Por Léo Mittaraquis (*)
Você vai se perguntar como um homem tão ocupado quanto meu tio conseguiu encontrar tempo para compor tantos livros, e alguns deles também envolvendo tanto cuidado e trabalho. Mas você ficará ainda mais surpreso quando ouvir que ele defendeu o tribunal por algum tempo, que morreu aos sessenta e seis anos, que o tempo intermediário foi empregado em parte na execução dos mais altos deveres oficiais, em parte no atendimento aos imperadores que o honraram com sua amizade. Mas ele tinha uma rápida apreensão, um maravilhoso poder de aplicação e era de um temperamento extremamente vigilante.
Caio Plínio Cecílio Secundus (Plínio, O Jovem) sobre Plínio, O Velho
Sei bem que é chover no molhado decidir-se a tecer comentários sobre vinho e cultura clássica ocidental. Impossível pensar um sem contar com a outra. Muito já foi dito. E o presente e execrável artiguete dá-se muito mais como um eco, meio que plagiário, de considerações elaboradas ao longo de, pelo menos, meio milênio. Historiadores, filósofos, escritores, sociólogos, geógrafos, e tantos e tantos no campo das Humanidades tocaram, dalguma maneira, no tema.
Sim, ok, você venceu, batatas fritas.
Ontonce, prumodequê, oh mandrião, tu sincosta naquele povo culto, sagaz e brilhante para escrevinhar seus garranchos?
Ora, por isso mesmo, por ter, à mão, o mingauzinho pronto, quase que mastigado… E olha que, em tese, não se mastiga mingau. Assumo a mim, como todo farsante, um aproveitador.
Vamos lá, lerdo e manhoso articulista, que tens para nós, seus pouquíssimos leitores?
O causo é o seguinte: vinho na Roma Antiga era mais do que apenas uma bebida. O produto fermentado alçou, com certa rapidez, tal importância, que se tornou símbolo de status. Até mesmo em assuntos do Estado (no sentido da cultura política da antiguidade) o vinho era um fator de negociação “diplomática”. Seu significado cultural e sua importância econômica deixou um legado duradouro para todo o Ocidente.
Simples assim. Pensei: “quem sabe seja de interesse para ‘minha’ restrita comunidade leitora.”
Disse acima que o vinho alçara status de símbolo de poder. Além disso, ou talvez por isso, o vinho é tema que chama a atenção de Plínio, o Velho. Previno ao reduzidíssimo número de leitores deste artiguito, que não me alongarei sobre todas as tratativas do historiador, filósofo, militar e naturalista romano. Eis apenas uma opinião razoavelmente abalizada, pero no mucho.
Se não me está a falhar a já embolorada memória, Plínio, o Velho, morreu em agosto do ano 79 d.C., durante a erupção do Monte Vesúvio. De acordo com seu sobrinho, que narra em carta dedicada a Cornélio Tácito, “ele se levantou com a ajuda de dois de seus servos e imediatamente caiu morto; sufocado, como eu conjecturo, por algum vapor grosseiro e nocivo, tendo sempre tido uma garganta fraca, que frequentemente estava inflamada. Assim que clareou novamente, o que não ocorreu até o terceiro dia após esse melancólico acidente, seu corpo foi encontrado inteiro e sem nenhuma marca de violência, no vestido em que caiu, e parecendo mais um homem dormindo do que morto”.
Plínio abordou com seriedade e profundidade o cultivo das vinhas e a consequente produção de vinhos. E isso em diversos aspectos. Muitas das suas recomendações continuam funcionais até hoje. Observou as vinhas, sua natureza e descobriu os melhores métodos de cuidar delas e fazê-las produzir em quantidade com boa qualidade. Classificou diversas espécies. Estudou e determinou para uso, com maior controle e eficiência, substâncias para aromatizar o mosto, tais como as resinas. Além disso, recomendou os recipientes mais adequados. Centenas e centenas de dados coletados, estudados e postos em prática. Alertou sobre a falsidade de sonhos quando estes são induzidos pelo vinho. Observa que os bárbaros nórdicos se valem de chifres, usando-os como “copo” para beber vinho.
E tantas e tantas outras observações e recomendações em torno da bebida.
O ponto sobre o qual desejo induzir a você, leitor, a refletir e, como diriam os monges do primeiro terço da denominada Idade Média, a chegar a algum desenho que ilustre, quem sabe, uma boa conversa, é a relação do velho Plínio com o vinho… E demais possíveis temas subsequentes.
Também demonstrar como essa alma extraordinária, sem os recursos dos quais dispomos hoje, fez muito mais e melhor. Fato que tão bem representa nossa decadência intelectual, em termos teóricos e técnicos – evolução tecnológica per se significa muito pouco.
Posso conceder algo de exceção no que concerne ao cultivo de vinhas e de produção de vinho: ainda que tenha ocorrido franco progresso no sentido de maior conhecimento no campo da biologia botânica, no conhecimento pedológico, na praticidade devido à maquinaria, os estudos plinianos ainda são válidos. Além disso, tão somente ler sua monumental “História Natural”, já se configura num larguíssimo ganho estético e linguístico.
Defendo a leitura regular dos clássicos como consolidação do esteio da faculdade do entendimento humano, do raciocínio e da compreensão. Como bem observa Aristóteles, em “Sobre a Alma”, o intelecto é a faculdade mais alta da mente humana, e é o que nos permite pensar pensamentos abstratos e entender conceitos que não estão vinculados a objetos físicos. Lemos, nesta obra aqui citada, no capítulo quarto do livro primeiro, que para o estagirita, “o intelecto parece ser – em sua origem, uma entidade independente que não está sujeita à corrupção”. Oh, belíssima, poética, elegante concepção!
Se comes, tu bebes…
Diz-se à larga que a perfeição não existe. Este artiguito está longe de sequer aproximar-se de tal estado. Mas buscá-lo é uma possibilidade e um dever moral, antes de tudo consigo mesmo, do indivíduo. Perfeição nada mais é do que o mais alto nível numa escala de valores.
Ao lermos Plínio, O Velho, vale dizer, ao compreendê-lo, exercitamos pelo menos a tentativa sincera de vencer alguns níveis daquela escala. Ao bebermos bons vinhos, ao buscarmos mais sobre os rótulos, fazemos o mesmo. Se nos dedicamos a ambos, quase que concomitantemente, avançamos mais e melhor.
Sem ousar finalizar perfeitamente, mediante minhas palavras, estas linhas, recorro a Henri-Bergson, em a “Evolução Criadora”: “O espírito humano passou do primeiro tipo de conhecimento para o segundo, por aperfeiçoamento gradual, simplesmente buscando uma maior precisão”.
Santé
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