“Posso dizer a você que gestão é minha praia, eu gosto de ser gestor. Gosto de fazer análises de cenário, de fazer projeções, planejamento estratégico, para que possamos alcançar os objetivos; e acredito muito no produto turístico de Sergipe”, confessa Sales Neto.
É justamente com esse know-how que ele aposta alto nas potencialidades turísticas sergipanas. “Sergipe precisa ter o voo de águia, que é aquele voo que bate as asas e vai embora”, avisa.
Para que esse voo de águia aconteça, o terreno foi sendo preparado durante a pandemia, enquanto os turistas estavam, literalmente, presos em casa. “Juntamos esforços com a iniciativa privada, demais gestores públicos dos municípios, entidades que sempre nos apoiam, a exemplo do Sebrae, Senac, Fecomércio, Universidade Federal de Sergipe (UFS) e fomos planejar a retomada, pois sabíamos que em algum momento ela viria. Isso foi importante, criou a união, as pessoas deram as mãos, ninguém se sentiu abandonado”, disse.
Agora “as coisas estão voltando a acontecer e nos deixam muito felizes, porque isso foi fruto daquele trabalho de planejamento que nós fizemos com os parceiros e instituições que muito nos apoiam”, destaca Sales Neto. Mas não só de planejamento vive a estratégia. É preciso, também, ter sorte e ela aportou por aqui. Isso aconteceu quando foi criada a Rota da Farinha, que abrange os municípios de Macambira, Campo do Brito e São Domingos, onde existem cerca de 600 casas de farinha.
Um empresário, proprietário de uma área de terra onde está a Cachoeira de Macambira, vai construir uma casa de farinha com toda infraestrutura, a exemplo de um camping, para receber os turistas. O local, é bom que se frise, já é uma atração para aqueles que gostam do turismo de aventura. Mas para seguir firme na aventura é importante uma alimentação reforçada para repor as energias com beiju e demais iguarias feitas com a farinha, além de um bom local de descanso, para restaurá-los.
Mas administrar uma pasta como a de Turismo vai além da paixão de ser gestor e ter sorte. É necessário que o turismo se torne uma política de Estado, independente de quem venha a ser o próximo governante, para que a união entre o profissionalismo e a sorte façam o setor prosperar. Sales Neto destaca que a Bahia e Alagoas são bons exemplos onde o turismo é tratado como política de Estado, daí o sucesso. “Entendo que Sergipe também pode seguir esses exemplos, desde que exista a boa vontade daqueles que irão assumir os governos, que entendam que o turismo é uma política pública de Estado que deve ser permanente. Os investimentos devem acontecer e continuar, para que não tenhamos o voo de galinha”, alerta.
E por falar em voo, desta vez o de aeronaves mesmo, Aracaju ganhou mais voos de ponta a ponta e há negociações em andamento para novos voos charters.
Confira as novidades do setor nesta entrevista.SÓ SERGIPE – O mundo viveu dois anos críticos com a pandemia da Covid-19, e o turismo foi bastante prejudicado. Que análise o senhor faz daquele período?
SALES NETO – Fazendo uma retrospectiva daquele período, a pandemia castigou alguns segmentos mais do que outros; alguns, inclusive, lucraram mais do que antes. Porém, o turismo foi duramente atingido porque tem duas características que, durante a pandemia, precisaram ser evitadas: a primeira foi a circulação de pessoas, porque o turista viaja; e o segundo é que, geralmente, turismo é feito em grupos. Então, causa aglomerações nos principais pontos turísticos. Essas duas características fundamentais para que haja um turismo de massa precisaram ser evitadas.
E o setor de eventos, que reúne várias pessoas num mesmo lugar, foi duramente atingido. Quando falo duramente, foi porque ocorreu assim mesmo. Acompanhamos de perto todo o sofrimento da cadeia, desde os meios de hospedagem, aos bares, restaurantes, agências de receptivos e guias de turismo que ficaram completamente impossibilitados de trabalhar, passando realmente muitas dificuldades. Mas não havia o que fazer naquele momento, até porque essas medidas de isolamento serviram para evitar um mal maior. Muitas pessoas estavam morrendo, as UTIs ficaram lotadas no mundo todo. Não foi algo isolado, mas que aconteceu globalmente.
SÓ SERGIPE – E como foi o trabalho naquele momento?
