Paulo César Santana (*)
Além de viabilizar resultados eficientes para problemáticas relacionadas à mobilidade urbana, ocupação de vias e a diminuição das probabilidades de acidentes de trânsito, o investimento em políticas para um transporte público de qualidade representa um importante passo para a redução nos índices de poluição atmosférica em regiões metropolitanas, como a capital Aracaju. No caso do ônibus, uma adoção em massa desse tipo de meio de locomoção pode diminuir significativamente as taxas de emissão de CO2, o mais perigoso gás do efeito estufa. De acordo com a Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU), em comparação com motos e carros, respectivamente, esse quantitativo chega a ser menor em quatro e oito vezes.
Pela plataforma online do Departamento Estadual de Trânsito de Sergipe (Detran/SE), até o fim de setembro, a frota de veículos na capital sergipana era de 251.968 entre carros, motos, motocicletas, motonetas e ciclomotores. Enquanto isso, o número de ônibus circulando no município e em regiões circunvizinhas (Barra dos Coqueiros, Nossa Senhora do Socorro e São Cristóvão) é de pouco mais de 400, com 80% da frota em operação, atualmente, devido à pandemia, conforme o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Aracaju (Setransp).
Assim como a liberação de gases de efeito estufa como o monóxido e o dióxido de carbono (CO e CO2), o engenheiro ambiental Thiago Carlindo Ferreira alerta para a presença de outros compostos lançados no ar como restos de hidrocarboneto, trióxido de enxofre e óxidos de nitrogênio presentes em combustíveis, demonstrando um perigo, também, aos ecossistemas e pondo em riso o desenvolvimento de espécies da fauna e flora.
“Assim como as doenças do trato respiratório, a emissão desses gases causa um efeito negativo de destruição da camada de ozônio que protegem a terra contra os efeitos de raios UV, UVB, solares, provocando ainda uma precipitação em camadas mais baixas da atmosfera gerando alterações de temperatura, o ciclo reprodutivo de algumas espécies de pássaros, répteis, assim como a dificuldade de crescimento de alguns tipos de árvore, fotossíntese e até a morte de arbóreas, que têm papel na melhoria da qualidade do ar”, explicou Thiago.
Em julho deste ano, o relatório Air Quality Life Index (AQLI), conduzido pelo Energy Policy Institute, da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos apresentou importantes constatações que reforçam, ainda mais, a necessidade de políticas públicas para o incentivo ao uso do ônibus nos grandes centros urbanos. Conforme o documento, a contaminação do ar por material particulado reduz em 1,9 ano a expectativa de vida em todo o mundo e ocupa o segundo lugar no ranking de doenças com elevado risco de morte, atrás somente da Covid-19. Ainda assim, a patologia causada pelo novo coronavírus pode sair da lista uma vez que já existem produções de sua vacina em diversos países.
Nesta perspectiva, para a população, diminuir a quantidade de carros e motos nos ambientes urbanos significa reduzir a inalação de gases, provenientes da queima de combustível, os quais apresentam, segundo a AQLI, uma média global de concentração de partículas (29 µg/m³) quase três vezes acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (10 µg/m³). Na confrontação com outras doenças, o risco deste tipo de poluição chega a ser maior do que o consumo de cigarros, por exemplo.
O impacto da má qualidade do ar pode envolver o surgimento de lesões nas vias respiratórias e problemas pulmonares, atingindo com maior intensidade crianças e idosos e com variação de acordo com o tipo de gás. Entre as principais consequências à saúde estão a sensação de cansaço, dores de cabeça, dor e ardência nos olhos, nariz e na garganta. Além disso, a entrada de poluentes no organismo pode provocar redução de fertilidade, alergias, complicações no desenvolvimento de fetos, problemas cardiovasculares e o câncer de pulmão.
Para profissionais e especialistas em planejamento urbano, iniciativas públicas voltadas aos transportes coletivos, em especial o ônibus, precisam levar em consideração aspectos que vão desde questões logísticas, como pontualidade do horário, melhor distribuição das linhas, segurança e capacitação de motoristas, cobradores e demais agentes rodoviários, a dificuldades estruturais como sucateamento e falta de adaptação para pessoas com deficiência. A universitária Wanessa Santos, que utiliza o ônibus durante toda a semana, acredita que é preciso mudanças por parte dos setores públicos, mas também o bom senso de outros usuários.
“Os principais problemas pra mim são a demora, o que resulta em ônibus lotados sem a mínima possiblidade de conforto, sem contar o risco elevado de assalto. Além do mais, por vezes você tem que aguentar até mesmo barulho de passageiros que entram com caixas de som tocando alto. Se eu tivesse veículo próprio, com certeza, não optaria por utilizar um transporte com essas condições”, pontuou a universitária.
A ampliação e melhorias na frota de ônibus a partir de um processo licitatório, é uma das opções para alcançar mudanças positivas neste cenário, gerando mais estímulo para a sua utilização por parte da comunidade e, com isso, a redução de carros e motos em circulação. Sobre esse ponto, a Superintendência de Transporte e Trânsito de Aracaju (SMTT) informou que vem trabalhando para elevar o serviço na capital e municípios vizinhos, a partir de diálogos com representantes dos gestores envolvidos.
“Como é uma decisão compartilhada com as prefeituras de Barra dos Coqueiros, Nossa Senhora do Socorro e São Cristóvão, já que o serviço é integrado, o processo de implantação do Consórcio Metropolitano não é simples, mas já avançou nos últimos anos. O consórcio definirá qual será a participação de cada município na gestão do transporte público. Um grupo de trabalho com representantes das áreas jurídica e de mobilidade de cada prefeitura foi montado a partir de uma recomendação do prefeito Edvaldo Nogueira e este grupo vem se reunindo frequentemente”, ressaltou a assessora de comunicação do órgão, Juliana Moura.
Para o engenheiro, aspectos como a redução de poluentes precisam ser levados em consideração no desenvolvimento de qualquer política pública que vise a implantação de um sistema ambientalmente eficaz. “Investir no transporte público proporciona não somente uma eficiência do ponto de vista da logística, mas também diminui a poluição do ar e, por consequência, gera uma melhoria para a qualidade de vida da população. Isso pode ser alcançado adquirindo-se veículos que poluem menos, movidos a fontes alternativas como solar, hidrogênio ou, até mesmo, o próprio biocombustível que tem um impacto ambiental menos significativo do que os combustíveis fósseis”, completou Thiago.
(*) Estagiário sob supervisão do jornalista Antônio Carlos Garcia
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