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O inglês pode estar desqualificando nossa cultura

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Valtênio Paes (*)

“Mas, afinal, é a língua que influencia a cultura ou a cultura que influencia a língua? A pergunta parece ser do gênero “o que nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?”. Uma se ampara na outra e juntas constroem e alteram a dinâmica social. Seja qual foi a primeira a influenciar a outra, a verdade é que, para aprender um idioma, não basta apenas decorar as regras gramaticais e ter um bom vocabulário. É preciso também aprender a cultura”. Natália Becattini Postado em 19-07-2016.

 

 

Eis algumas palavras usadas em nosso cotidiano: milkshake, hamburguer, diet, light, fashion, designer, top less, top model, fitness, outdoor, delete, insight, notebook, big brother, cheeseburguer, CD-ROM, pop star, windows, word, download, internet, site, e-mail, messenger, mc donald, bob´s drink, plug, hotmail, shopping, show room, playstation, station games, lan house, book, drive thru, fast food ,pit stop, feeling ,drive, hip hop, pop, look, desktop, brother, stress, play, on, bad boy, coffee break, playgraund,  checklist, feedback, like, login, botox, fake, jeans, rent car, baby, bullying, etc. A lista é longa, tem até nome próprio de brasileiro com pronúncia e grafia equivocadas.

Está em tudo! Basta revisar a linguagem na tecnologia, alimentação, transportes, lojas, turismo, escolas, trabalho, artes, sexo e no amor. Como poucos sabem o significado, pronuncia-se aportuguesando e tudo fica supostamente resolvido.

Muitos profissionais que laboram no magistério da língua inglesa devem ficar surpresos com as pronúncias produzidas em nosso cotidiano na imprensa, no comércio, nos condomínios, turismo, nomes próprios etc. O mestre Ariano Suassuna firmou posição respeitada em defesa da língua portuguesa e dos nossos valores culturais regionais. Sua obra imortalizou sua defesa.

Em Portugal, país de origem de nossa língua materna, a situação é diferente. Na Argentina com o espanhol, de igual modo. Ao que parece, estes países tentam preservar seu principal bem cultural. Segundo o jornal “Clarin” disse o presidente da Academia Argentina de Letras, Pedro Luís Barcia, em 23.07.2004: “dos 90 mil vocábulos do espanhol, existem apenas 130 anglicismos de uso permanente, um número que na totalidade da língua não é nada”. Nesses países busca-se preservar o bem cultural.

Anglicismos podem ensejar, para uns, sentimento de esnobismo ou prestígio atribuindo ao inglês uma valoração positiva por estar associado à ideia de beleza, elegância, superioridade de objetos, modernidade por ser a língua usada pela maior economia do mundo. Alguns se eximem da entrada no embate, acirrado ao modo do projeto de lei do político Aldo Rebelo atacando os estrangeirismos como ameaça à integridade da língua portuguesa e soberania nacional.

Outros linguistas, veem como parte do processo natural das línguas vivas no planeta. Certo é que, preservando-se a fonte, filmes americanos regularmente acompanhados da bandeira, músicas, máquinas, produtos, tudo em inglês, embutidos de seus costumes, diariamente, são despejados pela mídia brasileira por aqui, substituindo o português.

O que pais ou responsáveis dirão aos menores que, em fase de alfabetização, passando pela rua começam a ler frases nas casas comerciais e se deparam com expressões em inglês? O que dizer de escolas de ensino regular com nomes em inglês na terra onde se fala o português? “Atividade pedagógica” como halloween em detrimento das juninas e do carnaval? Difícil explicar e de entender.

Como não bastasse, erros rotineiros ao confundir palavras de grafia e pronúncia parecidas, usar uma palavra em inglês com seu significado em português, usar preposição correta em frases verbais, pronúncia de sons nasais e dos dígrafos ‘lh’ e ‘nh’. Dificuldade na concordância verbal e de gênero, na entonação correta a uma pergunta, equívocos no uso dos verbos “ir”, “ver” e “vir”, “ser” e “estar” acontecem cotidianamente.

Disse Suassuna ao Estadão: “A verdadeira universalidade respeita as singularidades locais. Todos entram com sua parte, compondo a vasta sinfonia da cultura. Ela é feita de contrastes, que não são contrários, mas complementares. Do jeito como está proposta, a globalização é apenas a prevalência de uma cultura única, a norte-americana, sobre todas as outras”.

Ariano Suassuna Foto: Wikipedia

O “complexo vira lata” expressão de Nelson Rodrigues sobre o trauma sofrido pelos brasileiros em 1950 na derrota da Seleção Brasileira para Seleção Uruguaia, no Maracanã, talvez explique o “só acontece no Brasil” ensejando esta ânsia anglicanista usada na linguagem verbal de brasileiros. Neste toar, pessoas valorizam a música, a linguagem, os costumes do mundo externo em detrimento de seus valores com péssimo reforço dos órgãos de comunicação, que curiosamente são concessões públicas.

A língua de um povo é seu veículo maior na difusão de sua cultura. Acatar outra língua pela dependência econômica é atestar a submissão, incompetência, subserviência, submeter a autoestima, a história e seus valores. Longe de discutir soberania nacional com a presença externa na língua. Merece, no entanto, reflexão quanto a preservação de nossa cultura. Triste a invasão de palavras trazidas por pessoas que sequer sabem pronunciar nem tão pouco sua significação.

Como disse o mestre Ariano Suassuna “O otimista é um tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperançoso”. Vamos esperançar! Que a história faça resistir e fortaleça nossa cultura para o bem de nosso povo, senão teremos a babel da submissão e do consumo desqualificados.

(*) Valtênio Paes de Oliveira é professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada -Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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Valtenio Paes de Oliveira

(*) Professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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