sem que nenhum intelectual, ou, vá lá, um reles jornalista, tenha acusado seu lamentável desaparecimento. Sempre fui avesso a paparicos com celebridades – já entrevistei vários artistas e três presidentes da República, sem sofrer do complexo de vira-latas. Mas não consegui reagir ao irresistível encanto pessoal de Ziraldo, uma figura brilhante, afetuosa, de inteligência rara e rápida.
Ziraldo foi durante toda a vida, a exemplo de Millôr Fernandes, um grande ganhador de dinheiro, um homem que sempre soube dar seu preço e cobrá-lo sem concessões. E era ao mesmo tempo essa figura iluminada, como dizem alguns, uma pessoa espiritualizada. Talvez por isso tenha desde cedo compreendido a linguagem das crianças, criando personagens e fazendo histórias, com uma ternura que poucos poetas tradicionais alcançaram. Dentro desse oceano de obras infantis, do Menino Maluquinho ao Flicts, a invenção de uma cor, uma em particular me comoveu: o romance Vito Grandam, a comovente história de um sobrinho cujo herói é um tio um pouco mais velho. O tio já se encaminha para uma idade adulta, mas vive as últimas aventuras de uma criança fabulosa, cheia de histórias, estripulias e sonhos. Quando li, fiquei pensando como um homem já de meia idade, jornalista calejado pela perseguição da ditadura, conseguiu entrar daquela forma no universo psíquico e lúdico de duas crianças, criando uma coisa tão bela e simples ao mesmo tempo.
Certamente foi por essas qualidades de Ziraldo, essa capacidade de ser sincero e ir tão fundo em tudo o que realizou, que fez a vida lhe soar como algo leve, sem mágoas guardadas e com uma capacidade incrível de extrair poesia das coisas banais do cotidiano. Para uma pessoa assim, até a perseguida (e difícil) arte de ganhar dinheiro vem na gravidade, sem nunca ter sido uma obsessão. No fim, nem importa muito, porque as coisas materiais, para gente assim, nunca são as primeiras coisas, sobretudo, como dizia Pessoa, quando a alma não é pequena. E a alma de Ziraldo era do tamanho do mundo.
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