Nas minhas primeiras idas à Europa, no início dos anos 80, me chamou atenção, ao desembarcar, frutas vendidas em bancas, no aeroporto. Era vendida uma banana, individualmente, embrulhada em papel filme, transparente. Como bom nordestino, acostumado a comprar no mínimo uma dúzia de bananas, às vezes uma penca, achei aquilo por demais estranho.
Depois, andando pelas ruas de algumas cidades europeias, constatei que era uma coisa normal. Com o mundo corrido, vi londrinos com seus lanches e uma banana, sentados na sombras do Hyde Park, almoçarem, às pressas para voltar ao trabalho.
Conto essa pequena história para mostrar como tudo mudou de lá pra cá. No último sábado, fui ao supermercado do bairro, para as compras do mês. Ao ver os preços exorbitantes de algumas frutas e hortaliças, as que não aboli, comprei apenas duas ou três: batatas, cebolas, para não falar na campeã de preço alto, a cenoura.
Estou para ir ao supermercado como quem vai a um museu, outro lugar que gosto de frequentar. Nos museus, você olha, observa, e sai de lá sem levar nada.
Sou do tempo da “carestia”, palavra que saiu do vocabulário cotidiano, hoje se fala de inflação, custo alto, embora seja a mesma coisa, e afeta nosso bolso da mesma forma. Nos anos 80, quando o Brasil conheceu a hiperinflação, no primeiro governo civil, eleito pelo voto indireto, no Colégio Eleitoral, chegamos a uma inflação estratosféricas, para qualquer padrão mundial. Tempos tristes, que a maquininha remarcava o preço das mercadorias em nossa frente. Quem não se lembra de pegar um produto na gôndola, com um valor, e ao passar no caixa, o valor ter sido majorado.
Quando José Sarney(1985-1990), assumiu a presidência da república, a inflação estava em 242,24%. No final do governo, a inflação alcançou o recorde 84,23% ao mês e um índice acumulado nos doze meses anteriores de 4.853,90%. Surreal.
Naquela época a economia era toda indexada, mas isso é pauta para um novo artigo.
Hoje, com a inflação com dois dígitos, salários achatados, estamos sentindo no bolso os efeitos de uma economia cruel, que corrói nosso poder de compra.
Mas o que chama a atenção é o Brasil, celeiro do mundo, maior produtor de grãos, de carne de frango e da carne bovina, os preços dos alimentos estarem fora do alcance de boa parte da população. Vergonhoso ver que muitos brasileiros e brasileiras passam fome nesse rico país. Segundo o IBGE, 19 milhões de pessoas passam fome, situação agravada pela pandemia e pela crise econômica. Um número bem maior, cerca de 116 milhões de pessoas vivem com algum grau de insegurança alimentar.
Claro que há uma inflação importada, vem do conflito no norte da Europa, entre a Rússia e a Ucrânia, aos preços altos das commodites, como: soja, óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos, minério de ferro e seus concentrados, óleos combustíveis de petróleo ou de minerais betuminosos, carne bovina fresca, refrigerada ou congelada e celulose.
Para você, caro leitor, amiga leitora, assim como eu, que vivemos nos equilibrando na corda bamba da teimosia em continuar vivos e pagar as contas que chegam no final do mês, não estamos preocupados com o homem bomba, mas com o homem da bomba de gasolina.
Se você está achando os ovos de chocolate caro, faça como uma amiga que só compra após passar a euforia da Páscoa. “Alguns já estão quebrados. E daí, alguém come ovo inteiro?”, pergunta ela rindo, assim economiza uns tostões.
Viver no Brasil não é para os fracos; e, se já foi pecado comer carne na Semana dita Santa, como preconizava a Igreja Católica, hoje é um milagre. Para quem sobreviveu ao letal coronavírus e aos sucessivos governos perdulários, estar vivo e ter comida no prato é um privilégio. Deus tenha misericórdia de nós. Feliz Páscoa para todos.
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(*) Luiz Thadeu Nunes e Silva, eng. agrônomo, palestrante, cronista e viajante: o sul-americano mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 143 países em todos os continentes.
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