sexta-feira, 15/11/2024
Universidade Federal de Sergipe

UFS e Governo do Estado: uma parceria nebulosa na pandemia

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Rodorval Ramalho (*)
Denise Leal (*)

Desde que o governo de Sergipe decretou, em 16 de março do ano passado, situação de emergência na saúde pública no estado, suspendendo diversas atividades, um pequeno grupo de gestores e professores da UFS se envolveu mais ampla e diretamente com a questão da pandemia no estado.

Quer ocupando postos estratégicos em conselhos e comissões, quer viabilizando parcerias com órgãos públicos e até mesmo capitaneando ou participando de projetos com robustos recursos para o combate ao coronavírus, a UFS, por meio de alguns dos seus quadros, assumiu papel de destaque nessa grave crise de saúde pública que todo o país, e mais particularmente Sergipe, vem enfrentando.

Se por um lado é louvável esse protagonismo assumido por uma instituição do porte e prestígio da UFS, se é digna de louvor a iniciativa de alguns dos seus gestores e outros professores de empregarem sua expertise para contribuir no enfrentamento de tão grave pandemia, alguns aspectos chamam a atenção sobre o que está em curso.

Primeiro, quanto aos recursos destinados à UFS para o enfrentamento da pandemia. Desconsiderando eventuais repasses via MEC ou por meio de alguma agência de fomento à pesquisa como CNPq, CAPES ou FAPITEC, a instituição vem tocando atualmente 3 projetos cujos montantes somam 5 milhões e meio de reais. Também sem questionar o mérito ou a qualidade dessas pesquisas ou outras ações empreendidas, o que causa estranheza é a gestão sem maior transparência desses projetos e, ao que tudo indica, carente de critérios objetivos mais claros para seleção das propostas e dos responsáveis pela aplicação desses recursos.

Se não, vejamos. Um grande projeto chamado Projeto EPI-Sergipe, que abrange 3 subprojetos, está sendo financiado com recursos da ordem de mais de 4,6 milhões repassados pelo governo do estado. Segue sendo uma grande incógnita os critérios para seleção desses três subprojetos ligados ao EPI-Sergipe, uma vez que não houve a publicação de qualquer edital para que professores e pesquisadores da UFS apresentassem suas propostas.

Esses 3 subprojetos abrangem estudos da área da epidemiologia, violência, grupos vulneráveis e impactos socioeconômicos da pandemia. Assim, sem um edital público no âmbito da UFS que assegurasse ampla concorrência e análise criteriosa de projetos de pesquisa, centenas de professores da instituição foram impedidos de submeter projetos relacionados ao coronavírus, assim buscando viabilizar suas pesquisas por meio do financiamento de parte desses milhões de reais.

Embora seja coordenado por uma professora da universidade, sobre a qual não se discute a qualidade do seu projeto e sua competência, esse projeto está sob sigilo absoluto na página da FAPESE. Após persistente pedido de informações, recentemente a Pró-reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UFS informou que o financiamento tem origem na JBS, sendo essa a empresa que o banca integralmente.

Esse projeto abrange um valor de quase 720 mil reais, e o surpreendente é que a FAPESE invoca sigilo e confidencialidade em relação ao citado projeto desenvolvido por uma universidade pública. Ocorre que o marco legal invocado pela Fundação de Apoio, a Lei Nº 8958/1994, determina exatamente o contrário, impondo transparência e total publicidade na internet aos projetos, com divulgação de informações sobre valores executados, nomes de coordenadores e equipe, pagamentos efetuados, etc.

Também chama a atenção o terceiro projeto chamado “Campanha institucional para angariar recursos destinados a ações de combate ao COVID-19”, capitaneada por um pró-reitor da UFS. O valor de quase 200 mil reais arrecadados tem origem, em sua maior parte, em repasses para a UFS de 6 parcelas regulares de 35 mil reais por uma única  instituição pública. Assim, questiona-se: Por que não se tem clareza sobre a forma e os critérios observados para a seleção dos subprojetos contemplados com recursos dessa campanha de doação? Por que também não houve a divulgação de editais no âmbito da universidade para submissão de propostas?

Enfim, não estamos a questionar o mérito ou a qualidade desses projetos. Também louvamos a iniciativa de entidades privadas e públicas financiarem projetos da UFS. Apenas expressamos nossa inquietação diante de um quadro nebuloso que pode comprometer a imagem da UFS, sugerir possível violação a princípios de isonomia e impessoalidade e, ainda, colocar em questão a definição de prioridades quanto ao emprego de verbas públicas e recursos privados diante de um quadro de grave epidemia.

Será que não contraria o bom senso e os princípios da administração pública que, mesmo em tempo de pandemia, a aplicação de tão vultosos recursos ocorra sem concorrência e com uma gestão carente da devida transparência em uma universidade pública?

Com a palavra, os gestores da UFS.

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(*) Professora do Departamento de Direito/UFS

(*) Professor do Departamento de Ciências Sociais/UFS 

 

** Esse texto é de responsabilidade exclusiva dos autores.  Não reflete, necessariamente, a opinião do Só Sergipe.

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