quinta-feira, 14/11/2024
selfie
Nos dias atuais, sorriso, imagem, riso e mentiras são rotinas falsas com ao viralização da selfie Imagem: Pixabay

Sorriso, mentira e selfie    

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Por Valtênio Paes de Oliveira (*)

 

Mona Lisa
Ela está ou não sorrindo?
Historicamente famoso, o sorriso de Mona Lisa – obra de Leonard da Vinci ( produzida entre 1503-1506) – até agora se indaga: ela está ou não sorrindo? Segundo informações do The Independent “ao ver Mona Lisa, temos a impressão de que ela está sorrindo, mas ao olharmos diretamente para sua boca, o sorriso parece se inclinar para baixo, ou seja, a forma da boca pode mudar dependendo do ângulo e distância em que é visto”. Destaque-se que sorriso é uma expressão facial sem vocalização, já o riso, pressupõe a vocalizada manifestada pela risada. O sorriso verdadeiro, também chamado “sorriso de duchenne” em homenagem ao neurologista francês Duchenne de Boulogne, que estudou o assunto no século 19, é um ato que envolve músculos em volta da boca e dos olhos. Questiona-se até o sorriso sem mostrar os dentes.

Já a mentira, deformação da verdade, falsa realidade, está vinculada ao benefício na busca do proveito evitando prejuízo. Mentir para buscar vantagem, impostura, fraudar, caluniar são espécies de mentiras. Especula-se que começa na infância como comportamento repetido para escapar da punição ou receber recompensa.  Na vida adulta, tem como principal função tornar as interações sociais mais fáceis e evitar constantes discórdias. Dentro da religiosidade,  Satanás foi o primeiro mentiroso. Neste toar, a honra, a lisura, enfim, os valores morais são desobedecidos.  De acordo com a Bíblia, tal fato, foi pouco depois do início da história dos  humanos. O evento está registrado em Gênesis, e a mentira constituía uma questão de vida ou morte para a humanidade.

Na seara filosófica, a mentira está diretamente relacionada ao proveito e o prejuízo. Quando mentimos, partes principais do nosso cérebro são estimuladas: o lobo frontal, para suprimir a verdade que trata da intelectualidade; o sistema límbico, que trata da ansiedade e decepção. As amígdalas das regiões temporais, disparam alerta. Mentira branca pela necessidade de ser agradável, mentira compulsiva, mentira patológica, são alguns tipos. A mitomania é a doença do mentiroso compulsivo ante o transtorno – perturbação psicológica. Sugere-se a terapia cognitiva para que o paciente refaça o caminho da mentira e reverta o funcionamento do cérebro do mitomaníaco.

A tradição de 1º de abril remonta à instituição do Calendário Gregoriano, que substituiu o Calendário Juliano por determinação do Concílio de Trento (conselho ecumênico da Igreja Católica). O Calendário Gregoriano divide o ano em quatro estações distribuídas ao longo de 12 meses, ou 365 dias, de acordo com o movimento da terra em relação ao Sol e estabelece o primeiro dia do ano em 1º de janeiro. Com sua instituição pelo papa Gregório XIII, em 1582, parte da população francesa se revoltou contra a medida e se recusou a adotar o 1º de janeiro como início do ano. Zombados pelo resto da população, os resistentes às mudanças eram convidados para festas e comemorações inexistentes no 1º de abril, daí a zombaria. Outros relatos históricos, relacionam a data ao festival de Hilária, festa romana, anterior ao nascimento de Cristo.

No Brasil, a tradição foi introduzida em 1828, com o noticiário impresso mineiro “A Mentira”, que trazia em sua primeira edição a morte de Dom Pedro I publicada, justamente, em 1º de abril. Distintos e próximos ao longo tempo, sorriso e mentira, ganharam a selft de ferramenta nos dias atuais. O primeiro, uma manifestação dos lábios pode expressar alegria, contentamento, felicidade, como também, ironia, malícia, maldade, arrogância, superioridade, entre tantas emoções.

macacos
Robert Cornelius acredita que a primeira selfie acontecera em 1839

Robert Cornelius acredita que a primeira selfie acontecera em 1839 com o macaco Naruto produzida pela câmera do fotografo britânico de animais David Slater. O imperador Pedro II teria engenhosamente realizado um autorretrato. Com o avanço das tecnologias, no século XXI, o uso da imagem tornou-se rotina. No Brasil, um caldo de anglicismo com o “complexo vira-latas” mudou para selfie. Se sorrir obrigatoriamente é fingimento, muitos deles são mentiras. Fingir usando a própria imagem condiz com o caráter e a moral?

Edward Pérez- González Montréal, em janeiro de 2020, afirmou, no artigo O eu: entre o autorretrato e a selfie: “Essas narrativas, comumente alteradas, almejam a construção de um ideal de beleza – organicamente globalizado – em todos os sentidos da existência. Uma vida ‘curada’ que faz referência à nossa própria imagem como espelhamento, como objeto de uma construção coletiva, de um self ilusório que nos afasta daquilo que Nietzsche se referia como o “feio”, daquilo que é nossa própria decadência”.

Para uns, pode ser necessidade de status de auto-afirmação. Para Freud é uma “instância psíquica fundamental que contém os elementos que compõem a personalidade, mas não contém o núcleo da existência genuína do indivíduo”. Pais e professores afirmam para jovens que mentir não é correto estimulando a formação do bom caráter, porém no momento do autorretrato convocam: “olhem o sorriso”. Dentre tantos tipos, existem o imperativo, o falso, a memória e a demanda de amor. Como separar a mentira no autorretrato (selfie) da formação do caráter? Estar-se-ia estimulando a mentira através do sorriso nas selfies?  A realidade social e moral impõe. A escolha é de cada pessoa.

Nos dias atuais, sorriso, imagem, riso e mentiras são rotinas falsas com ao viralização do autorretrato. Diante de um autorretrato (uma selfie) sorriso, riso e mentira estão sendo postos no mesmo cotidiano. Quer substituindo a verdade, quer substituindo a mentira. Mentiroso fora sempre algo que não dignificava pessoas, porém no autorretrato do século XXI, tal postura, não exige fidelidade ao sentimento. Espera-se que sorriso ou riso sejam sempre espontaneamente honestos.

 

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Sobre Valtenio Paes de Oliveira

Coditiano
(*) Professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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