SALES NETO – Nós aproveitamos aquele período – quando não estávamos fazendo nenhum trabalho de atração de turistas, o que seria uma irresponsabilidade chamar pessoas para vir para cá – para juntar esforços com a iniciativa privada, demais gestores públicos dos municípios, entidades que sempre nos apoiam, a exemplo do Sebrae, Senac, Fecomércio, Universidade Federal de Sergipe (UFS). Nós nos juntamos e fomos planejar a retomada, pois sabíamos que em algum momento ela viria. Isso foi importante, criou a união, as pessoas deram as mãos, ninguém se sentiu abandonado.
Num primeiro momento, desenvolvemos uma série de protocolos sanitários para recebermos os turistas com segurança, para que eles pudessem vir para um destino limpo e seguro com relação à Covid-19. Esse foi um trabalho muito forte, e logo quando foi possível reabrir os estabelecimentos, todos estavam preparados, obedecendo os protocolos, com uso de máscara, álcool em gel. Isso passou para o turista segurança. Eu lembro que em abril de 2020, quando a pandemia chegou, Aracaju tinha um voo por dia, que vinha de São Paulo e voltava. E dia de quarta-feira não tinha nenhum, o aeroporto era fechado pois não subia e nem descia voo nenhum aqui. Foi um momento muito triste. Mas depois as coisas foram melhorando, os voos foram voltando.
SÓ SERGIPE – E como estão os voos hoje?
SALES NETO – Nós já temos hoje todas as conectividades que tínhamos antes da pandemia, e quando falo conectividade me refiro aos voos de ponta a ponta do Rio de Janeiro direto para Aracaju que nós recuperamos; de Salvador, São Paulo, Campinas, Brasília, Belo Horizonte, Recife. Nós voltamos a ter voos, não nas mesmas quantidades, mas é um movimento que vem crescendo. Nós acompanhamos os números do aeroporto e mês a mês estamos crescendo, com relação aos mesmos períodos do ano passado, demonstrando que estamos numa curva ascendente.
E crescendo as movimentações na hotelaria, nos bares, restaurantes. Agora nos feriadões tivemos ocupações bem próximas do 100%. As coisas estão voltando a acontecer e isso nos deixa muito felizes porque isso foi fruto daquele trabalho de planejamento que nós fizemos com os parceiros e instituições que muito nos apoiam.
SÓ SERGIPE – E hoje o senhor tem números de voos, embarque e desembarque no Aeroporto de Aracaju?
SALES NETO – A Aena sempre me passa os números. A previsão de movimento em junho é de 60.726 passageiros, 6% a mais que junho de 2021, que operou com 57.759; em julho a previsão é de 86 mil passageiros, 21% a mais referente a julho de 2021, que operou com 71.265. Ainda em julho teremos voos extras de Congonhas para Aracaju, da Gol; Latam, de Guarulhos para Aracaju; azul vai operar voos charter para Aracaju a Porto Seguro; e voo charter da Gol, Aracaju a Guarulhos, que são voos fechados de operadores que alugam o avião todo e vendem as excursões.
SÓ SERGIPE – Nesta sua gestão na pasta de turismo, o senhor firmou um convênio com a ABIH. Como está?
SALES NETO – Isso é importante. Nós firmamos um convênio com a ABIH, e, através deste, firmamos um acordo com a CVC. Depois de 17 anos sem ter voo charter da CVC para Aracaju, nós voltamos a tê-lo. Nos finais de semana dos meses de dezembro e janeiro nós tivemos voos de fretamento com turistas de Brasília para cá diretamente. E já estamos trabalhando com duas grandes operadoras, que vou manter em sigilo por enquanto, para que tenhamos voo charter na próxima temporada, que começa em novembro e segue até fevereiro.
SÓ SERGIPE – Estamos no período junino – com hotéis lotados -, mas como vem ocorrendo o trabalho de conquistar ainda mais esse turista para que depois deste momento ele retorne a Sergipe?
SALES NETO – Nós sabemos que existe um custo para atrair o turista para o Estado. E a gente tem que aproveitar o momento em que ele esteja aqui, para convidá-lo a voltar. Nós fizemos isso no ano anterior à pandemia, e vamos repetir para que possamos aproveitar esse fluxo e mostrar para ele que Sergipe, além de ser o país do forró, faz festejos juninos nos 75 municípios e que temos mais atrativos. Devemos despertar no turista a vontade de vir aqui em outros momentos, visitar nossos rios, cânions, cidades históricas, e esse trabalho será feito novamente.
SÓ SERGIPE – Como está o relacionamento da Secretaria Estadual de Turismo com as respectivas pastas nos municípios sergipanos?
