Emerson Sousa (*)
No último dia 7 de março, esta coluna procurou fazer um breve apanhado sobre as desigualdades sociais e geográficas que constituem o mosaico de iniquidades sociais brasileiro.
Leia: O Brasil é um país injusto (e por opção!)
Com dados retirados de uma síntese de pesquisas disponibilizada pela página Cidades, na rede mundial de computadores, que é patrocinada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi mostrado o quanto oprimimos nosso povo. Lá foram trabalhados números relativos à realidade social brasileira no decorrer dos anos de 2018 e de 2019.
No entanto, desta vez, abrindo uma série de textos que vão ampliar o foco de cada uma das dimensões ali tratadas, a abordagem se dará por meio de dados mais atualizados, como aqueles fornecidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADCT), em sua edição do 4° trimestre de 2019.
Neste texto inicial, a análise vai recair sobre a situação da mulher brasileira no mercado de trabalho, sua presença e sua remuneração e, de modo resumido, pode ser afirmado que: a situação não é benfazeja.
SIM, NO BRASIL, A MULHER VALE MENOS!
Isso porque, de acordo com a referida pesquisa, no mês de novembro de 2019, a remuneração média do brasileiro, em todos os seus trabalhos, estava no patamar mensal de R$ 2.431,00.
Contudo, para o gênero masculino, essa medida está em R$ 2.671,00 por mês, ao passo em que, para o feminino, fica em R$ 2.120,00 mensais. Ou seja, o dia de trabalho de um homem vale, em média, quase R$ 20,00 a mais do que o da mulher. Sob uma perspectiva proporcional, elas percebem uma remuneração 20,9% menor do que a deles.
Do ponto de vista geográfico, essa diferença é maior no Sul do país, onde a mulher ganha 26,7% a menos do que o homem. Com uma remuneração média de R$ 2.938,00 por mês, o dia de trabalho deles, naquela região, vale R$ 26,13 a mais do que o delas, que ganham R$ 2.154,00 mensais.
Por outro lado, é na região Norte que essa disparidade apresenta a sua menor extensão. Com uma diferença de apenas R$ 4,87 por dia trabalhado, os homens têm uma remuneração mensal 8,1% maior do que a das mulheres. Nos seus sete estados, o gênero masculino recebe, em média, R$ 1.807,00 ao mês, enquanto que o feminino, outros R$ 1.661,00 de remuneração.
Entre esses extremos estão o Nordeste, onde as mulheres ganham 14,3% a menos do que os homens; o Centro-Oeste, onde esse hiato negativo é de 21,4% contra o gênero feminino e o Sudeste, onde elas recebem um salário 23,7% menor do que o deles.
No âmbito das unidades federativas, a maior distância salarial entre os gêneros está no Mato Grosso, onde elas percebem uma renda 29,3% inferior a deles. Depois, aparece o Paraná, onde essa diferença é de 27,3% e, fechando o pódio, surge o Rio Grande do Sul, cuja remuneração masculina é 26,8% acima da feminina.
No entanto, as menores disparidades estão localizadas nas economias de Alagoas, onde as mulheres recebem uma renda 4,9% abaixo da dos homens, do Amazonas, cujo descompasso é de 5,3%, e no Amapá, que registra uma perda feminina de 5,6%.
Ela escolhe: pobreza ou defasagem salarial?
Chama a atenção o fato de que esses números, dentre tantos outros, trazem em seu bojo uma triste constatação: no Brasil, desenvolvimento econômico é sinônimo de defasagem salarial feminina, uma vez que é nos estados mais ricos que se dá a ocorrência das maiores disparidades de renda entre gêneros.
Entre os nove estados de maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita, a Mulher – que recebe uma remuneração média de R$ 2.304,22 por mês – detém um nível salarial geralmente 24,9% abaixo ao possuído pelos homens, que ganham R$ 3.059,11 em média.
No conjunto dos nove estados intermediários, de acordo com o IBGE, cujo nível salarial feminino médio está em R$ 1.744,78 mensais, essa defasagem é de 13,6% em relação à remuneração masculina, que ocupa a faixa de renda de R$ 2.034,33 por mês.
Por sua vez, nas nove unidades federativas mais pobres, a força de trabalho da Mulher percebe um rendimento médio de R$ 1.466,33 contra os R$ 1.654,67 mensais que remuneram o esforço laborativo masculino, o que resulta numa defasagem de 11,2%.
Dessa forma, a mulher brasileira fica premida por duas realidades iníquas: ou sucumbe a um baixo nível remuneratório ou se submete a receber muito menos do que o homem.
Um problema complexo com efeitos devastadores
Esse é um mosaico cuja trama, bastante intricada, não pode ser resumida a um simples “Com licença, eu vou à luta!”. As origens de tais distorções estão em nossa própria formação sociológica e a sua solução requer a participação de todos.
Além de toda a violência a que é exposta – que assume as mais diversas formas, das mais demoníacas às mais solertes – a própria sociedade brasileira resguarda à Mulher um papel subalterno e isso reflete em nossa injusta estrutura salarial.
Afinal, mulheres estudam mais, são obrigadas a amadurecerem mais cedo, são mais cobradas no convívio social e profissional, possuem um código de conduta mais rígido do que o fornecido aos homens, porém as posições de comando são entregues a eles, da forma mais naturalizada possível.
As mulheres não ganham menos do que os homens porque os patrões decidem na hora da contratação que assim será (não que isso não ocorra), mas que elas são levadas desde a mais tenra idade a se acostumarem com arranjos profissionais inferiores a ao dos seus “futuros maridos”. Não se engane, não é coincidência, é intencional!
Por exemplo, pode se supor que, no Norte e Nordeste, as diferenças são menores entre homens e Mulheres pelo fato de que, nessas localidades, as oportunidades são menores para todo o povo, mas no Centro-Sul, onde a riqueza nacional é gerada, o filé é dado a eles, que para isso são criados desde crianças.
Contudo, essas são tão somente conjecturas construídas a partir de nossa realidade remuneratória de gêneros. Torna-se necessário estudar mais o tema, aprimorar seus conceitos e análises e a começar a por em prática políticas públicas que objetivem mudar esse quadro.
Isso porque, é preciso ter claro que, no mercado de trabalho brasileiro, elas são treinadas e condicionadas para não terem “sonhos, apenas presságios”.
(*) Emerson Sousa é doutor em Administração pela NPGA/UFBA e mestre em Economia pelo NUPEC/UFS.