Para deleite familiar recebi a visita de uma bela garota de oito anos e por mais de três horas dividimos estórias infantis, brincamos de esconde- esconde, colhemos na horta, lanchamos e assistimos Os Trapalhões e Chaves entremeados de risos e perguntas sobre as cenas.
Perguntei-lhe de quem gostava mais assistir: desenhos, Sítio do Pica Pau Amarelo, Trapalhões ou Chaves? Sem pestanejar respondera para minha alegria parentesca. -“Primeiro Chaves depois os Trapalhões porque são muito engraçados”. Terminamos assistindo juntos um programa de cada, sempre debatendo as peripécias dos atores esquecidos pelas emissoras de TV no Brasil.
Noutro momento, o coleguinha de igual idade, pedira uma música que sabia localizar no celular, mas não sabia escrever o nome. Fatos distintos de uma geração maltratada por adultos e responsáveis pelas emissoras de rádio e TV.
Por que será que emissoras de rádio e TV particulares no Brasil, concessionárias de funcionamento, e públicas (rede Brasil, TV Senado, TV Câmara, universitárias inclusive a UFS) além comunitárias e serviços de alto-falante nas escolas, abandonaram os programas infantis no país? A exposição da população aos filmes importados, “enlatados” com a marca da violência e imposição cultural predomina na programação. De igual modo na programação nacional não houve manutenção nem tão pouco a criação de novos programas para o público infantil.
Política partidária e música conforme o “jabá” do empresário pretextando que “o povo não gosta” de outros estilos, prevalecem. Interesses econômicos e políticos dos donos das emissoras e seus diretores valem mais do que o respeito à qualidade de uma programação para o bem da criançada? Por que a ludicidade foi substituída pela violência e sexualidade precoce?
No passado, emissoras sergipanas tinham programas infantis. Na década de 70 do século passado destacou-se Nazaré Carvalho, Tia Nazaré. Marcou época com um programa infantil sendo objeto de estudo por pesquisadores. Os Trapalhões, Chaves e Daniel Azulay, se destacaram em redes nacionais. A pobreza criativa das emissoras locais e o monopólio de “enlatados” nas redes nacionais prestam um desserviço às futuras gerações adultas brasileiras.
Além da mídia, os adultos trajam as crianças como se adultos fossem. Não têm coragem de viverem com os infantes atividades lúdicas de seus mundos. Compram brinquedos que mandam pintar a tragédia, jogos violentos, a galinha que leva os pintos para o açougue, a boneca que solta pum, criatura misteriosas, o bebe grávido, outro atira contra a própria cabeça, etc. Brinquedos esquisitos causam horror e confusão nas cabeças infantis com reflexos futuros, enquanto familiares adultos acham graça e as empresas lucram.
Como disse Irmã Veroni Medeiros: “O estilo adulto impede que a criança desenvolva suas oportunidades de brincar e viver feliz cada dia. A “adultização” na infância pode causar baixa autoestima, carências, fechamentos, birras. Pode, também, adiantar a maturação afetiva e sexual da criança. Outro agravante é o exibicionismo. O acesso às novas tecnologias e aos celulares de última geração oferecem status; mas não comunicam relação interpessoal.”
Até o século XVIII as crianças não eram reconhecidas como sujeitos com especificidade própria. Eram vistas e tratadas como adultos em miniatura, uma vez que trabalhavam, comiam, divertiam-se e dormiam em meio aos adultos. Hoje, apesar do direito, os meios de comunicação retrocederam. O estatuto das crianças coloca a população infantil como atores sociais, portanto rejeita a infância prematuramente no mundo dos adultos. Com a palavra os representantes do Ministério Público.
A responsabilidade é compartilhada entre famílias, sociedade e Estado, para assegurar os direitos das crianças com absoluta prioridade. Como são mais vulneráveis econômica e socialmente, são mais prejudicadas pela decisão porque não podem pagar canais de TV fechada ou internet. Constitucionalmente as emissoras são concessões públicas, e como tal, todas devem oferecer conteúdos de qualidade à população. É dever legal das emissoras, das empresas, das plataformas e de todos nós, respeitarmos a criança e promovermos seus direitos dando um tratamento infantilizado a todas elas.
Quando está explorando o brinquedo é um momento mágico e precioso. Está sendo exercitada a capacidade de observar e manter a atenção concentrada e que irá inferir na sua eficiência e produtividade quando adulto. Brincar junto reforça os laços afetivos. É uma manifestação do nosso amor à criança. Todas as crianças gostam de brincar com os pais, com a professora, com os avós ou com os irmãos. Família ou responsáveis ao afirmarem “não tenho tempo” também tem suas cotas de responsabilidades na omissão.
Rádio e TV precisam oferecer programação distinta para as crianças. No jogo, ela aprende a aceitar regras, esperar sua vez, aceitar o resultado, lidar com frustrações e elevar o nível de motivação. Nas dramatizações, a criança vive personagens diferentes, ampliando sua compreensão sobre os diferentes papéis e relacionamentos humanos. As relações cognitivas e afetivas da interação lúdica, propiciam amadurecimento emocional e vão pouco a pouco construindo a sociabilidade infantil. A ausência de programação regular nas rádios e TVs aniquila os benefícios da mídia para a educação infantil brasileira com requinte de ganância econômica e maldade social.
Que empresários, diretores, programadores das emissoras públicas e privadas, educadores intelectuais e artistas se sensibilizem. Não deixem o dia da criança ser mais um, restrito para venda de produtos. A infância precisa ser acolhida, jamais encolhida pelos adultos ou seus interesses econômicos. Retomar programação infantil de qualidade é resgatar o respeito à população infantil brasileira.
Se adulto acha que é certo impor brinquedos sem apelo infantil, deve lembrar do que brincava quando criança e avaliar a significação para sua vida adulta. Brinquedos e mídia de qualidade favorecem o desenvolvimento cognitivo, motor, a criatividade, a fantasia e imaginação, a sociabilização, interação e espontaneidade da população infantil. Esta população não pode ser usada como consumidora mirim de produtos dos adultos. A melhor propaganda infantil é aquela que educa e orienta os pais ou responsáveis para o bem dos infantes.
(*) Valtênio Paes de Oliveira é professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada -Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.
** Esse texto é de responsabilidade exclusiva do autor. Não reflete, necessariamente, a opinião do Só Sergipe.
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