SALES NETO – Nós demandamos e somos demandados muito pelos municípios que possuem potencialidades turísticas e outros que estamos construindo roteiros para oferecer novidades. Essa interação é constante. Muitos municípios que possuem atrativos, que querem transformá-los num produto turístico, nos procuram e nós temos uma equipe de turismólogos que os auxiliam. A gente não constrói nos municípios, mas somos uma mão amiga, uma instituição que os municípios podem buscar apoio, um alicerce para construir estes produtos.
Vou citar como exemplo a Rota da Farinha. O que é? Nos municípios de Macambira, Campo do Brito e São Domingos existem cerca de 600 casas de farinha, que se avizinham aos locais onde se faz turismo de natureza, com as trilhas e cachoeiras, onde já existe um fluxo. E foi ideia nossa durante o período de pandemia, provocados pelas operadoras que nos alertaram sobre a necessidade de criarmos produtos. Nós temos na prateleira produtos muito bons, excelentes, mas existem turistas que já vieram para cá algumas vezes, fizeram todos esses passeios e querem novidade. Então criamos a Rota da Farinha para que, muito em breve, possa ser uma novidade nas prateleiras das operadoras e agências.
SÓ SERGIPE – E em que consiste a Rota da Farinha?
SALES NETO – É pegar essas casas de farinha próximas às áreas de turismo de natureza e prepará-las para receber os turistas. Hoje, as famílias vivem exclusivamente da produção de farinhas, mas terão oportunidade, também, caso elas façam essas adaptações para receber o turista, de ter recurso desta atividade. O turista vai aproveitar para fazer uma refeição, levar para casa a farinha, o beiju. Fomos muito bem recepcionados pelos prefeitos, e na vida temos que ter um pouco de sorte também. Acredito que quando fazemos uma boa gestão ficamos condicionados a ter essa sorte, você está bem posicionado quando a sorte chega.
E qual foi a nossa sorte? Nós encontramos um empreendedor da região, proprietário da fazenda onde está localizada a cachoeira de Macambira, que se entusiasmou com o projeto. Ele é um empresário bem sucedido de Lagarto, foi de origem humilde, criado dentro de uma casa da farinha. Ele se recordou da infância, da adolescência, pois trabalhava com o pai. E disse que vai abraçar a ideia e irá construir uma casa de farinha vizinha à cachoeira de Macambira. O filho dele, Jotinha Menezes, assumiu o protagonismo deste negócio e já desenvolveu um masterplan e todo o processo arquitetônico, que consiste numa casa de farinha, restaurante, estacionamento e área de camping, que vai ser o meio inicial de hospedagem na Rota da Farinha, mas já prevendo uma área para construção de chalés, conforme as coisas forem se movimentando. Então já temos um primeiro produto da Rota da Farinha, que muito em breve estará pronto para os turistas.
SÓ SERGIPE – E isso foi fruto dos diálogos durante a pandemia?
SALES NETO – Sim, foi construído durante aquele período de pandemia e que nós vamos deixar de legado. Temos certeza de que essa é só a primeira de outras iniciativas. Um empresário de Itabaiana adquiriu uma área em Macambira, que tem um grande mirante, onde ele já construiu uma piscina de borda infinita, e está construindo oito chalés para receber turistas. Deste mirante você enxerga até o município de Simão Dias. São produtos que estão surgindo acreditando na Rota da Farinha. O turismo é como sementes que você planta e que no futuro vai ter a colheita.
SÓ SERGIPE – Em Aracaju era muito forte o turismo de eventos. E agora com a reabertura do Centro de Convenções AM Malls tem tudo para deslanchar?
SALES NETO – Já tivemos vários eventos e há uma série de programações para 2022. Iremos receber um evento do COB, que são os Jogos da Juventude, quando teremos por aqui cinco a seis mil atletas de outros Estados. Boa parte das atividades, a parte de refeitório, o centro administrativo do evento será feito no AM Malls. Obviamente que as outras atividades irão para os parques esportivos, mas é certo que o quartel general desse evento será lá.
Temos na agenda, para 2023, uma série de eventos grandes na área de Medicina, feiras, convenções. E esse foi um esforço que o Governo do Estado fez. Quando nós assumimos, o centro de convenções era uma obra que estava a passos lentos. E nós recebemos orientação do governador Belivaldo Chagas, então nós tocamos e inauguramos. Hoje está aí motivando o turismo de eventos, que é de ticket médio muito alto. O turista de eventos gasta bem. Ele não só participa do evento, mas passeia e depois retorna aqui com a família. O Governo fez esse esforço, fez concessão por 25 anos para administrar o centro e tenho certeza de que será um novo catalisador de turismo para o nosso Estado.
