Por Rocelito Paulo Pinto (*)
“O hábito de tudo tolerar pode ser a causa de muitos erros e de muitos perigos.”
Cícero
Sete é um número mágico. Tudo o que se completa, tudo o que em si mesmo é suficiente, está ligado ao sete.
Por exemplo, a música: são sete as notas musicais, todavia, infinitas as possibilidades, desde hinos de louvor à genialidade (Mozart, Beethoven, Antônio Carlos Gomes, Villa Lobos, Jorge Aragão, Patativa do Ceará, Américo Seixas, Manuca Almeida…) a ritmos execráveis, verdadeiros tributos à esculhambação, que só de ouvir já é pecado!
O calendário: são sete os dias da semana, com os quais se constroem séculos, milênios; entretanto, a marcha do tempo é inoxidável, pois há incertos pecadores em certos lugares que não morrem nunca, nem quando estão mortos, e os seus pecados são publicados assim, na calada da noite, infernizando a vida de todos os mortais! Inexorável? Só a paciência e a ignorância.
As artes: seriam em sete ou já foram em sete, no entanto, há tanta porcaria por aí sendo chamada de arte, que já não há como se separar a arte da porcaria ou a porcaria da arte, e a artilharia pirotécnica de fogos de artifícios, com a qual é promovida, se reveste de uma artimanha tão eficaz que torna eficiente a articulação sobre a arte, que se faz mais artística que a própria arte propagada, tão poderosa que transforma mero artrópode em artista, artefatos em escultura e o espectador em quadrúpede, num jogo de um artificialismo tão mágico que seria pecado se a referida arte se tornasse viva… Haja maldade com a arte!
São sete as cores do arco-íris, todavia, como o arco-íris está sendo continuamente ressignificado, e talvez isso não seja pecado, aquele fenômeno natural, que se arqueia após a chuva, está perdendo o seu encanto como arte e parar para contemplá-lo talvez seja um pecado quase capital… Pobre dessas crianças que não conhecem mais a arte de correr atrás de um arco-íris, que pecado!
A filosofia também tem a sua relação com o sete: são apenas sete os sábios da Grécia antiga, todos gregos! Por quê? Quem sabe?… Mas, com certeza, se não fossem gregos não seriam sábios! Foram eles, sem dúvida, que ajudaram a eleger as sete virtudes humanas: esperança, fortaleza, prudência, amor, justiça, temperança e fé, e por causa delas inventou-se o pecado, mas ainda sempre vale a pena contemplá-las!
Esperança, a última que morre (e por isso não pode virar sogra!), sustentando até o fim as expectativas mais improváveis. Fortaleza: constrangimento de engenheiros e arquitetos que projetam os cárceres prisionais. Prudência, preserva os dentes ante o pecado de se viver no seio da comunidade do politicamente correto (ou seria incorreto?). Amor, ficção científica que antecede à arte de copular e que é eterna enquanto dura o dinheiro. Justiça, fenômeno inexplicável e não empírico em certas regiões fictícias que praticam o idioma de raiz lusitana. Temperança, local romântico onde se guarda aromáticos culinários que equilibram o gosto da vida em todas as dimensões. Fé, conceito subjetivo e inexplicável que produz o fenômeno que relaciona o simples pecador ao pecado que o fascina, produzindo a essência de suas crenças e nas quais se justifica os seus atos. Quer um exemplo? A fé nas “fake news” a justificar os poderes do deus do cancelamento.
A Ciência também tem sua fenomenologia nas suas sete propriedades. Inércia, propriedade da nulidade da força de aceleração. Massa, inversão da derivada segunda de sua energia em relação ao seu momento. Extensão, atributo de tudo o que ocupa lugar no espaço. Impenetrabilidade: aquela coisa que, exceto no trânsito, dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Divisibilidade, dado que um elemento pode ser reduzido a termos até o limite da tecnologia existente. Compressibilidade, variação do volume por unidade de variação sob determinado conjunto de forças de pressão. Descontinuidade: interrupção de um processo ou padrão.
A Política, conforme aquela Grécia Antiga dos sete sábios gregos, como toda boa arte científica, também tem as suas sete propriedades. Inércia, qualidade que caracteriza grande parte da classe política (que fique bem entendido: aquela lá daquela Grécia!). Massa, volume útil e manobrável para fazer manifestações que interessam a certos grupos incertos e não sabidos em interesses nunca revelados e sempre negados. Extensão, capacidade de influenciar seguidores e de cancelar divergentes. Impenetrabilidade, quando dois pensamentos políticos não podem ocupar o mesmo Olimpo. Divisibilidade: dado que a importância de um empresário ou de uma empresa pública pode ser reduzida a termos de vantagens não contabilizáveis até a ganância do interessado. Compressibilidade, variação do volume de recursos a serem almejados por unidade de nichos a serem enganados sob determinado conjunto de forças de opressão. Descontinuidade, interrupção de um pensamento ou uma ideologia contrária, popularizada como cancelamento.
