terça-feira, 19/11/2024
Forró Caju 2024
Forró Caju 2024 Foto: Michel de Oliveira

Tribunal de Contas, Ministério Público e Assembleia: Cabe no “País do Forró” gastar dinheiro público com “arrocha” e sertanejo?

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Por Valtênio Paes de Oliveira (*)

 

Muitos artistas nordestinos ensinaram ao longo dos tempos o verdadeiro forró. A tradição é centenária com a festa popular de maior alegria.  Aliás, as escolas e secretarias de educação e cultura, em todos os níveis, provavelmente, privilegiam a prática e divulgação de nossa cultura. Dominguinhos, há décadas, demonstrou que existe distinção entre arrasta pé, baião, xaxado, xote e forró pé de serra. A métrica musical, impõe características próprias a cada gênero típico de nossa cultura. Preservar ou não preservar nosso bem cultural com o dinheiro público é política de Estado?

Em Sergipe propagandeia-se “o país do forró” e no palco principal, no mês de junho/2024 paga-se milhões de reais para Pablo, Tayrone, Unha Pintada, Leonardo, Luanzinho, e tantos(as) outros(as). Aqui, muitos gestores, seus assessores e outros interessados, agridem intencionalmente a arte e a cultura musical nordestinas. Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Anastácia, Marinês, Genival Lacerda, Clemilda, Trio Nordestino, Santana, Mestrinho, Lucas Campelo, Joza, Jackson do Pandeiro, Sivuca, Erivaldo de Carira e dezenas de outros(as) artistas, devem sofrer com o cruel desvirtuamento cultural, econômico e administrativo. Muitos artistas criticam, a exemplo de Elba Ramalho, há anos, ferrenha lutadora contra esses contratos. Desabafou: “junho é nosso, S. João é nosso forró, e forró é tudo para junho”. Não é ouvida em Sergipe. Vivos ou falecidos, estão sendo preteridos em seus direitos que tanto contribuíram para a música do Nordeste.

Secretaria de Turismo e Fundação de Cultura e Arte Aperipê (Funcap) precisam explicar o que chamam e o que entendem por cultura junina no Estado de Sergipe. Arrocha é cultura junina em nosso Estado? As escolas estão ensinando errado ou existe alguém enganando e outros sendo enganados? Nossos representantes no legislativo precisam responder. O Tribunal de Contas e o Ministério Público que analisem tantas dúvidas.

Se cultura, neste fato, for hábitos, conhecimentos e crenças do povo nordestino, estes artistas listados, dentre outros contratados, nada produzem de arrasta pé, baião, xaxado, xote e forró pé de serra. Tão pouco de canjica, milho assado, quentão, pé de moleque, pamonha, congêneres e quadrilha. Portanto, estão trocando nossa cultura por outros interesses. Pode-se afirmar que tais cantores e similares produzem e estimulam valores culturais nordestinos juninos?  Os gestores estão usando corretamente o dinheiro público? Os valores pagos aos artistas da terra que brotam de nossa cultura estão sendo justos? O “país do forró” alardeado em propaganda paga, precisa se ancorar no arrocha e similares ou existem outros interesses?

Pretextar presença do povo como justificativa para outros gêneros musicais é pura manobra maquiavélica porque ninguém gosta ou não gosta, do que não vê ou não lhes é apresentado. A exemplo, nem por isso, no governo Marcelo Déda quando prefeito, a praça do mercado ficou cheia para assistir às orquestras.

Nas escolas ensinam valorizar a cultura, porém gestores impõem gratuitamente gêneros musicais, impróprios para o período, na cabeça de jovens. Inocentes, passam a consumir o que não tem mensagem, nem raiz cultural. No dia seguinte substituem por outro e a função educativa-cultural da ação pública não acontece. Acontece apenas a troca por um belo cachê pago com o dinheiro dos sergipanos a pretexto de turistas. Visitantes vêm a Sergipe para ver arrocha ou para conhecer e conviver com nossa cultura? O que vale mais na sociologia?

Festejos que genuinamente tocam os sentimentos do verdadeiro nordestino não podem ser maculados.  Noutras plagas, não se contrata com dinheiro público arrocha para tocar no carnaval do Rio de Janeiro, no Centro de Tradição Gaúcha, tão pouco no carnaval de Olinda. O que justifica tal atitude em Sergipe? Complexo vira-latas ou “outros interesses”? Precisa-se fazer entender, precisa-se explicar, precisa-se convencer! Por que não devolver o dinheiro se provado o uso indevido?

Entidades fiscalizadores, protejam o povo nordestino desta violência cultural e financeira. Cobrar dos gestores contratantes que conceito de cultura utilizaram para contratarem tais artistas e identificar origens e aplicação dos recursos, ajuda fiscalizar. Com certeza, improbidade, estelionato cultural e educacional aparecem no radar. Rigor legal e administrativo para a felicidade geral da cultura do povo nordestino! Em “Vozes da Seca” Luiz Gonzaga cantava desde o século passado: “mas doutô uma esmola a um homem qui é são, ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”. Hoje em Sergipe, podemos dizer: autoridades, tais contratos de esmola musical ou nos mata de vergonha ou vicia o povão.

 

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Sobre Valtenio Paes de Oliveira

Coditiano
(*) Professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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