O Brasil está mergulhado em problemas de todos os tipos, entre eles, a escassez hídrica que levou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a anunciar uma nova bandeira tarifária de R$ 14,20 por cada quilowatt/hora consumido. Essa cobrança valerá para todos os consumidores do Sistema Interligado Nacional de setembro deste ano a abril de 2022. Esse é o pior cenário de escassez em 91 anos.
Isso significa que todos os brasileiros, com exceção dos beneficiários da tarifa social, terão que arcar com mais uma taxação no brutal sistema de impostos brasileiro. Mas apesar do monopólio das distribuidoras, na visão do presidente da Associação de Empresas e Integradoras de Energia Fotovoltaica de Sergipe (Assesolar), o engenheiro de petróleo Christian Miranda, “o sistema de energia solar é para todas as classes”. E completa: “energia solar é um projeto de emprego e renda, imposto e arrecadação para as cidades, e talvez não seja vista da maneira correta pelos governos”.
Ele defende essa tese com conhecimento de causa, pois está sempre na Câmara dos Deputados, em Brasília, discutindo projetos de lei com os deputados federais e defendendo a não taxação para o setor neste momento. A luta, também, ocorre em Sergipe, pois o governador Belivaldo Chagas da mesma forma resolveu cobrar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do setor, que, embora em crescimento, ainda precisa aumentar muito no Estado para justificar tal cobrança.
O sistema de energia solar em Sergipe está sendo conhecido, mas segundo Christian Miranda, ainda é preciso desmistificar alguns pontos. Um deles é que a implantação é cara, o que, na opinião de Christian, não procede. O outro, segundo ele, fomentado pelas distribuidoras, é que os pobres pagarão a conta dos ricos.
Esta semana, quando todos passam a pagar energia mais cara, Christian Miranda conversou com o Só Sergipe para contar um pouco da luta, como representante de uma categoria, que vem tendo para popularizar o setor e torná-lo cada vez mais acessível a todos.
Vale a pena a leitura.
SÓ SERGIPE – Esta semana a Aneel anunciou a criação de nova bandeira tarifária na conta de luz devido à escassez hídrica, cobrando uma taxa de R$ 14,20 por cada kilowatt/hora consumido. Isso é muito dinheiro para o brasileiro, principalmente para o pobre que já sofre com a carestia tremenda. A partir desse anúncio, é possível que cresça o número de pessoas que desejem investir em placas fotovoltaicas?
CHRISTIAN MIRANDA – A energia no país é um problema muito sério, é escassa. Se nós tivéssemos um desenvolvimento econômico normal para um país que se diz em desenvolvimento, garanto que já teríamos tido um apagão por aqui há muito tempo. Isso porque não teríamos uma estrutura energética suficiente para atender essa demanda de energia no país. A tendência é sempre ter energia cara e isso vai ser cada vez pior, porque as crises hídricas nós estamos vivendo há anos. Por vários governos ouvimos a mesma história, inclusive a falta de empatia deles para resolver um problema seríssimo e fazer um país pronto para o desenvolvimento, com investimentos a serem feitos de forma gradual, já que se passou tanto tempo e nunca foi feito nada. Realmente é um sério problema a tarifa que vem aumentando, saindo de um patamar de R$ 9,00 para R$ 14,20, um aumento médio em torno de 7%, algo considerável, principalmente para as pessoas mais humildes, e isso faz uma diferença brutal no bolso. Respondendo à sua pergunta, o sistema fotovoltaico instalado na residência traz como maior benefício a economia financeira. Justamente na parte que se consegue abater no valor da conta utilizando o sistema do tamanho que lhe atenda, podendo chegar a uma economia de até 90%. E isso faz realmente grande diferença.
SÓ SERGIPE – O senhor poderia dar um exemplo?