Também são sete as maravilhas do mundo antigo, mas como nenhum sábio moderno ou contemporâneo conhecia mais nenhuma dessas sete maravilhas, em sete de julho de dois mil e sete, também conhecido como 07/07/07, foram eleitas as sete maravilhas do mundo moderno, e para o nosso deleite, o Cristo Redentor, uma das maiores estátuas do mundo, arte brasileira construída em solo francês, desenhada por um romeno, iluminada por um italiano, é uma dessas sete maravilhas…
Não obstante, o projeto do Cristo Redentor é uma maravilha de aprimoramento de ideias, pensado inicialmente como homenagem ao ato da assinatura da Lei de extinção da escravatura, alusivo à Redentora, que em 2 de agosto de 1888 teria se recusado ao feito e declinado da homenagem, declarando que a referida deferência deveria ser dirigida ao verdadeiro Redentor dos homens, fato que se tornou ideológico no papel em 1920, materializado em pedra sabão em 1931. O tempo, como sempre, a cada sete dias, é o senhor de tudo!
Também são em sete os sete pecados capitais. Quer dizer, não, nem sempre! Os sete pecados capitais já foram oito e isso porque foram tornados capitais para constituírem a elite dos pecados, tão potentes e tão audaciosos que foram isolados dos pecados originais e dos pecados veniais… O pecado original é aquele não cometido pelo seu detentor, mas com ele agraciado ao nascer, um pecado hereditário. O pecado venial é um pecado, porém não é um pecado, quer dizer, é um pecadinho, desses que não levam para o inferno, mas podem atrasar o céu…
Já os sete pecados capitais seriam os capitais, estariam na cabeça, seriam os capitães dos pecados, porque ao cometê-los, cometer-se-ia indubitavelmente, por osmose, vários outros pecados juntos, mas por economia processual, omite-se os pecados correlacionados, escolhe-se o capital, e pronto: “teje” no inferno! E sem direito a sursis!
Todavia, até os sete pecados capitais já não são mais tão capitais assim: depende de onde, de quem e por que os comete…
O primeiro pecado capital seria a acedia, preguiça, ou aquele estado de morosidade, ou de negligência, que denota uma inatividade estridente. Seria, antigamente, hoje não é mais pecado! Por exemplo: em algum lugar do Pacífico a sensação de justiça na justiça permite uma percepção de morosidade, às vezes de negligência até, mas jamais de preguiça… Lá, em algum lugar do Pacífico, quando se é amigo do rei não existe culpa nem dolo, e o feitiço sempre vira contra o feiticeiro, e em alguns momentos tem até lado, sob o qual se sentencia: “aos amigos do rei, todos os favores, aos não amigos do rei, até os rigores da lei!”
Mas tanto é que acedia não é pecado, que a sua virtude contrária seria a diligência; porém, a tecnologia já a substituiu por automotores propelidos por ação mecânica ativada por combustão química hidrocarbonada homogeneizada com oxigênio, e algumas vezes não passa de uma ação da polícia esclarecendo detalhes de inquéritos. Diligência, na verdade, é uma saudade que transita em filme de faroeste, desses que as balas não acabam, os xerifes não morrem e tem sempre um piano sendo tocado no “saloon”.
O segundo pecado seria a avaritia, avareza ou ganância, apego excessivo, ou desejo descontrolado de possuir tudo. Seria! Pode não ser pecado! Se fosse pecado, os agentes políticos de Isentosfera do Leste não poderiam nunca se tornar políticos, pois lá, o requisito para a política é a ganância, sem a qual não haveria política e sim pecado capital e capitular… E nem sempre a avareza seria só por dinheiro, também poderia ser por poder, pela eternidade, pela lacração. Ainda bem que não moramos em Isentosfera do Leste. A virtude oposta à avaritia seria generosidade, que, se presente, seria provavelmente menor que os interesses ocultos, tanto que alguns santos generosos sempre ficam ainda mais prósperos depois que operarem milagres, além de angariar fiéis devotos e leais votos que os seguem por toda a eternidade política.
