Geralmente, quando pergunto aos meus alunos o que é política, eu ouço as mais desabonadoras das respostas, algo deveras triste. Porém, essa conduta provém de um equívoco, no qual a política se reduz a engodos, mentiras, corrupção e desonestidade.
E isso é um erro porque a política é simplesmente a ação de coordenação da conduta coletiva, de ordenação da vida em sociedade e de articulação das formas de agir dos agrupamentos humanos.
Ou seja, é por meio da política que nós concertamos aquilo o que vem a ser socialmente aceitável ou reprovável, sendo dela que deriva o que é comunitariamente desejável ou não. Também nasceu da política, quando ela foi transformada em decisões, todos os progressos da humanidade.
Afinal, da possibilidade de uma terceira safra do milho à última foto do James Webb, passando pelo direito a uma consulta médica, nenhuma realização humana é concretizada sem aquiescência política. Por sinal, o próprio acesso e consumo deste texto é fruto da conjunção de um amplo cabedal de ações políticas.
Da definição do tema, da escolha do idioma, da obediência ao regramento gramatical, da liberdade para escrevê-lo, do formato de expressão das ideias, das formas de sua disseminação, das possibilidades de desavenças e de concordâncias são todos esses fenômenos políticos.
Por quê?
Porque os princípios e as normas que definem essas atitudes são fruto de atos de concordância, que podem surgir por meio do convencimento ou da coação, mas que pedem, sempre, aceitação geral para existirem. Sem algum nível de legitimação política (por ação ou omissão), nada do que é socialmente humano existiria.
Sim, aceita porque dói menos: Tudo é política!
Então, não haveria vida em sociedade sem a política, mesmo naquelas mais fechadas ao convívio estrangeiro. Porque, sem política, não teria como duas ou mais pessoas chegarem a um acordo sobre algo.
Não é por acaso que Rui Barbosa – em um dos seus textos mais famosos, “Política e politicalha” – recepciona a política como a “higiene dos países moralmente sadios”.
Claro que essa é uma forte idealização do jurista baiano, dado que muita injustiça e muito arbítrio foram cometidos por meio da política, mas ele não erra quando a classifica como um predicado da convivência grupal.
No entanto, veja que não são poucos os que preferem se assumir religiosos – soa quase como uma obrigação – mas raros são os que tecem loas à política e se orgulham de praticá-la.
Sabe por que isso acontece?
Porque a religião nos aponta para um ser humano que gostaríamos de ser, ao passo que a política nos mostra como nós realmente somos.
A política é negócio humano, demasiado humano.
Logo, não aceitarmos a política é negarmos a nossa própria existência como espécie senciente.
Por conseguinte, se as suas virtudes são externalizações do gênio humano, os seus defeitos só podem ser corrigidos com a própria intervenção das pessoas via instrumentos e procedimentos políticos. E quanto mais democráticos forem esses, melhor.
Então, é urgente que nós tenhamos a clara consciência de que será somente por meio da política (e, sim, principalmente, a partidária) que a cidadania poderá se realizar.
Ao invés de vermos a política como um antro de enganações é preciso que passemos a encará-la como uma ferramenta da emancipação humana.
___________
(*) Emerson de Sousa Silva é economista e doutor em Administração.