CHRISTIAN MIRANDA – Sim. Uma pessoa que tem uma conta de luz mensal de R$ 1 mil e coloca o sistema fotovoltaico, vai passar a pagar em torno de R$ 120 a R$ 160, o mínimo referente com relação à rede. Isso vem a fazer com que a economia, no período de payback, seja bastante expressiva. De qualquer maneira, nesse momento, quando está comprando um equipamento, que não é igual a uma geladeira ou fogão, terá benefícios. Você tem uma conta de luz que vai ser reduzida pós-homologação do sistema e a partir daí tem uma prestação de financiamento. Um compensa o outro. No período de quatro anos, após o payback passar, é só economia e lucro. Energia solar vai além de uma questão energética. É uma forma para você ganhar dinheiro em sua própria residência. Nesse exemplo de R$ 1 mil, essa diferença vira lucro para você.
SÓ SERGIPE – Como está esse mercado em Sergipe?
CHRISTIAN MIRANDA – Com relação ao mercado de Sergipe ele está aquecido. As pessoas estão passando a conhecer mais sobre energia solar, e a se interessar. Aracaju é uma cidade pequena, então as conversas vão passando de um para o outro e muitos estão envolvidos por conta do aumento na taxa de energia elétrica. Elas acabam buscando alternativas. Temos visitado muitos clientes, mas ainda é um mercado que precisa desconstruir algumas imagens que foram criadas com relação a ele, isso há muito tempo. O sistema de energia solar foi criado pela Nasa, para mandar seus equipamentos para o espaço e ter uma geração própria. Evoluímos bastante, e em 2012 entrou a norma 4829, na Aneel, que veio com a questão de poder utilizar a rede com uma bateria gigante onde pudesse armazenar energia cedente, revolucionando o sistema fotovoltaico e veio ajudar as empresas a crescerem. Desde 2012 estamos nessa luta para desconstruir essa questão do caro e as pessoas estão começando a compreender. Energia solar é um projeto de emprego e renda, imposto e arrecadação para as cidades e talvez não seja vista da maneira correta pelos governos.
SÓ SERGIPE – De que forma não vem sendo visto pelos governos?
CHRISTIAN MIRANDA – Pelo governo federal conseguimos desde 2012 vários apoios com relação à isenção de impostos, como PIS e Confins e importação, fazendo com que diminuíssemos o valor. Em Sergipe, nós tínhamos a isenção de ICMS, não havia nenhum tipo de taxação e isso ajudou muito. Quando chegamos num patamar bom, as coisas começaram a se inverter. Em 2018 houve uma inversão na norma da Aneel, era prevista revisão e houve a ideia da Aneel de taxação de 63% de quem gera energia solar. Daí começou uma luta pela não taxação do sol, lá em Brasília. Chegamos ao Projeto de Lei 5829, que foi uma forma de tentar se livrar da Aneel, mas como estamos brigando com órgãos, monopólios violentos de energia no Brasil, estamos tendo uma série de dificuldades. E acabou indo para a taxação de 28%, e se for sancionado, a regra só valerá depois de um ano. Esperamos que não seja sancionado.
SÓ SERGIPE – E aqui em Sergipe?
CHRISTIAN MIRANDA – Havia um acordo da Confaz, do qual Sergipe faz parte, de não cobrança de ICMS para energia solar, que incentivava o setor. Mas, do nada, o governador Belivaldo Chagas, nesse período de pandemia, baixou um decreto revogando a não cobrança do ICMS e passou a cobrar. São coisas que atrapalham muito a gente, uma cobrança de mais de 27%. Quantas taxações e impostos nós pagamos? Isso é um abuso para nós.
SÓ SERGIPE – Com sua informação, fica claro que os governos, seja ele federal ou estadual, querem sempre cobrar imposto. Não é isso?
CHRISTIAN MIRANDA – Sim. O governo precisa de arrecadações e, às vezes, acha em locais inusitados, porque, teoricamente, o sistema de energia solar não era para estar sendo discutida a taxação, mas incentivada, falada como uma grande oportunidade. A grande mídia fala bem desse sistema. Infelizmente, temos uma Câmara dos Deputados muito ativa, que vem trabalhando forte de forma contrária para o crescimento da energia solar. Talvez até por falta de conhecimento no setor. Mas, sem dúvida, não é só o governo, porque temos a questão do monopólio da energia do país, que não quer o desenvolvimento da energia solar, pois é prejuízo para ela.