O terceiro pecado seria a gula, em latim e em português, apetite insaciável por comida ou por bebida… A gula é uma forma extravagante do egoísmo pelo fato do pecador ansiar por uma cota maior que a sua própria natureza física seja capaz de admitir… Se confunde com a ausência de empatia com aqueles que se submetem a regime de escassa oferta por livre e espontânea pressão ou por simples impedimentos pecuniários. Mas o que faz a gula não ser pecado, é justamente a sua virtude oposta, que é a moderação, pelo fato de que não há uma régua que meça o nível máximo ou mínimo de moderação, sendo, esta, peculiar a cada pessoa. Há seres que se tornam moderados digerindo um ovo frito, e há outros que permanecem moderados, após terem devorado uma granja…
O quarto, dos sete pecados, seria invidia, a clássica inveja, desejo exacerbado por posses, situação social, habilidades que outras pessoas têm ou exercem… O problema é que a inveja impede os seus agentes de reconhecerem suas próprias realizações e sua própria insignificância para se inspirar na insignificância alheia. Sua virtude contrária seria a caridade, mas os que a praticam são os religiosos e os maçons, quando a praticam. Aqueles que a praticam, e não são religiosos ou maçons, o fazem ou por política, ou por inveja dos religiosos e dos maçons.
O quinto e antepenúltimo pecado seria a ira, em latim e em português, a manifestação do sentimento de ódio contra algo ou alguém. Se isso fosse pecado, não seria normal encontrar na mídia expressões como “gabinete do ódio, ódio do bem, bancada da bala, cancelamento de cê pê efe, gado, jumência, terroristas, antidemocráticos, misoginia, antissemitismo”…
Se a ira fosse pecado, nós não teríamos guerra de humanos contra humanos, no entanto, desde que o mundo é mundo, o mundo sempre esteve em guerra, e pior, a história do mundo é contada em guerras. A virtude contrária seria a paciência, mas como descrever a paciência senão como a capacidade que alguém tenha para ler e refletir sobre tudo isso que se encontra escrito aqui?
O sexto e penúltimo pecado seria luxuria, luxúria, ou o desejo passional e egoísta pelo prazer sensual e material… mas, sinceramente, quando é que a libido seria altruísta? Machado de Assis teria dito que “Deus, para felicidade do homem, inventou a fé e o amor e o diabo, invejoso, fez o homem confundir fé com religião e amor com casamento”.
Aprende-se na religião que sexo fora do casamento seria luxúria. Aprende-se na escola que sexo é natureza. Aprende-se nos Códigos Penais que sexo pode ser estupro ou atentado ao pudor. Aprende-se nos cartórios que casamento é responsabilidade das testemunhas. Aprende-se na televisão que o sexo é explosão. Aprende-se com os donos de empreendimentos de hospedagem e entretenimento de alta rotatividade que sexo é livre. Aprende-se na maternidade que sexo é caro pecuniária e socialmente. É como diriam os jovens: É cópula!
O sétimo e último pecado seria superbia, soberba ou orgulho. Esse, se fosse pecado, seria o pecado capital de todos os pecados capitais. Quer dizer, é pecado, sim, mas não é pecado quando se é autoridade (Você sabe com quem está falando?), poderoso (Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço!), político (Eu fui eleito com trezentos milhões de votos!), especialista (Mais realista que o rei!), importante (Com o rei na barriga!), membro da nobreza (Recolha-se à sua insignificância!), valente (Dou um bife para não entrar numa briga, dou um rebanho para sair dela!), empoderado (Meu corpo, minhas regras!), artista (Quero inventar o meu próprio pecado, quero morrer do meu próprio veneno…) ou bonitão (A última bolacha do pacote!).
A virtude contrária à soberba seria a humildade, mas quem seriam os humildes? Não digam que são os pobres, porque existe muito “pobre com soberba!”… Não digam que seriam os miseráveis, porque aí seria segregação social… Quem seriam os humildes?
Há quem diga que tudo isso seria irrelevante, porque o mundo se modernizou… Mas agora, quase concluindo, descobrimos sete pecados capitais com aval do Mahatma Gandhi: “Os sete pecados capitais responsáveis pelas injustiças sociais são: riqueza sem trabalho, prazeres sem escrúpulos, conhecimento sem sabedoria, comércio sem moral, política sem idealismo, religião sem sacrifício e ciência sem humanismo.” Cacetada, haja pecado debaixo da linha do Equador!
E para piorar, Khaled Hosseini (O Caçador de Pipas) manda essa: “Existe apenas um pecado, um só. E esse pecado é roubar. Qualquer outro é simplesmente a variação do roubo. Quando você mata um homem, está roubando uma vida. Está roubando da esposa, o direito de ter um marido, roubando dos filhos um pai. Quando mente, está roubando de alguém o direito de saber a verdade. Quando trapaceia, está roubando o direito à justiça…”
Esperto é o gato que tem sete vidas e não precisa refletir sobre nada disto!
E pensar que tudo isso um dia vai parar debaixo de sete palmos, com ou sem os sete pecados capitais…
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