Outras palavras

Para Le Goff no seu centenário de nascimento

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Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos (*)

 

Fui apresentado à sua obra, ainda na Licenciatura em História, pela UFS, aprofundando-me em seus estudos no Mestrado em Educação, também por aquela instituição. Doravante, tornou-se uma das principais referências no exercício de minha profissão de professor do Ensino Superior, como também de Historiador. Medievalista por excelência, de sua seara historiográfica e teórica, valho-me, de modo especial, dos conceitos de memória e identidade.

Jacques Le Goff nasceu em Toulon (França), no dia 1º de janeiro de 1924. Fez uma sólida formação, tendo sido estudante da École Normale Supérieure, da Universidade Carolina. Iniciou sua carreira docente nos anos 50, como professor de história da École Française de Rome e professor assistente na Faculté de Lille. A partir dos anos 60, enveredou, também, pela pesquisa histórica, tendo atuado em instituições muito importantes, a saber: o “Centro Nacional de Pesquisa Científica” e a “École pratique des hautes études” (sucedendo outro grande nome da historiografia internacional, Fernand Braudel).

Ganhou grande notoriedade para além da França, sobretudo com a publicação e tradução de seus livros, entre eles, destaco: “Os Intelectuais na Idade Média”, 1957; “Para um Novo Conceito da Idade Média”, 1977; “A Bolsa e a Vida”, 1986; “São Luís, Biografia”, 1996; “São Francisco de Assis”, 2001”; “O Deus da Idade Média”, 2003. Para além de seus projetos no campo da história do catolicismo e da hagiografia (vidas de Santos), fiz e ainda faço uso, sobretudo, da clássica obra “História e Memória”, 1988.

“História e Memória” é um robusto e profundo estudo no campo da Teoria da História. No Brasil, uma de suas primeiras e importantes traduções é de 1990, pela editora da Unicamp, tendo ficado a cargo de Bernardo Leitão. Composto por dez capítulos, traz temas significativos para quem deseja se aventurar no campo da Ciência Histórica, tendo como interface o conceito de memória. Do conceito de História à discussão sobre calendário, faço uma observação especial aos itens “Passado/Presente”, “Memória” e “Documento/Monumento”, este último, leitura obrigatória para quem está iniciando um Curso de História em Nível Superior.

Das grandes lições de “Documento/Monumento”, uma, em especial se sobressai:

(…) o documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados, desmitificando-lhe o seu significado aparente. O documento é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si própria. (1990, p. 538)

Mas nada se compara à sua reflexão e ao seu ensinamento sobre a relação entre Memória e História. E nesse sentido, para além das discussões conceituais, da capacidade erudida e ao mesmo tempo didática que marcam as suas obras, no que diz respeito a este assunto de modo particular, a seguir uma daquelas frases que se tornam atemporais e muito apropriadas para nosso tempo:

A memória, na qual cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura salvar o passado para servir ao presente e ao futuro. Devemos trabalhar de forma que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens” (1990, p. 471).

Pelas considerações aqui expostas, ensaístas, é verdade, para o seu tamanho e de seu legado como professor e historiador, Le Goff entrou para a história como um dos grandes nomes da chamada “Nova História”, nascida no contexto de implantação da Escola dos Annales, fundada em 1929, por Lucien Febvre e Marc Bloch. Instituição da qual foi co-diretor nos anos 70. Sua perícia e habilidade com os estudos, pesquisa e produção editorial de História Medieval, participou da consultoria do filme “O Nome da Rosa” (1986), uma adaptação do romance de Umberto Eco.

Faleceu no dia 1º de abril de 2014, com 90 anos de idade, em Paris, deixando uma obra imortal, atual e importantíssima no meio acadêmico, colaborando sobremaneira para inúmeros estudos não somente no campo da História, mas também das Ciências Humanas e Sociais. Obrigado, Le Goff, para quem dedico este texto “au maître, avec amour”.

 

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Claudefranklin Monteiro

Professor doutor do Departamento de História da Universidade Federal de Sergipe.

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