SÓ SERGIPE – Como assim?
CHRISTIAN MIRANDA – Prejuízo porque deixa de arrecadar: tinha um cliente que pagava R$ 1 mil mensais e passará a pagar R$ 160. Lembrando que foram as empresas que estipularam esse mínimo. Querem que as distribuidoras continuem no poder e, também, a impossibilidade de individualmente termos nossa própria energia, por falta de visão das distribuidoras e concessionárias para faturarem juntas. Enquanto induzem as pessoas mais pobres de que energia solar não é bom para elas, constroem usinas de energia solar tão grandes em nível de potência, vendendo para a gente ao preço de tarifa normal. É uma coisa que vai muito além da Câmara dos Deputados, é uma força muito grande do outro lado, que vem trabalhando de forma contrária, num país que tem a maior irradiação solar, perfeito para energias renováveis, mas aqui vem sendo desestimulado, atacado com mentiras. Eles colocam que o pobre paga ou compensa a falta do faturamento porque o rico colocou energia solar. É mentira. O nosso cliente não é somente o rico, mas todos. Existem sistemas de energia solar em habitações do Programa Minha Casa, Minha Vida. A pessoa que tem um consumo baixo vai colocar duas placas por R$ 1.500 a R$ 2 mil, e vai ter sua economia. A energia solar é para todas as classes. Mas foi pintada uma história de que é feito para rico. Quando as distribuidoras falam que o pobre está pagando para o rico, isso é uma ação delas pois compensam isso em cima do pobre. Os países desenvolvidos vêm trabalhando com energias renováveis há muito tempo. Quando as empresas viram o nosso crescimento de 100% ao ano – e já chegamos a crescer 200% – , as distribuidoras ficaram incomodadas, porque vai mexer no bolso delas. Hoje, nós representamos 0,5% da matriz energética, significa que não fazemos cócegas na arrecadação delas. E digo mais: quanto mais sistema de energia solar, até atingirmos 10% da energia solar, o nosso sistema aguenta toda a carga injetada, ajudando o sistema brasileiro de energia a funcionar melhor.
SÓ SERGIPE – Por quê?
CHRISTIAN MIRANDA – Porque quando eu tenho um sistema de energia fotovoltaica instalado dentro da minha residência e o vizinho não tem, essa energia que injeto durante o dia na minha rede, ela não vai até Itaipu e volta, mas ela busca o primeiro ponto que precisa de energia e vai para o vizinho que está precisando. Isso reduz as perdas de energia nas linhas de transmissão, que hoje é alta, em torno de 15% e são custos, gastos.
SÓ SERGIPE – Hoje, o setor gera quantos empregos no Estado?
CHIRSTIAN MIRANDA – Temos 1.240 empregos diretos gerados aqui. Mas, nós como empresas, somos poucos aqui. O fato de o governador cobrar imposto de nós na conta de luz já é uma covardia, pois aqui temos, no máximo 2 mil empresas, o que não é um dado oficial. Não temos empresas suficientes para gerar uma arrecadação que valha a pena e essa taxação atrapalha o setor. Quando crescermos, aí sim, contribuiremos com impostos e o consumidor vai entender isso lá na frente.
SÓ SERGIPE – Qual a média do investimento inicial numa casa ou num condômino para instalar energia fotovoltaica.
CHRISTIAN MIRANDA – Uma casa bastante grande que vai ter uma geração de 700 quilowatt/hora por mês, bem representativa, e uma tarifa de R$ 700 por mês de energia, comprando um sistema de 5.6 quilowatt/hora por mês, com 13 placas, a pessoa vai pagar R$ 20.600,00, e a conta mensal será de R$ 167,00. No condomínio predial tem que ver a questão da área. E muitas vezes é feito para atender as áreas comuns do prédio. Existem algumas modalidades de negócios que uma delas é de geração distribuída, por meio de consórcio ou cooperativa, para atender os apartamentos. Pode-se fazer, por exemplo, uma cooperativa com 20 condôminos, mais a área comum, e montar uma usina para atender a necessidade de cada um.