SÓ SERGIPE – O senhor tem notícias do projeto para construção de uma ciclovia na Linha Verde, ligando Aracaju a Salvador?
SALES NETO – O governador Belivaldo Chagas determinou que participássemos da discussão desse projeto, que não é de curto prazo. Depende de emendas parlamentares. Eu me reuni em Brasília com deputados sergipanos e baianos. Acredito muito na força desse turismo esportivo, de pessoas que têm esses grupos. O ciclismo aqui é muito forte, na região do agreste. Campo do Brito é a capital sergipana da mountain bike. Ciclismo está em todo o Estado. Sou um entusiasta desse projeto, e se houver empenho dos políticos dos dois Estados, aportando recursos, vai ser realizado.
“Sergipe é um estado pouco conhecido no restante do país. Se formos comparar com Estados vizinhos, nós temos esse déficit de investimento em promoção.”
SÓ SERGIPE – Como o senhor vislumbra Sergipe turisticamente no futuro?
SALES NETO – O potencial do Estado é incrível, nós temos um grande produto nas mãos. Temos riquezas naturais, a exemplo do cânion de Xingó, as nossas praias fantásticas com águas mornas e calmas, rios, estuários que proporcionam banhos maravilhosos, nossas cidades históricas, o litoral sul, norte, com a nova rodovia que está sendo finalizada. Nós temos um produto, mas não acabado, porque tudo pode ser melhorado. O produto Sergipe está em constante melhoramento e já está muito maduro. O que precisamos é fazer maiores investimentos em promoção. Sergipe é um estado pouco conhecido no restante do país. Se formos comparar com Estados vizinhos, nós temos esse déficit de investimento em promoção. Acho até que a prioridade dos próximos governos é divulgar. Temos um produto considerável nas mãos, mas precisamos mostrar isso para o Brasil. Ninguém acorda em Belo Horizonte, Rio Grande do Sul ou São Paulo e diz que vai visitar tal lugar que não conhece. Para isso é que serve o marketing, impactando essas pessoas com peças publicitárias que despertem nelas o desejo de vir para cá.
SÓ SERGIPE – O senhor é um longevo secretário, que passou da Comunicação para o Turismo e tem vários cursos. Gestão é a sua praia?
SALES NETO – Eu sou uma pessoa que gosto muito de gestão. Fui estudar Gestão Estratégica na Fundação Getúlio Vargas, e me considero gestor público atuando desde 2014, portanto há oito anos, como secretário de Estado.
“Eu acho que, independente de quem esteja no governo, o turismo precisa ter uma política de Estado.”
Primeiramente como secretário de Comunicação onde passei seis anos, e dois anos e meio como secretário de turismo, chegando a acumular as duas pastas por mais de seis meses. Posso dizer a você que gestão é minha praia, eu gosto de ser gestor. Gosto de fazer análises de cenário, de fazer projeções, planejamento estratégico, para que possamos alcançar os objetivos; e acredito muito no produto turístico de Sergipe. Eu acho que, independente de quem esteja no governo, o turismo precisa ter uma política de Estado. Os Estados que hoje colhem bons frutos, independente dos gestores, foi porque havia uma política de Estado que foi respeitada. A Bahia passou mais de 20 anos com um grupo, capitaneado inicialmente por Paulo Gaudenzi, então presidente da Bahiatursa, que conseguiu criar uma engrenagem colocando a Bahia no patamar que ela chegou.
Alagoas foi por muitos anos gerida por pessoas, independente do secretário, que respeitavam aquela política pública determinada, fazendo com que Alagoas despontasse. Entendo que Sergipe também pode seguir esses exemplos, desde que exista a boa vontade daqueles que irão assumir os governos, que entendam que o turismo é uma política pública de Estado que deve ser permanente. Os investimentos devem acontecer e continuar para que não tenhamos o voo de galinha, ou seja, chega o gestor e faz o trabalho que precisa; vem outro que o substitui e não dá contuidade ao trabalho. Como é o voo de galinha? Ela bate asas, levanta um pouquinho e depois cai. Sergipe precisa ter o voo de águia, que é aquele voo que bate as asas e vai embora. Temos muito potencial e precisamos de, realmente, uma política de Estado.